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Matérias / Edgar Allan Poe

Edgar Allan Poe: Morte do mestre do terror é um mistério de 175 anos

Poe faleceu em condições tão enigmáticas, que a morte parece ter saído de seus contos: 'É a maior saída de palco literária da história', diz biógrafo

Fabio Previdelli
por Fabio Previdelli
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Publicado em 14/10/2024, às 21h00

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Edgar Allan Poe, escritor estadunidense - W.S. Hartshorn / Domínio Públio / Wikimedia Commons
Edgar Allan Poe, escritor estadunidense - W.S. Hartshorn / Domínio Públio / Wikimedia Commons

Edgar Allan Poe é creditado pela criação do gênero de ficção criminal. Afinal, a publicação do clássico 'O Assassinato da Rua Morgue', em 1841, abriu caminho para outros grandes detetives da literatura, como Sherlock Holmes e Hercule Poirot.

+ Agatha Christie odiava detetive Poirot, mesmo assim, guardou sua morte por 30 anos

Mas, curiosamente, o maior mistério de sua intensa jornada transcendeu a literatura e chegou à sua própria vida. Allan Poe faleceu em 7 de outubro de 1849, aos 40 anos, de uma forma tão enigmática e absolutamente bizarra que a história parece ter sido tirada de um dos trechos de seu livro

Com a maioria das discussões sobre pessoas famosas, você começa no lugar lógico: quando alguém nasce. Com Poe, a discussão sempre parece começar com sua morte. E com razão. É a maior saída de palco literária da história", aponta Mark Dawidziak em entrevista exclusiva à equipe do site Aventuras na História. 

Jornalista, escritor e professor universitário, Dawidziak é autor de 'O Mistério dos Mistérios: A Morte e a Vida de Edgar Allan Poe', biografia que chega ao Brasil pela Editora Cultrix.

"Poe realmente conseguiu morrer em circunstâncias que refletem as duas realizações literárias pelas quais ele é mais lembrado: o conto de terror e a história de mistério", explica o autor

Uma morte misteriosa 

Em meados de 1849, Allan Poe começou uma turnê de palestras cujo objetivo era arrecadar fundos para uma revista literária que tinha intenção em publicar. É sob esse contexto que ele, em 27 de setembro, embarcou em uma balsa de Richmond, Virgínia, para Baltimore. 

No dia seguinte, Poe tinha uma viagem programada para Nova York, mas isso jamais aconteceu. Segundo os relatos da época, o escritor só foi encontrado no dia 3 de outubro, jogado na sarjeta em frente ao Gunner’s Hall. Ele estava inconsciente e era incapaz de se comunicar, como se estivesse em um estado permanente de embriaguez. 

"O detalhe mais marcante sobre a morte de Poe, para mim, é que ele estava usando roupas que não eram suas quando o encontraram", diz Mark. "Esse detalhe chamaria certamente a atenção e o interesse de qualquer detetive de homicídios, estudioso de Poe ou detetive amador". 

O escritor Edgar Allan Poe - Domínio Público

Sem usar seu habitual terno de lã preta, Edgar Allan Poe foi levado ao hospital, mas nunca conseguiu recuperar sua plena consciência e, portanto, jamais foi capaz de esclarecer o que o deixou em tais condições. 

Assim ele permaneceu e morreu em 7 de outubro. E, ainda, não temos provas conclusivas do que o matou", aponta o autor, mesmo já tendo se passado 175 anos da morte de Poe. 

"As roupas mal ajustadas e surradas falam de um segundo mistério, e esses são os dias em que ele desaparece… (...) Nenhuma testemunha jamais se apresentou para dizer que sequer vislumbrou Poe durante esses dias, então as roupas são uma pista tentadora. Mas uma pista para o quê?", questiona Dawidzia

Uma nova visão de Poe

Mas, afinal, a mística em torno da figura de Edgar Allan Poe ajudou a perpetuar o mistério em torno de sua morte? "O oposto, na verdade", discorre Mark. "Sua morte misteriosa ajudou a perpetuar o interesse em sua vida. Essa é uma das razões pelas quais inverti a ordem normal no subtítulo e o tornei 'A Morte e a Vida de Edgar Allan Poe'".

Mas não só isso, na biografia do pai da ficção criminal, Dawidziak também mostra como — curiosamente — a morte de Allan Poe ajudou a revelar detalhes de sua vida. "Um estudo cuidadoso de sua vida mostra que a caricatura que fizemos de Poe está completamente errada". 

Ele não era o solitário perpetuamente sombrio, mórbido, doentio e de ombros caídos como pensamos dele", esclarece.

O jornalista aponta que o autor foi, de fato, saudável e atlético a maior parte de sua vida. "Ele andava rapidamente com os ombros para trás, caminhando em um passo militar. Era um bom boxeador e conseguia vencer qualquer competição de salto. Ele podia ser charmoso e engraçado, tanto pessoalmente quanto na imprensa. Longe de ser um solitário, ele tinha um amplo círculo de amigos". 

E, embora tenha vivido apenas até os 40 anos, Mark reforça que Allan Poe deixou escritos suficientes para que a primeira coleção acadêmica de suas obras abrangesse 17 volumes.

Edgar Allan Poe
O túmulo de Edgar Allan Poe, em Baltimore - Getty Images

"E, apenas uma pequena fração disso eram histórias de terror ou mistério. Ainda assim, esse pequeno grupo de histórias o definiu como escritor e pessoa. Ele foi um escritor incrivelmente prolífico, dedicado, cuidadoso e versátil".

Teorias, teorias e mais teorias

As teorias sobre as causas da morte de Poe incluem suicídio, assassinato, doença, envenenamento e até fraude eleitoral. Mas como uma morte pode levantar possibilidades tão divergentes assim? 

+ Morte misteriosa de Edgar Allan Poe acumula teorias

Dawidziak aponta que, com Poe, não se trata do quê torna essas teorias distintas, mas sim o que elas têm em comum. "Allan Poe morreu com o que um patologista forense chamaria de ‘sintomas não específicos’. Em outras palavras, os sintomas podem ter sido causados ​​por um número impressionante de condições". 

Seu sistema nervoso estava destruído. Ele estava febril. Incoerente. Perdia e recobrava a consciência. Não há um sintoma que o vincule a apenas uma causa possível. Então você pode pegar uma teoria e destrinchá-la em torno dessas causas", continua.

Mark também aponta quatro motivos principais pelos quais ele acredita que a morte de Edgar Allan Poe continuará um caso arquivado. "Primeiro, não houve autópsia (e mesmo que houvesse, não teria valido nada, já que poucos médicos sabiam como conduzi-las e os instrumentos da época eram primitivos)". 

"Segundo, nenhuma certidão de óbito. Terceiro, nenhum tecido mole sobrevivente que possa ser submetido à perícia forense moderna. E quarto, nenhuma testemunha confiável. As poucas testemunhas da morte de Poe não apenas se contradizem entre si, elas se contradizem entre suas próprias palavras, deixando para trás relatos muito diferentes em tom e detalhes", contextualiza. 

Em 'O Mistério dos Mistérios: A Morte e a Vida de Edgar Allan Poe', Mark descarta muitas delas, mas também se dedica a uma em específico: um suspeito principal que teve de longe os maiores meios e oportunidades. 

Capa do livro 'O Mistério dos Mistérios' e foto de Mark Dawidziak - Editora Cultrix

"Não quero identificá-lo especificamente aqui, porque isso seria entregar o final do livro. No entanto, há uma teoria que muitos estudiosos de Poe e patologistas forenses acreditam ser uma causa altamente provável", diz, reforçando que, apesar das desconfianças, a possibilidade nunca pode ser mais do que um caso circunstancial. 

"Então, embora eu acredite que esta seja uma teoria convincente e irresistível, dificilmente insisto nela. Não pode ser definitivamente provada, por todas as razões que acabei de declarar", salienta. 

Por fim, Mark Dawidziak aponta que, como já dito, a morte enigmática de Edgar Allan Poe contribuiu tanto para seu legado que ele não tem certeza se gostaria que o mistério fosse resolvido. 

"Alguns mistérios não são feitos para serem resolvidos, e certamente perderíamos mais do que ganharíamos ao finalmente saber com absoluta certeza como ele morreu e o que aconteceu com ele durante os dias desaparecidos", finaliza.