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Matérias / Crimes

Charlotte Cohen: A conturbada adoção que denunciou o orfanato acusado de realizar tráfico de crianças

A moça foi adotada ilegalmente por um casal de franceses, que a agrediam e a torturavam psicologicamente

Vanessa Centamori Publicado em 24/03/2020, às 17h00 - Atualizado às 18h00

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Orfanato em São Paulo - Divulgação
Orfanato em São Paulo - Divulgação

Charlotte Cohen Tenoudji tinha sangue brasileiro, mas cresceu na França, onde teve que viver por 21 anos com a sensação de que estava no lugar errado. Passou por tortura psicológica, maus-tratos e preconceito, pois sua relação com os pais adotivos era péssima. As diferenças físicas entre ela e os franceses era sempre apontada por eles, que a agrediam como castigo. 

Charlotte também enfrentou as crises de bipolaridade da mãe e presenciou cenas de descontrole do pai, que era alcoólatra. Foi quando a moça deu um basta em tudo aquilo. Após seu 21º aniversário, ela conseguiu finalmente suspender a guarda dos pais adotivos

Aos 25 anos de idade, iniciou uma jornada de autodescobrimento no Brasil. O resultado foi surpreendente: ela não só conseguiu desvendar seu passado, como também revelou à justiça uma rede de tráfico de crianças que se escondia sob as paredes de um orfanato.

Os criminosos agiam na década de 1980, no orfanato Lar da Criança Menino Jesus, localizado em São Paulo. Os acusados não  apenas foram responsáveis por mandar Charlotte para a família francesa, como também vendeu mais três crianças ilegalmente para pais estrangeiros em processos de adoção ilegais.

Charlotte Cohen ainda bebê / Crédito: Divulgação

Como operava 

Segundo a acusações, o esquema criminoso teria sido liderado pelos donos do orfanato, Guiomar e Franco Morselli. Os dois abrigavam sob o teto da instituição não só as crianças abandonadas, como as mulheres grávidas, solteiras e as que não podiam ter filhos, conforme repercutido pela veja em 2015.

Assim que as mães davam à luz, seus bebês eram submetidos à um registro que tinha tudo para ser verdadeiro, porém era falso. Tudo parecia ser verdade, pois, aos olhos dos atendentes do cartório, era apenas um dia comum, quando uma mãe iria registrar seu filho. 

Mas, na verdade, uma funcionária de Guiomar era quem ia até o estabelecimento para registrar a criança abandonada como se fosse a mãe biológica do neném. Enquanto isso, uma amiga de Guiomar que morava na França, Cristiane, começava uma busca por casais interessados em adotar crianças. 

Charlotte Cohen nos braços de cúmplice do esquema de tráfico de crianças / Crédito: Divulgação 

A adoção de crianças vindas do exterior era uma alternativa que soava boa para casais desesperados, afinal não havia a presença de assistentes sociais, nem tramitações legais ou fila de espera.

O bebê voava de avião até o país europeu com a funcionária, que era a suposta mãe dele, segundo o registro do cartório. Cristiane então buscava o neném no aeroporto da França, para fazer a entrega ao casal adotante. 

Charlotte Cohen, ainda criança / Crédito: Divulgação

Quando a casa caiu 

A organização criminosa de tráfico de crianças só foi denunciada à justiça em 2012, quando Charlotte viajou ao Brasil por uma segunda vez. Até aquele ano, ela ainda não tinha conseguido contato com os antigos donos do orfanato.

Mas, quando finalmente teve sucesso nessa busca, Guiomar e Franco Morselli disseram que não tinham conhecimento sobre o caso. Então, Charlotte decidiu  acionar a Justiça. A moça apresentou documentos de adoção que encontrou na casa dos pais, quando tinha 16 anos de idade.

Na época do achado, ela questionou a mãe adotiva sobre o que havia ocorrido de fato, mas ela não deu muitos detalhes, instigando a filha desde então a refletir sobre a sua verdadeira origem. 

Charlotte Cohen / Crédito: Divulgação

De acordo com o que descobriu um procurador brasileiro, só pela venda de Charlotte, o casal Morselli recebeu o equivalente a 100 mil reais. Outros casos além dos dela não puderam ser comprovados, logo, não se sabe quanto os criminosos podem ter lucrado. 

A descoberta tão esperada 

Desde que fez a denúncia, Charlotte criou uma página no Facebook chamada Em busca de minha mãe no Brasil. O conteúdo ficou em evidência depois da jovem dar um depoimento no fim de um capítulo da novela Salve Jorge, da Rede Globo, em 2012. 

Essa busca incessante só teve fim no dia 24 de março de 2017, quando ela descobriu, enfim, que é filha de Jacira dos Santos, uma empregada doméstica que morreu assassinada aos 25 anos. A informação foi confirmada após Charlotte realizar um exame de DNA, que confirmou a maternidade. 

A mãe da moça trabalhava para Guiomar, não tinha casa e vivia junto dos patrões, em uma mansão em Moema, na zona sul de São Paulo. Em depoimento durante uma CPI do Tráfico de Pessoas, Charlotte disse que Guiomar não teria permitido que a mãe ficasse com a criança. 

Segundo Charlotte, a traficante de crianças teria solicitado que a mãe dela ficasse com Guiomar por um tempo até que a empregada perguntasse para a família, de Taboão da Serra [na Grande São Paulo], quem poderia ficar com ela.

“Aí ela voltou para me buscar na casa da patroa", disse Charlotte em depoimento ao UOL em 2017. “E a Guiomar falou: "Não, você não vai pegar a bebê de volta. Eu vou mandá-la para uma família melhor, para ter uma vida melhor". Após a falsificação das certidões de nascimento, Charlotte embarcou para Paris, onde sua família adotiva ilegal a recebeu.


Fontes: Veja, R7 e UOL.