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Curiosidades / União Soviética

Soviéticos tinham uma estação espacial armada. E cosmonautas carregavam armas ao espaço... até 2006

Chegaram a levá-las à Estação Espacial Internacional

Fábio Marton Publicado em 19/06/2019, às 07h00 - Atualizado às 08h00

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A pistola dos cosmonautas - Wikimedia Commons
A pistola dos cosmonautas - Wikimedia Commons

A corrida Espacial é geralmente vista como um dos lados mais amigáveis e produtivos da Guerra Fria. Ela terminou, afinal, em 1975, com astronautas e cosmonautas acoplando uma cápsula Apollo a uma Soyuz e tirando fotos juntos.

Por baixo dos panos, porém, a paranoia corria solta. Em 1967, um tratado internacional, assinado por URSS e EUA, baniu armas do espaço. Mas satélites espiões de ambos os lados continuavam a tirar imagens de segredos estratégicos, como a posição de bases nucleares. Havia planos até mesmo de colocar armas nucleares no espaço. Diante disso, cogitava-se que veículos espaciais receberiam o mesmo tratamento que os aviões espiões: chumbo.

Almaz (Aama3 , diamante) foi o nome do programa militar espacial ultrassecreto soviético. Uma tentativa de militarizar o voo espacial tripulado. Era uma resposta ao MOL, “Laboratório Orbital Tripulado”, o projeto da Força Aérea dos EUA para uma estação espiã militar, divulgado amplamente em 1963.

O MOL nunca saiu do papel. Foi cancelado em 1969, quando ficou claro que satélites não tripulados faziam o trabalho melhor e sem o mesmo risco. Mas a União Soviética seguiu firme com o seu projeto. Entre 1973 e 1976, três estações espaciais foram lançadas, supostamente como parte do programa da estação espacial civil Salyut. E todas atendiam por esse nome.

Os cosmonautas Georgi Dobrovolski, Vladislav Volkov e Viktor Patsayev / Créditos: Wikimedia Commons

A Salyut 2, a primeira do programa armado Almaz a ser lançada, falhou após pouco tempo em órbita. Mas a 3 e a 5 deram certo e receberam cosmonautas em 1974 e 1976-77. Quanto a estes, eram militares – mas, até aí, quase todos os cosmonautas (e astronautas) eram pilotos da Aeronáutica. Neil Armstrong, supostamente civil, era um veterano da Guerra da Coreia que testava aviões militares.

Veículo armado

Mas o que realmente separava a Salyut 3 de qualquer outro objeto mandado ao espaço é que foi o único veículo espacial armado da História. Além de uma enorme variedade de câmeras espiãs, ela possuía um canhão giratório de 23 milímetros, adaptado de um bombardeiro Tupolev Tu-22.

Que foi disparado e conseguiu destruir o satélite-alvo. Fez isso num momento em que estava sem cosmonautas – seria muito arriscado fazer esse teste com gente envolvida.

A Salyut 5 deveria portar foguetes, mas não há registro de jamais ter sido armada. A quarta estação do programa Almaz iria ao espaço com o canhão Shchit-2, a primeira arma desenvolvida especialmente para o espaço. Mas o projeto acabou cancelado antes disso.

A paz voltou a reinar no grande abismo, mas o projeto não foi um desperdício total. O módulo de carga Zarya, criado então, teve a honra de se tornar a primeira peça da Estação Espacial Internacional, em 1998.

E, ironia das ironias, uma companhia privada britânica, a Excalibur, pretende criar um negócio de turismo espacial usando duas estações soviéticas e vários módulos construídos para o Almaz, que passaram décadas pegando poeira antes de acabarem vendidos e transformados em pioneiros da chegada do capitalismo ao espaço.

Pistola espacial

Pode ter havido apenas uma estação armada, mas muitos cosmonautas foram para o espaço carregados. É um hábito vindo da Força Aérea – um piloto não vai atirar no céu, mas precisa se defender se cair em território
inimigo.

No começo, eram pistolas regulares do Exército. Até 1986, quando foi criada a bizarra TP-82, uma escopeta de três canos portada pelos cosmonautas. Que foi usada até 2006, o que quer dizer que já esteve na Estação Espacial Internacional. O design não atende a qualquer especificação do voo espacial, mas sim a um problema bem russo: era uma defesa contra ursos.

Foi criada a pedido de Alexey Leonov, o cosmonauta-chefe. Em 1965, a missão Voskhod 2, na qual se tornara o primeiro humano a fazer um trabalho útil numa caminhada espacial, se perdeu na volta e caiu a 2 mil quilômetros de seu alvo, em meio à floresta siberiana. Leonov e seu parceiro agradeceram então à paranoia da Guerra Fria tê-los munidos com uma pistola.

Em 1984, os soviéticos tentaram criar uma pistola espacial de verdade, para atirar lá em cima. Era a laser, para disparar no vácuo. Ficou só no protótipo. Não havia – como ainda não há – como fazer um laser portátil e capaz de matar.

Após 2006, os cosmonautas ainda podem ir opcionalmente armados com pistolas comuns. Eles fazem segredo sobre isso mas, se eles carregam hoje, deixam do lado de fora da cápsula Soyuz, para evitar incidentes.