Em 2021, o site Aventuras na História entrevistou doutorando em história social e professor de História, Elion Campos, para discutir o assunto
Nas últimos meses, o estado de saúde da rainha da Inglaterra, Elizabeth II, se tornou pauta na mídia. Tudo aconteceu após o Palácio de Buckingham informar em nota que a monarca precisou passar a noite em um hospital, no final de outubro do ano passado.
Após o episódio, foi revelado que os médicos da rainha aconselharam a soberana a repousar, sendo assim, ela precisou cancelar viagens e compromissos reais. Infelizmente, a rainha faleceu nesta quinta-feira, 8, no Castelo de Balmoral, na Escócia.
Aos 96 anos de idade, Elizabeth II era a pessoa que por mais tempo ocupa o cargo de monarca. Com a morte precoce de seu pai, rei George VI, Lilibet assumiu o trono aos 25 anos.
Em decorrência do longo tempo em que está no poder, a maioria de seus súditos nunca conheceu outro soberano. Elizabeth II se tornou a personificação da imagem monárquica para muitos.
Para entender melhor quais serão os maiores desafios do sistema após a morte da rainha, o site Aventuras na História conversou com exclusividade com Elion Campos, doutorando em história social e professor de História da Universidade Estácio de Sá, em novembro do ano passado.
De acordo com o professor, a monarquia se mantém até hoje por inúmeras questões, mas, principalmente por se adaptar às circunstâncias da sociedade e da política inglesa.
“A manutenção da monarquia no Reino Unido, se dá por um equilíbrio entre o fator “dignificante” (simbólico e moral) e a não intervenção em assuntos de governo. Dessa forma, ao mesmo tempo em que a família real personifica, simbólica e moralmente o Estado, contribuindo com o governo parlamentar com uma imagem de firmeza e continuidade, ela também não interfere nas decisões oficiais”.
Para Elion, enquanto a família real se manter desta maneira é muito provável que a monarquia consiga permanecer em funcionamento, independente de quem for o monarca.
Contudo, o sucessor de Elizabeth II — seu filho mais velho, príncipe Charles— irá enfrentar alguns desafios para substituir a mais importante figura da história da monarquia britânica nos tempos atuais.
“É evidente que o sucessor da rainha terá o grande desafio de estar à altura da mulher que por mais tempo ocupou o trono. No entanto, não podemos ignorar que todos os que estão na linha sucessória foram treinados por toda a vida para substituí-la”, afirma Campos.
O professor continua: “Portanto, o Sucessor de Elizabeth II tem as ferramentas e as condições de dar continuidade à tradição, resta saber se terá, na prática, a habilidade para fazer isso”.
Charles tem outro desafio: ‘Manter-se saudável para suceder a rainha’, afirmou Elion. Além disso, o filho mais velho da rainha deve tentar “manter o padrão de reinado consolidado por Elizabeth II”.
Sobre os escândalos envolvendo o nome do príncipe de Gales, o historiador pontua:
“Simbolicamente, eu acredito que os escândalos e polêmicas que marcaram seu primeiro casamento com Diana, pesam pouco. A família real e seus assessores foram hábeis em contornar a situação, blindando a monarquia e, até mesmo, capitalizando a exposição”.
Entretanto, em pleno século 21, alguns aspectos do sistema monárquico podem não fazer mais sentido.
“A monarquia é uma instituição antiga e muitos dos seus traços não são adaptáveis à sociedade contemporânea ocidental, então a tendência é que se torne cada vez mais anacrônica. Cada vez mais distante da realidade. Isso pode, no limite, levar à sua extinção, sem dúvidas”, afirma Elion.
O historiador continua: “Mas também não se pode desconsiderar a vitalidade da monarquia britânica diante de crises passadas. Como dissemos, essa instituição soube muito bem adaptar-se a novas situações, especialmente incorporando elementos de modernidade e investindo em popularidade. Resta saber até quando essa estratégia será suficiente”.
Para corresponder as atuais transformações sociais, Campos acredita que uma maior proximidade com o povo e uma demonstração de solidariedade com as lutas diárias da população possa ser um fator determinante para que o próximo reinado seja bem-sucedido.
“Há uma tendência natural de afastamento, cada vez maior entre o padrão de vida da família real e o do povo simples. Se não houver uma adaptação, isso pode, aos poucos, solapar a instituição monárquica”.
Sabe-se que a imagem de Charles está bem distante desses quesitos, como nos informou o historiador.
“O príncipe não é visto como uma pessoa particularmente modesta e simples, o próprio cargo que ocupa não contribui para isso. Há ainda a sombra de seus filhos, mais jovens e mais afinados com o sentimento popular"
"Isso pode atrapalhar sua imagem. Nesse sentido, acredito que deverá haver um trabalho para aproximar sua figura da população média do Reino Unido”, finalizou.