Segundo estudo recente, quem subia ao cargo de soberano do Império Romano do Ocidente tinha grandes chances de sofrer uma morte violenta
Um time de pesquisadores do Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da USP decidiu analisar as mortes dos imperadores romanos pelas lentes da estatística, e descobriram que os fins dos soberanos seguiam um curioso padrão.
Segundo divulgado pelo periódico científico britânico Royal Society Open Society e repercutido pela Revista Galileu em agosto de 2021, o Império Romano teve 175 soberanos no decorrer de sua trajetória, incluindo tanto o período unificado, quanto aquele em que ele esteve dividido entre as porções Ocidental e Oriental.
Esse número apenas não leva em consideração aqueles que receberam o título quando ainda eram novos demais para de fato liderar um império, ou os que governaram em conjunto, sem ter o destino dos romanos concentrado apenas em suas mãos.
Os especialistas da USP descobriram então que, destes 175, 30% perdeu a vida no contexto de conflitos bélicos ou conspirações que pretendiam derrubá-los do trono.
Já no caso particular do Império Romano Ocidental, que teve 69 deles, as estatísticas são ainda mais deprimentes para os líderes romanos: só 24,8% foram capazes de concluir seu reinado sem serem assassinados.
Para um olhar leigo, essas porcentagens parecem simplesmente desafortunadas, porém para a equipe realizando a pesquisa, este é um padrão.
“Apesar de parecer aleatória, essa distribuição de probabilidade é encontrada em muitos outros fenômenos associados a sistemas complexos, como o tamanho das crateras lunares, a intensidade dos terremotos, a frequência com que as palavras aparecem em um texto, o valor de mercado das empresas e até o número de ‘seguidores’ que as pessoas têm nas mídias sociais”, explicou Francisco Rodrigues, o cientista de dados e professor da USP que liderou o estudo, em conversa com a Agência FAPESP.
Trata-se do "Princípio de Pareto", mais popularmente conhecido como "regra 80/20", em que o evento mais comum acontece em 80% dos casos, e o excepcional é observado em 20% deles. Em relação aos governantes romanos, a norma era ser assassinado, seja nas mãos do inimigo ou dos falsos aliados.
Esses números se aplicam também à concentração de riquezas em uma sociedade, que foi o primeiro caso a revelar a regra matemática. Foi o economista Vilfredo Pareto (cujo sobrenome nomeia o fenômeno) que percebeu que 80% dos recursos da Europa eram controlados por 20% da população, enquanto a maioria da população se dividia entre os bens restantes.
Além deste padrão, os estudiosos encontraram outro, este relacionado com os períodos que os imperadores ocidentais tinham mais chance de morrer.
“Ao examinar o tempo transcorrido até a morte dos imperadores, observamos que o risco é alto quando o imperador assume o trono. Isso poderia estar relacionado a dificuldades para lidar com as demandas que o cargo exige e à falta de habilidade política", contou Rodrigues também, ainda de acordo com a Galileu.
Para os soberanos do famoso império, suas chances de sobrevivência até a velhice melhoravam depois de alguns anos de liderança. Mas eles ainda não estavam exatamente seguros, como relata o cientista de dados.
"O risco diminui sistematicamente, até chegar os 13 anos de governo. Em seguida, apresenta um súbito aumento”, revelou. Os motivos para este curioso dado, todavia, ainda não são explicados por uma teoria única. Em sua pesquisa, os cientistas apresentaram algumas hipóteses.
"Pode ser que, após o ciclo de 13 anos, os rivais do imperador tenham se desalentado diante da dificuldade de chegar naturalmente ao poder; ou que os antigos inimigos tenham se reagrupado; ou que novos desafetos tenham surgido; ou que todos esses fatores tenham se combinado para produzir uma conjuntura crítica. O interessante é que o estudo mostra também que, após esse ponto de mudança, o risco volta a diminuir”, indicou Rodrigues.
Possivelmente, no futuro, historiadores e matemáticos possam chegar a uma conclusão definitiva em relação à explicação para esses ciclos de 13 anos.