O documentário "Soldados do Araguaia" revela os casos de tortura e abusos emocionais que ex-militares sofreram durante o treinamento de combate à Guerrilha do Araguaia
É de conhecimento geral que a época da Ditadura Militar no Brasil, de 1964 à 1985, foi marcada por intensa repressão por parte do Estado, assim como por guerrilhas revolucionárias que lutavam pelo fim do regime.
Entre torturas, perseguições, prisões nos famosos "porões da ditadura" e exílios, os guerrilheiros foram desaparecendo do mapa, até que os grupos de resistência fossem totalmente desarticulados pelas forças armadas. Mas, além deles, outro grupo também sofreu na mão do Estado: os próprios soldados.
O documentário Soldados do Araguaia conta a história de ex-militares que foram recrutados para combater a grande Guerrilha do Araguaia, formada principalmente por membros da ala radical do Partido Comunista do Brasil.
O filme tem menos de uma de uma hora e meia, e foi produzido pelo carioca Belisário Franca com a ajuda do jornalista paraense Ismael Machado. Os dois trazem relatos de diversos soldados de baixa patente, os conhecidos "soldados ribeirinhos", que detalham os seus dias de treinamento no sul do Pará, e expõem as dificuldades que passaram naquele período, e como fizeram para superar os tempos de pesadelo.
Algumas estipulações afirmam que haviam entre 3.500 até 20 mil soldados, contra um grupo de comunistas de 69 a 90 pessoas, que ainda tinham alguma ajuda da população local. Entre esses milhares de militares, apenas 60 eram ribeirinhos, escolhidos para fazerem parte do exército por seu excelente conhecimento da região conhecida como Bico do Papagaio, na fronteira entre os estados do Pará, Maranhão e Tocantins, que passava pelo Rio do Araguaia, lugar onde os militantes se estabeleceram.
O treinamento contou com diversas violências. Os entrevistados contam que foram alvos de espacamento e colocados no pau de arara, assim como tiveram vezes em que foram lambuzados de açúcar e colocados presos no meio do mata, onde ficavam a noite toda sendo carcomidos por marimbondos, mosquitos, pernilongos e outros insetos. Além disso, também tiveram momentos em que foram obrigados a tomar sangue de cobra ou de boi coagulado.
Por outro lado, algumas das famílias dos soldados também sofreram perseguição e tortura enquanto os homens estavam em missão. "Vejo fantasmas toda hora", diz um dos entrevistados.
A justificativa dessa preparação desumana era a de que, quando viessem a capturar os guerrilheiros, tivessem um ódio acumulado e uma sede de vingança. Além disso, eles não poderiam ter dó dos comunistas, e deveriam aplicar as torturas que sofreram nos inimigos.
Eles também eram intruídos a perseguirem os habitantes locais, que poderiam ter algum conhecimento sobre a guerrilha revolucionária, para que lhe arrancassem informações sobre os militantes. Se eles não ajudassem na investigação, eram ordenados a destruir seus plantios familiares, que por muitas vezes podia ser a única fonte de sustento daquela casa.
A Guerrilha do Araguaia foi totalmente exterminada, e praticamente todos os atuantes foram torturados e mortos. No documentário, um dos ex-militares revela que teve que realizar a morte dos capturados e que muitos deles foram vítimas da "viagem para Brasília", um tipo de assassinato que consiste em jogar os reféns do alto de helicópteros em uma cachoeira, para sumir com os corpos. Eles também eram responsáveis por descartar o que chamavam de "sacos de cocos", que eram basicamente cabeças decapitadas dos militantes.
Quando a campanha militar acabou em outubro de 1974, com a captura de Walkiria Afonso Costa, a última guerrilheira viva do grupo revolucionário, os soldados foram desligados do Exército sem direito à aposentadoria.
Anos depois, os testemunhos dos ribeirinhos foram parar na Comissão da Verdade, quando exigiram assistência psicológica que a instituição promovia para os civis torturados através da Clínica do Testemunho.
Segundo o documentarista Belisário, os profissionais da clínica primeiramente suspeitaram dos relatos, pois, era muito mais comum que os oficiais fossem vistos como os próprios agentes da repressão, do lado do torturador, e não do torturado, mas "logo ficou claro, no entanto, que os fardos emocionais e físicos de alguns combatentes eram tão pesados quanto aqueles das vítimas civis, com o agravante de que os soldados ainda se encontravam do 'lado errado' da História", contou o diretor da Clínica do Testemunho, em entrevista para a VICE.
Confira aqui o trailer do documentário Soldados do Araguaia.
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