Carlota passou grande parte da vida bolando complicadas manobras políticas para tirar dom João do trono, mas sem o menor sucesso
A cena aconteceu a bordo do navio Afonso de Albuquerque, que flutuava em algum ponto do Atlântico Norte no começo de 1808. Com a cabeça recém-raspada, a princesa dona Carlota Joaquina e suas damas de honra mais pareciam mendigas que senhoras da nobreza. Mas o pior ainda estava por vir.
O couro cabeludo de cada uma delas teve de ser besuntado com banha de porco e salpicado com pó antisséptico, para evitar que a infestação de piolhos voltasse. Se Carlota ainda não detestava a ideia de fugir para o Brasil, essa última humilhação deve ter sido o suficiente para fazê-la odiar a terra para onde estava indo.
Não que a vida da princesa em Portugal tivesse sido um idílio. Dona Carlota parece ter ocupado a maior parte de seu tempo tentando puxar o tapete do marido, o príncipe regente e futuro rei dom João VI. Nunca conseguiu. Mas suas intrigas deram um trabalho dos diabos para o consorte e fizeram até com que os dois filhos da princesa, dom Pedro e dom Miguel, guerreassem entre si. A tendência da soberana à traição foi resultado tanto da incompatibilidade entre ela e o marido quanto do papel político que seu casamento deveria ter.
União de dinastias
A união de Carlota com dom João foi um desastre desde o começo. Ela tinha apenas dez anos quando, em 1785, veio de Madri para casar-se com um noivo oito anos mais velho. A personalidade dos dois não podia ser mais antagônica. Dom João era um sujeito plácido e bonachão ; dona Carlota, com razão, desprezava o marido.
Seus pais e irmãos viam-na como um instrumento da política espanhola em Portugal, e ela se dispôs a cumprir esse papel conspirando para tomar o poder. Dom João sempre conseguia barrar as manobras da princesa. Mas, com o tempo, ela foi arregimentando um grupo de seguidores.
Por isso, quando foi tomada a decisão de fugir para o Brasil, Carlota chegou a implorar que sua família viesse buscá-la, pois sentia que sua base de poder seria totalmente destruída se zarpasse para a colônia.
No fim das contas, a princesa teve de se instalar no país que odiava. Em 1808, fazia muito tempo que o casamento de dom João e dona Carlota Joaquina era apenas de fachada, e a chegada dos soberanos ao Rio de Janeiro só acentuou esse fato. Os dois passaram a viver em palácios separados por vários quilômetros, e a princesa costumava cavalgar sozinha pelas ruas cariocas ou caçar nas matas vizinhas.
Na cama com Smith
Ao contrário do que dona Carlota esperava, a vinda para o Brasil deu a ela uma nova chance de ganhar poder político. Isso porque Napoleão traiu a Espanha, com a qual tinha se aliado durante a invasão de Portugal, e decidiu instalar seu próprio irmão, José Bonaparte, no trono espanhol. Como o irmão de Carlota Joaquina era prisioneiro dos franceses e o pai dela tinha abdicado do trono, ela podia ser considerada a herdeira da coroa espanhola. Ao mesmo tempo, estava vivendo na América do Sul, a um passo das colônias hispânicas que corriam o risco de se desmembrar com a ocupação de sua metrópole.
Dona Carlota pôs-se a manobrar para que as colônias da Espanha a aclamassem como regente. E ganhou o apoio de sir Sidney Smith, almirante da frota britânica no Brasil que, segundo as más línguas, andava frequentando a cama da princesa.
Ela mandou cartas para os governadores de quase todas as províncias da América do Sul e chegou a exigir que dom João a deixasse ir para Buenos Aires. “Quando Vossa Alteza for solicitada de maneira formal e autêntica, poderá empreender sua viagem”, escreveu o príncipe, para ganhar tempo. Mas teve início o processo de independência das colônias espanholas na América e o plano foi arquivado.
A princesa passou o resto de seus anos no Brasil cada vez mais amargurada e impotente. Bastou que ela voltasse a Portugal para que retomasse as intrigas, instigando seu filho mais novo, dom Miguel, a rebelar-se – sem sucesso – contra o pai. Quando dom João morreu, Miguel usurpou o poder de sua sobrinha, a filha de dom Pedro. Depois de tantas tramas, dona Carlota teve ao menos o gosto de morrer com seu filho favorito no trono.
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