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Banana: A rainha das frutas

Países e pessoas foram arruinados por ela - e um pesquisador acredita que ela era a fruta do Paraíso na Bíblia

Carolina Pasquali Publicado em 27/02/2017, às 00h00 - Atualizado em 23/10/2017, às 16h35

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Carmen Miranda e seu chapéu de bananas em 'Entre a loira e a morena' (1943) - Reprodução
Carmen Miranda e seu chapéu de bananas em 'Entre a loira e a morena' (1943) - Reprodução

Eva estava feliz da vida naquela maravilha que era o Jardim do Éden. Até que uma astuta serpente a seduziu a comer o fruto de uma árvore frondosa – o único proibido por Deus. A mulher sucumbiu, comeu do fruto e o dividiu com Adão. Por causa da banana, os dois foram expulsos do paraíso.

Não estranhe. A tradição cristã sempre relacionou o relato da Bíblia à maçã. Mas, segundo o jornalista americano Dan Koeppel, há muitas evidências de que o tal fruto proibido que teria desgraçado os dois moradores do Éden seja mesmo a banana. A maçã só teria aparecido no ano 400, com a versão da Bíblia escrita em latim por São Jerônimo. O trabalho, conhecido como Vulgata, foi largamente difundido nos séculos posteriores, especialmente após Johannes Gutenberg inventar os tipos móveis, no século 15. A confusão teria se espalhado assim: ao traduzir do hebreu a descrição do fruto proibido do Jardim do Éden, São Jerônimo escolheu a palavra malum. Segundo historiadores, com a intenção de dizer “malicioso”. Mas malum também significa maçã em latim – e, com a Bíblia impressa em larga escala por Gutenberg, o erro teria ganhado força.

Adão e Eva, de acordo com a Bíblia que conhecemos hoje, teriam usado folhas de figueira para cobrir seus corpos nus. Folhas de figueira, argumenta Koeppel, não são grandes o suficiente para cobrir nada. Folhas de bananeira, sim. E a evidência é reforçada pelo que poderia ser mais uma confusão de tradução: banana, durante um período, era chamada de figo.

A obsessão de Dan Koeppel por bananas começou em 2003. Nessa época, uma matéria publicada pela revista britânica New Scientist chamou a atenção do jornalista, editor contribuinte da americana National Geographic. O texto falava de uma praga, ainda sem cura, que ameaçava plantações de banana. Koeppel decidiu que aquela matéria terminava exatamente onde começaria outra: a sua.

O jornalista propôs o tema aos editores da Popular Science, revista para a qual também colaborava. Eles toparam – e o que era para ser uma matéria virou livro. O resultado está em Banana: the Fate of the Fruit That Changed the World (“Banana: o destino da fruta que mudou o mundo”). A pesquisa incluiu viagens a Bélgica, Equador, Honduras e China, dezenas de entrevistas e uma extensa coleta de documentos. O texto demonstra que, se a banana não mudou o mundo, como quer provar o autor no título do livro, ela esteve presente em momentos decisivos da nossa história. E corre o risco de desaparecer.

A primeira banana

As primeiras fazendas de banana surgiram provavelmente no território que hoje vai da Índia à Austrália. Em Papua-Nova Guiné, por exemplo, em um lugar chamado Kuk Swamp, cientistas encontraram as tentativas mais antigas de cultivar de maneira ordenada o que antes eram plantas selvagens. Há 7 mil anos, essa região úmida e fértil abrigava uma diversidade de flora difícil de encontrar em qualquer outra parte do mundo. Kuk Swamp foi um dos primeiros lugares onde nativos – que antes viviam de extração e caça – organizaram-se em uma sociedade agrícola.

Os primeiros cientistas a chegar à região, nos anos 70, encontraram resquícios de uma enorme e organizada plantação. Mas eles não sabiam o que era cultivado ali. Em 2002, pesquisadores australianos determinados a desvendar o mistério analisaram exaustivamente microfósseis e resquícios encontrados no solo. A conclusão? Os nativos de Kuk Swamp já plantavam bananas em 5000 a.C.

A fruta chegou à África, saída da Ásia, há cerca de 3 mil anos. Logo espalhou-se pelo Oriente Médio e depois pela Europa. Europeus levaram as bananas para suas colônias e negociantes árabes foram responsáveis pela criação do nome que conhecemos hoje. Eles se referiam às frutas que comercializavam como banan, ou dedo em árabe, por causa de seu formato. O último continente a ser conquistado pela fruta – e talvez onde ela mais tenha gerado controvérsias – foi o americano.

Beleza americana

A chegada das bananas à América é contraditória. Tradicionalmente, acredita-se que os europeus vieram com elas, no século 15. Mas alguns indícios apontam para o fato de que as bananas podem ter descoberto o continente antes dos colonizadores. Segundo Koeppel, na Ilha de Páscoa e no Havaí, no Pacífico, o termo usado para banana é maika, exatamente o mesmo empregado na Nova Zelândia. Não há evidências fósseis da existência da fruta nas ilhas antes da chegada de Cristóvão Colombo à América, mas a coincidência de termos faz com que alguns cientistas defendam que polinésios já haviam aportado no nosso continente pelo oceano Pacífico. E, claro, trouxeram a banana com eles.

Oficialmente, no entanto, a banana chegou à América em 1516, pelas mãos do reverendo espanhol Tomás de Berlanga. Ele desembarcou com a fruta em Santo Domingo, atual República Dominicana. Algumas décadas depois, a fruta já havia se espalhado pelo Caribe e chegado à América do Sul.

Um dos primeiros registros da chegada dela aos Estados Unidos data de 1870. Lorenzo Dow Baker, capitão do navio inglês Telegraph, partira em direção à Venezuela, levando dez mineradores de ouro que pagaram o equivalente a 125 mil dólares atuais cada um pela viagem. Na volta, no entanto, o Telegraph precisou de conserto e Baker parou na Jamaica. O capitão decidiu então tentar vender uma fruta exótica que existia por lá para compensar o prejuízo. Levou 160 cachos de banana da Jamaica para o porto de Jersey City, no estado de Nova Jersey – as frutas foram transportadas na proa do navio, para que o vento ajudasse a conservá-las.

A empreitada foi um sucesso. As bananas chegaram a tempo de ser comercializadas e as vendas renderam ao capitão o equivalente a 6400 dólares atuais. Em menos de um ano, Baker se tornou o maior exportador de bananas do Caribe. A fruta que ele enviava aos Estados Unidos era uma variedade chamada gros michel.

Um dos beneficiários da importação de bananas em território americano era o comerciante Andrew Preston. A fruta não parava nas prateleiras de seu mercado em Boston, e, em 1885, ele e Baker se tornaram sócios. Juntos, criaram a primeira companhia de bananas do mundo, a Boston Fruit. Para aumentar a capacidade de transporte da fruta, Preston decidiu adotar, em larga escala, navios com carga refrigerada. Seu sonho era fazer com que bananas fossem mais consumidas nos Estados Unidos que maçãs. Alguns anos depois, em 1899, a Boston Fruit se uniria a uma empresa que começara as plantações na América Central e selaria o nascimento da gigante United Fruit.

Em 1944, para diferenciar suas bananas das que chegavam aos Estados Unidos, a companhia criou a marca Chiquita e lançou um jingle que entrou para a história como um dos mais conhecidos de todos os tempos. Inspirado pela musa brasileira Carmen Miranda, o comercial mostrava uma banana, com um cesto de frutas na cabeça, cantando a música “I’m Chiquita banana and I’ve come to stay...” (“Sou Chiquita banana e vim para ficar...”).

Risco de extinção

Os negócios da companhia, no entanto, estavam prejudicados desde a virada do século: um fungo atacava as plantações de gros michel. Batizada de doença do Panamá, a praga, misteriosa e incurável, logo se espalhou. A doença foi tão devastadora que uma nova variedade de banana, resistente ao fungo, teve que ser introduzida no mercado americano. Desde a década de 60, a fruta consumida lá é a cavendish.

A chegada da espécie tranquilizou o mercado. Mas havia um risco: que a história se repetisse. As bananas são frutas estéreis, assexuadas e sem sementes. Como não há fecundação ou mistura de carga genética, são absolutamente idênticas entre si. Isso faz com que fiquem vulneráveis: quando uma é contaminada, todas correm o mesmo risco. Em 1991, constatou-se que bananas cavendish já estavam sucumbindo à doença do Panamá na Malásia.

A cavendish também não é resistente à black sigatoka, doença causada por um fungo que destrói as plantações e que já foi detectada em Honduras e Uganda, entre outros países. Cientistas têm lutado para misturar diferentes variedades da fruta e esperam que do resultado surja uma banana resistente, mas os testes ainda não deram resultado. Mutações do mesmo fungo, até agora, estão ganhando a batalha.

Dan Koeppel está convencido de que a solução para o problema seria uma banana geneticamente modificada – não uma mistura de duas variedades que já existem na natureza, mas a criação, em laboratório, de um novo tipo de banana. Só assim, segundo ele, os cientistas teriam recursos para criar uma fruta resistente a pragas, mas igualmente saborosa. E tanto motivo de preocupação é justificado: segundo o autor, nos dias de hoje um americano de 40 anos provavelmente já comeu 10 mil bananas ao longo da vida. Outras 10 mil ainda esperam a vez.


Negócio da América
História da United Fruit confunde-se com a da América Latina

Nunca antes uma companhia havia tido tanto poder, derrubado governos, dominado territórios e interferido tão drasticamente em outros países como a gigante das bananas. Em 1920, a United Fruit, criada em 1899, já valia 100 milhões de dólares, tinha 67 mil empregados e negócios em 32 países. Mas, se tudo ia bem nos Estados Unidos, nos países onde se localizavam as plantações os trabalhadores eram explorados e os governos não ousavam manifestar qualquer oposição. No fim da década de 20, os agricultores colombianos, por exemplo, já não suportavam mais as condições de trabalho. Fizeram greves e mil deles acabaram mortos pelos soldados colombianos, pró-Estados Unidos. A presença da United Fruit, suas negociatas e o apoio da Casa Branca alimentaram instituições tradicionalmente fracas e corruptas na América – herança até hoje difícil de abandonar. Em 1935, a revista Esquire usou o termo “República das Bananas” para nações cujos governantes construíram-se e mantiveram-se orbitando entre as companhias e o governo americano.