Após passarem 761 dias no Anexo Secreto, Anne Frank, sua família e outros judeus foram presos pelos nazistas em 4 de agosto de 1944
"Wo sind die Jueden?" ('Onde estão os judeus?'). Esse foi o grito que se perpetuou naquela sexta-feira, 4 de agosto de 1944, quando o Sicherheitsdienst (Serviço de Segurança) chegou na rua Prinsengracht, 263, logo pela manhã.
O Anexo Secreto, onde os Frank se escondiam com a família Van Pels e Fritz Pfeffer, havia sido denunciado após mais de dois anos abrigando oito judeus que fugiam dos horrores promovidos pelos nazistas.
O último registro de Anne em seu diário aconteceu apenas três dias antes, em 1º de agosto. Os escritos da menina, que se tornou uma das vítimas mais emblemáticas do Holocausto, ajudaram a tratar as vítimas não só como números, mas como histórias apagadas pelos horrores da Segunda Guerra Mundial. Saiba tudo o que aconteceu naquele fatídico dia!
Conforme recorda o site da Anne Frank House, um clima ensolarado marcava aquela manhã quente do 761º dia no Anexo Secreto. Fazia mais de dois anos que Anne Frank e sua família entraram no esconderijo, na fábrica de Otto, em 6 de julho de 1942.
Mas tudo mudou entre as dez e meia e onze horas da manhã, quando o Serviço de Segurança chegou ao local. A equipe era comandada pelo SS Hauptscharführer (líder de esquadrão da SS) Karl Silberbauer.
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Ainda no andar térreo do armazém da Opekta, os agentes se dirigiram até o funcionário Willem van Maaren, que os acompanhou até o primeiro andar — onde trabalhavam os funcionários do escritório.
"Um homem baixo entrou, segurando um revólver que estava apontado para mim", recordou posteriormente Miep Gies, ajudante e uma das guardiãs do Anexo, em entrevista pós-Guerra, conforme recorda a Anne Frank House.
Os policias se dirigiram até o escritório de Victor Kugler, diretor administrativo e também protetor do esconderijo. Por conta de sua função, responsável pelas operações comerciais da fábrica, ele acabou sendo interrogado e levado com os agentes para revistar o prédio.
A polícia subiu para o depósito no prédio principal e perguntou o que guardávamos em todas aquelas caixas, sacos e sacolas. Eu tive que abrir tudo. Eu disse a mim mesmo: se for apenas uma busca domiciliar, espero que acabe logo", relatou Kugler anos depois.
Durante a inspeção no local, os agentes chegaram até a estante giratória de livros que escondia a entrada ao Anexo Secreto. Olhares mais casuais deixariam certamente a entrada secreta passar desapercebida, mas os policiais logo descobriram a passagem para chegar ao esconderijo.
Quando os oficiais chegaram lá, os moradores do Anexo Secreto foram completamente pegos de surpresa. Embora vivessem há mais de dois anos com o medo constante de serem descobertos, a chegada dos nazistas sem aviso tornou as coisas ainda mais trágicas.
"Eu estava lá em cima com a família Van Pels no quarto de Peter, o ajudando com seus deveres de casa. De repente, alguém veio correndo escada acima e então a porta se abriu e havia um homem bem na nossa frente com uma pistola na mão", relembrou Otto Frank, segundo reportado pela Anne Frank House.
Lá embaixo, todos estavam reunidos. Minha esposa, as crianças e a família Van Pels estavam todos lá com as mãos para o alto", continuou o pai de Anne.
Além dos Frank e dos Van Pels, Fritz Pfeffer, outro morador do Anexo Secreto, também foi levado do esconderijo. Quando chegou ao espaço, Karl Silberbauer pegou uma pasta que pertencia a Otto, que guardava os papéis do diário de Anne, e a esvaziou para encher de objetos de valor. Além das prisões, era prática comum a SS também roubar pertences dos judeus.
Mas não foram apenas os oito moradores do Anexo Secreto que foram detidos naquele dia, Kugler e Johannes Kleiman (outro dos guardiões do esconderijo), também foram presos e levado de lá. Ao todo, a operação durou pouco mais de duas horas.
Por volta da uma da tarde, como era de costume, Jan Gies, o marido da ajudante Miep, chegou a Opekta para almoçar com as pessoas do Anexo. Mas sua esposa o avisou do acontecido e da presença dos policiais, que ainda estavam por lá.
Jan, imediatamente, voltou para o local onde trabalhava, para pensar em um modo de ajudar os Frank e as outras pessoas que estavam sendo presas. Ele decidiu buscar apoio com o irmão de Johannes, que trabalhava nas proximidades, mas quando eles retornaram, só foram capazes de observar os moradores do Anexo Secreto e seus ajudantes sendo colocados numa van policial.
Os detidos foram levados para o prédio do Sicherheitsdienst na rua Euterpestraat, onde foram trancados em uma sala e, posteriormente, levados para interrogatório. Os oficiais buscavam informações se os ajudantes ou as pessoas que viviam no Anexo Secreto tinham conhecimento de outros esconderijos de judeus.
A Anne Frank House relata que Johannes Kleiman e Victor Kugler ficaram em silêncio. Já Otto Frank disse que, após 25 meses escondidos, eles haviam perdido o contato com todos seus amigos e conhecidos.
O próximo passo feito pelos agentes do Serviço de Segurança foram separá-los. Kleiman e Kugler foram levados para o centro de detenção em Amstelveenseweg, e as oito pessoas do Anexo Secreto para o centro de detenção em Weteringschans.
Depois da prisão, Johannes e Victor acabaram no campo de Amersfoort. Após algumas semanas, o comando do campo liberou Kleiman por conta de sua saúde precária. Victor, por sua vez, foi transferido para outros locais antes de conseguir escapar, em março de 1945, durante uma marcha em direção à Alemanha nazista.
Algum tempo depois das prisões, Miep Gies e Bep Voskuijl (guardiã do Anexo e confidente de Anne Frank) voltaram ao esconderijo para recolher os papéis do diário que estavam espalhados pelo chão.
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A dupla guardou os relatos e os levaram até o escritório da Opekta, onde foram entregues a Otto Frank — único dos moradores do Anexo Secreto a sobreviver — após a Guerra. O Diário de Anne Frank foi publicado em 25 de junho de 1947.