O lendário agente israelense Eli Cohen se incorporou à crosta superior da sociedade síria, fornecendo inteligência ao estado judeu que foi crucial para sua vitória na Guerra dos Seis Dias de 1967
Em Borat, filme de 2006, o ator Sacha Baron Cohen deu vida ao segundo melhor jornalista do Cazaquistão que viaja pela América e obtém alvos involuntários para compartilhar suas opiniões grosseiras e fanáticas. Já no ano passado, ele estrelou Who Is America, no qual aparece disfarçado em entrevistas com diferentes personalidades da política e cultura americana.
Agora, o ator judeu viveu mais um grande desafio em sua carreira, ao interpretar Eli Cohen na nova série da Netflix, O Espião. A narrativa conta a trajetória real de um ousado agente israelense que foi incorporado aos escalões superiores da sociedade síria, na década de 1960, e forneceu informações cruciais ao estado judeu.
Quem foi Eli Cohen?
Eli Cohen nasceu em 1924 em uma família judia de Alexandria, no Egito. Nesse período, era comum judeus viverem em países árabes. No entanto, essa situação começou a mudar após o estabelecimento do Estado de Israel. O antissemitismo viveu uma onda crescente e Eli sentiu isso na pele. Foi exatamente nessa época que sua família deixou o país para viver em Israel, mas ele permaneceu no local para terminar sua graduação em eletrônica.
Além da parte acadêmica, ele também participava de atividades sionistas no Egito, pelas quais acabou sendo preso. Em seu país de origem, chegou a participar de missões de espionagem israelenses. No verão de 1955 foi para Israel, onde passou um ano recebendo treinamento como espião. Em sua volta para o Egito, foi considerado imediatamente suspeito e passou a ser monitorado.
Foi durante esses anos que ele tentou se juntar ao Mossad — serviço secreto do Estado de Israel — mas acabou sendo rejeitado em duas ocasiões. Mais tarde, em 1959,se casou com Nadia Majald, uma judia iraquiana, e se estabeleceu na cidade costeira de Bat Yam. Cohen trabalhava como contador, mas seu emprego era intermitente.
O início da série e sua missão secreta
O enredo da série se inicia justamente no ano seguinte de seu casamento, quando ele enfim é aprovado para trabalhar no Mossad. Mas, ao contrário do que é contado, ele recusou a oferta em um primeiro momento e só acabou a aceitando pois perdeu seu emprego um mês depois do convite.
Eli foi recrutado para uma missão especial na qual fingiria ser um empresário sírio que voltaria para o país depois te ter morado por alguns anos na Argentina. Seu objetivo principal era reunir informações de políticos e oficiais militares do alto escalão sírio.
Antes da missão, ele recebeu dois tipos de treinamento: o primeiro para aprender a falar árabe com sotaque sírio, e não com o egípcio nativo. E o segundo visava prepará-lo com ensinamentos de combate. Cohen aprendeu técnicas de direção evasiva, treinamento com armas, táticas de sabotagem, topografia e a principal delas, transmissão por rádio e criptografia.
Além disso, ele assumiu o nome de Kamal Amin Ta’abet. Para consolidar sua imagem, foi enviado para morar na Argentina, onde teve a oportunidade de construir um nome dentro da comunidade de expatriados na Síria. Enquanto esteve no país sul-americano, ganhou a confiança de Amin Al-Hafaz, que mais tarde se tornaria o presidente da Síria. Ele não tinha permissão de contar a ninguém sobre seus planos, nem mesmo à sua esposa, que pensava que ele estava trabalhando no exterior para o Ministério da Defesa de Israel.
Em fevereiro de 1962, Cohen finalmente se mudou para Damasco. Rapidamente conseguiu se infiltrar nos mais altos níveis da sociedade síria, da qual entretinha políticos e oficiais militares em festas extravagantes regidas por mulheres e bebidas.
Enquanto permanecia sóbrio, embebedava-os, e assim, acabavam relevando segredos sobre seus respectivos trabalhos. Como consequência, fez amizades e recebeu instruções militares classificadas e visitou locais militares sírios. Cohen então enviava informações de volta a Israel usando um transmissor de rádio oculto.
Durante sua missão, ele voltou algumas vezes para visitar sua família e se reunir com membros do Mossad. O último encontro ocorreu em 1964. Na ocasião, ele disse aos oficiais que queria permanecer no país, pois estava preocupado que um novo comandante sírio não gostasse dele. Mas ele acabou sendo convencido a retornar uma última vez.
O trágico fim de um espião israelense
No ano seguinte, os sírios conseguiram rastrear suas transmissões de inteligência. Ele foi condenado durante um julgamento sem defesa e acabou sendo sentenciado à morte. Israel tentou desesperadamente comutar sua sentença e, apesar dos pedidos de líderes mundiais e até mesmo do papa João Paulo VI, foi enforcado publicamente em maio daquele ano, sua morte foi transmitida ao vivo pela TV Síria.
Depois de morto, seu corpo foi exposto por seis horas e coberto por uma placa com palavras antissionistas. Desde então, seus restos mortais jamais foram devolvidos à seus familiares, apesar dos inúmeros pedidos. O único vestígio dele foi um relógio recuperado pelo governo israelense no ano passado.
Eli Cohen não foi o único israelense que realizou tal missão, embora seja, talvez, o mais conhecido. Acredita-se que as suas informações fornecidas tenham sido cruciais para a vitória de Israel na Guerra dos Seis dias, de 1967.
Em uma viagem que fez às Colinas de Golã, Cohen sugeriu a um oficial do exército que plantasse árvores para iludir os israelenses — assim eles pensariam que não haveria nenhuma fortificação — e também forneceria sombra aos soldados.
Essas árvores ajudaram Israel a identificar onde estavam localizadas as tropas sírias. Com isso, Levi Eshkol, falecido primeiro-ministro israelense, creditou a Eli a possibilidade de salvar inúmeras vidas israelenses.