Autor de "Triste Fim de Policarpo Quaresma", Lima Barreto foi um dos maiores nomes do pré-modernismo
Publicado em 01/11/2022, às 09h39 - Atualizado em 06/11/2022, às 14h00
No dia 1 de novembro de 1922, há exatos cem anos, o Brasil perdeu um de seus maiores nomes da literatura: Lima Barreto, autor de "Triste Fim de Policarpo Quaresma" e de uma série de obras importantíssimas para a cena cultural brasileira.
Filho de uma professora e um tipógrafo, Afonso Henriques Lima Barreto sempre esteve rodeado pelas palavras. Apesar disso, foi somente por volta dos 26 anos, por estímulo do poeta e jornalista com quem trabalhava na revista Fon-Fon, Mário Pederneiras, que o escritor começou sua produção literária.
Logo, ele seria conhecido como um dos principais nomes do Pré-Modernismo, período que marca a transição entre a estética Romântica e a Moderna.
Como aponta o professor de Língua Portuguesa da Estácio, Marcos Penteado, "LimaBarreto é, na prosa, o grande nome do Pré-Modernismo por sua obra impregnada de fatos históricos e pela perspectiva que ele nos traz da sociedade carioca."
"Suas análises sobre ambientes, costumes e o cotidiano do Rio de Janeiro trazem uma forte crítica à mentalidade burguesa da época", diz Penteado.
"Juntem-se a isso as inovações literárias, como a apresentação de um anti-herói despido das idealizações Românticas, introspectivo, desvendando a permanência da irracionalidade dos comportamentos e a fragmentação do eu em "Triste fim de Policarpo Quaresma" – uma de suas obras fundamentais", finaliza o professor.
Quando tinha somente sete anos de idade, o escritor carioca ficou órfão de mãe. Já adulto, teve de desistir do curso de Engenharia para sustentar a família, já que seu pai passava por um momento de instabilidade mental. Foi assim que ele deu início à sua carreira jornalística.
Caso Barreto não tivesse tido que desistir da faculdade, muito provavelmente "teríamos perdido um dos grandes nomes da nossa literatura, comparável a Machado de Assis, com quem compartilha algumas semelhanças biográficas", aponta o docente.
Em 1907, o jovem Lima Barreto lançaria sua primeira obra, intitulada "Recordações do escrivão Isaías Caminha", que, na época, recebeu críticas e elogios.
"Notadamente, o escritor Monteiro Lobato foi um dos que elogiaram a obra", diz Penteado. "Há uma citação em que Lobato, dirigindo-se ao também escritor Godofredo Rangel, teceu elogios à obra e chegou a chamar Barreto de Romancista de verdade", aponta Penteado.
No entanto, por outro lado, muitos jornalistas decidiram ignorar o romance, em razão das críticas metafóricas do autor em relação aos bastidores do jornalismo da época.
"A verdade é que, mesmo tendo trabalhado no Correio, ele se tornou persona non grata neste e em praticamente todos os jornais cariocas por suas críticas contundentes a Edmundo Bittencourt (proprietário do jornal)", explicou o professor Mário.
Também é preciso destacar que, como escritor negro e descendente de escravizados, o autor de "Triste Fim de Policarpo Quaresma" sofreu com o racismo em sua época.
"Como todos os negros e seus descendentes até a atualidade, Barreto sofreu na pele o preconceito racial e social. Seus pais foram filhos de escravos e ele próprio presenciou a assinatura da Lei Áurea – curiosamente, no dia de seu aniversário de 7 anos. A visão dos escravos que assistiam ao evento foi marcante em sua obra."
Certa vez, quando o jornalista se encontrava no curso de Engenharia na Escola Politécnica, um dos veteranos declarou: “Onde já se viu um mulato com nome de rei de Portugal?”
Lima Barreto, que tinha "um espírito inquieto e rebelde", chegou a ser internado duas vezes com alucinações.
"Por conta de seu inconformismo com a mediocridade e da doença do pai, acabou por desenvolver depressão e se entregar ao alcoolismo. Foram diversas as crises de alienação mental", declarou Penteado.
"As crises de alcoolismo e depressão do escritor agravaram-se e provocaram sua primeira internação 1914 no Hospital dos Alienados, onde permaneceu por 2 meses e, posteriormente, foi aposentado do serviço público."
"Em 1919, foi internado novamente. É dessa experiência que surgem as anotações de Cemitério dos Vivos. Por fim, sua saúde declina rapidamente, culminando com um ataque cardíaco aos 41 anos. Justamente, no mesmo ano em que a Semana de Arte Moderna inaugurava o Modernismo no Brasil", concluiu.