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Matérias / Independência do Brasil

Afinal, a Independência do Brasil foi pacífica?

Apesar de ter vivenciado conflitos sangrentos, a Independência do Brasil costuma ser retratada como um “processo pacífico”

Luiza Lopes Publicado em 07/09/2024, às 13h00

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“A proclamação da Independência”, de François-René Moreaux - Wikimedia Commons via Museu Imperial de Petrópolis, Rio de Janeiro.
“A proclamação da Independência”, de François-René Moreaux - Wikimedia Commons via Museu Imperial de Petrópolis, Rio de Janeiro.

O Brasil experimentou conflitos armados em várias partes do território quando o processo de separação de Portugal começou a ser esboçado e, futuramente, concretizado. As chamadas “Guerras de Independência” envolveram confrontos em províncias como Bahia, Maranhão e Pará, onde tropas portuguesas e brasileiras se enfrentaram

“Um marco inicial são os conflitos em torno do controle do governo da província da Bahia em começos de 1822, e que alguns meses depois polarizaram defensores da chamada 'causa do Brasil' (ainda não havia uma nacionalidade brasileira) contra os partidários da manutenção dos vínculos com Portugal. Depois, conflitos semelhantes ocorreram principalmente no Maranhão, no Piauí, no Pará e na Província Cisplatina", explica João Paulo Pimenta, professor do Departamento de História da Universidade de São Paulo (USP).

No entanto, apesar dos conflitos sangrentos, a Independência do Brasil costuma ser retratada como um “processo pacífico”. 

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"O Primeiro Passo para a Independência da Bahia", pintura de Antônio Parreiras / Crédito: Wikimedia Commons via Palácio Rio Branco

Construção de um mito

Em seu livro "Formação da Nação Brasileira" (2024), Pimenta afirma que durante muito tempo, as guerras de independência foram "pouco valorizadas pelos estudiosos, adesistas conscientes ou inconscientes de um de nossos mais poderosos mitos fundadores: o de um Brasil supostamente pacífico, povoado por brasileiros simpáticos e passivos, conciliadores e pouco dados ao conflito".

O historiador pontua que o mito começou a ser construído durante a própria Independência, em especial durante as guerras a relacionadas, quando diversas pessoas, por razões distintas, criaram uma visão idealizada de contraste entre as realidades hispano-americana e luso-americana: a primeira, marcada por violências destrutivas, enquanto a segunda seria vista como um modelo exemplar de transição política pacífica, prudente e estável.

"Até mesmo algumas das forças militares envolvidas nas guerras de independência traziam em seus próprios nomes indicativos desse mito em construção, como 'Exército Pacificador', 'Exército Cooperador da Boa Ordem', como se tais exércitos não estivessem fazendo justamente… guerras! Esse mito serviria ainda para atenuar desavenças poderosas que existiam entre grupos políticos de diferentes províncias e que nem sempre estiveram de acordo com aderir ao novo Império do Brasil”, escreve. 

‘Nação pacífica’

Nesse sentindo, enquanto estavam ocorrendo, os conflitos foram tratados por pessoas centrais ao governo imperial de D. Pedro I como se fossem “episódios residuais, pouco violentos, e que mostrariam que a nação brasileira que estava nascendo seria, supostamente, uma nação pacífica", diz Pimenta

Esse mito se consolidou ao longo dos anos de várias formas, e até hoje muitos acreditam que o brasileiro possui um caráter conciliador, contrário a confrontos e essencialmente pacífico. “No entanto, é importante reforçar: trata-se de um mito, sem correspondência na realidade de nossa história como um país independente”, ressalta. 

Rodrigo Goyena, também professor do Departamento de História da USP, concorda: “ainda acreditamos que o Brasil é pacífico. No entanto, somos um país caracterizado de fio a pavio por conflitos internos, em todas as suas variedades. Não foi diferente na independência, quando conflitos violentos se alastraram de norte a sul. Na Bahia, por exemplo, a beligerância somente terminou em julho de 1823”.

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"Independência ou Morte", por Pedro Américo (1888) / Crédito: Wikimedia Commons via Domínio Público

Além disso, para o historiador Rodrigo Trespach, a noção errônea de uma “nação pacífica” é corroborada pela simplificação demasiada dos processos históricos, com posições anacrônicas e ideológicas, que ocorre nas salas de aula

“Infelizmente, a história do país é muito mal trabalhada em sala de aula. De modo geral, não há estímulo a leitura. O resultado é que o brasileiro pouco sabe sobre a própria história. E o pouco que sabe vem, na maioria das vezes, da televisão. Em se tratando da geração mais recente, recebe informações por meio de influenciadores. Estes nem sempre com formação na área ou com o conhecimento e os critérios devidos. O que se vê é um conhecimento superficial e muitas vezes distorcidos”, avalia.