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Diversidade, desigualdade e socialismo: 13 verdades e mentiras sobre Cuba

Por anos sob o governo de Fidel Castro, a ilha apresenta complexidade em temas vistos como definidos pela opinião mundial

Bianca Borges Publicado em 05/06/2020, às 11h00

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Fidel Castro segurando uma bandeira de Cuba - Divulgação
Fidel Castro segurando uma bandeira de Cuba - Divulgação

1. Cuba se desenvolveu mais sob Fidel?

Cuba não partiu do zero. Antes da Revolução, a ilha caribenha já se destacava como um país com índices sociais que eram, de forma geral, superiores às estatísticas da maioria dos países latino-americanos. Certamente bem acima do Brasil, com que comparamos. Dá para ver que, do ponto de saída, em algumas áreas o Brasil avançou mais rápido. Mas Cuba se desenvolveu melhor naquilo que a Revolução escolheu como prioridade.

Quando assumiu o poder,  derrubando Fulgencio Batista (1901-1973), um ditador corrupto e brutal que estava atacando  o próprio povo com napalm, acusando-o de colaborar com  a guerrilha, Fidel Castro (1926-2016) estava decidido a fazer  de Cuba uma sociedade com melhores índices de educação,  a promover a reforma agrária e garantir o acesso gratuito à assistência médica. Nessa parte, pode-se dizer que seus principais objetivos foram cumpridos.


2. Cuba superou a pobreza extrema?

Prédios com reboco rachado, carros dos anos 50, roupas penduradas na sacada.  A maioria das imagens de Cuba sugere pobreza. Que o Banco Mundial define como viver com menos de US$ 1,90 por dia (em seu último relatório, de 2015). No mesmo ano, o Escritório Nacional de Estatísticas de Cuba registrou uma renda média de US$ 25 por mês (e US$ 29,60 em 2017). Por esses dados, o país inteiro estaria na pobreza extrema. Mas, com os vários serviços gratuitos, é diferente ser pobre em Cuba do que em Honduras.

Recorremos à ONG americana The Borgen Project, referência em estudos da pobreza mundial, para tentar uma resposta: “Não é razoável esperar que Cuba sequer tente levantar [a renda de] sua população inteira ao ideal da classe média americana. Operando nessa mentalidade, Cuba foi bem-sucedida, em diversas formas, em conseguir prover seus cidadãos com o que outros países não conseguiram”, afirma a jornalista Farah Mohammed, em nome da instituição. “Não quer dizer que Cuba tenha atingido um ideal. As pessoas no país ainda lutam de diversas formas: insegurança alimentar, frustração e uma falta de itens básicos praguejam o país.”


3. Racismo e sexismo foram superados?

Cuba elegeu a bancada de deputados mais diversa de sua história. Dos 605, as mulheres são 53,22%. Já as pessoas autodeclaradas negras ou pardas correspondem a uma parcela de 40,5%. A composição mais recente da Assembleia Cubana revela que o país está abordando de frente dois problemas históricos de sua cultura, mais ou menos negados até pouco tempo atrás: o racismo e o sexismo.

Mas, ao contrário do que afirma o governo socialista, esses dilemas não foram suprimidos por meio da aplicação da sua política de igualdade. Cuba, onde a escravidão foi abolida em 1886, é um país em que predominam europeus e africanos. A convivência entre esses dois não foi exatamente o que podemos chamar de amistosa.

Che Guevara e Fidel Castro em Havana, em 1958 / Crédito: Getty Images

Havia uma clara distinção no tratamento dispensado aos negros, em especial os imigrantes, vindos das demais ilhas caribenhas, que ocuparam o degrau mais baixo da escala racial da sociedade cubana, sendo considerados pelos outros negros e demais cidadãos de Cuba como indivíduos primitivos e bárbaros. Na cultura cubana, mulheres negras e mestiças ainda têm sua imagem hipersexualizada em estereótipos populares. E têm menos acesso a posições de prestígio do que as descendentes de imigrantes europeus.


4. Há desigualdade social?

Em Cuba, os salários podem ter pouca variação por ideal, mas há um tipo de desigualdade particularmente cruel: o dólar. Se um médico ganha US$ 67 por mês, um taxista ganha isso por 100 km rodados, menos de um dia de trabalho.

Nos últimos anos, um dos principais motores da economia cubana são as remessas de dinheiro, em especial de cubanos-americanos. Economistas cubanos estimam que os brancos tenham pelo menos 2,5 vezes mais chances de receber infusão de dinheiro que seus compatriotas afro-cubanos – no censo de 2010, 85% dos cubanos e descendentes vivendo nos EUA se identificaram como brancos.


5. O regime cubano matou 141 mil?

Particularmente em seus primeiros anos, e particularmente em se falando de  pessoas ligadas ao governo Batista, Cuba definitivamente matou seus opositores — no infame paredón, sob torturas, ou em condições horrendas na cadeia.

Como no caso da União Soviética, o número exato varia absurdamente dependendo de a quem se pergunta — e de qual o critério para dizer que foi o governo o responsável pela morte. A questão mais fundamental é: conta quem morreu tentando fugir? Se sim, a famosa cifra máxima de 141 mil, criada há mais de 30 anos, seria muito maior hoje, especialmente depois da crise dos anos 90.


6. Cuba é uma democracia?

Fidel, e depois Raúl, sempre afirmaram governar uma democracia. O país tem eleições e plebiscitos. Partidos políticos além do Comunista Cubano são permitidos — e existem, ainda que, na prática, tenham que se manter na surdina.

As reais eleições cubanas são as pré-eleições: quando candidatos são escolhidos por diversas organizações de trabalhadores, cidadãos individuais e o Comitê para Defesa da Revolução, do qual faz parte a maioria dos cubanos, responsável pela denúncia de atividades “contrarrevolucionárias”.

Seja como for, essa possibilidade de escolher coletivamente é a razão por que apoiadores do regime dizem que é uma democracia mais democrática que as liberais. Escolhido o candidato, nas eleições propriamente ditas cabe dizer sim ou não, por voto secreto – a participação é bastante alta.

No fim das contas, 100% da Assembleia é formada por membros do Partido Comunista Cubano. Escolhido pela Assembleia, o país é governado desde 2018 por Miguel Díaz-Canel. O presidente sucedeu Raúl Castro, o irmão mais novo de Fidel. Castro continuou a ser secretário-geral do Partido Comunista, o que, como o Partido controla tudo, tem na prática mais poder que o presidente.


7. A cultura é controlada?

Cuba foi o primeiro país no Hemisfério Ocidental a instalar um serviço de bloqueio de rádio, em 19633, e continuou a bloquear transmissões estrangeiras.

O governo produz e decide o que as pessoas consomem, mas, obviamente, permite coisas estrangeiras de seu agrado. A Lei 88, de Proteção à Independência Nacional e Economia de Cuba, de 1999, não menciona livros ou nada do tipo, mas “material subversivo dos Estados Unidos”. Na prática, é frequentemente levantada contra opositores.

O país mantém forte controle sobre as obras de arte e expressões artísticas em geral. Cuba está ao lado de China, Irã e Rússia na lista dos países com maior censura.


8. A internet é vigiada?

De acordo com os últimos dados oficiais, entre uma população de 11 milhões de cubanos, 4,5 milhões de pessoas se conectam à internet. Cuba não tem um Grande Firewall como a China, mas usa de filtros, bloqueio de aplicativos e outros recursos, como bloquear o acesso para quem usar termos considerados subversivos.

Mas a maior dificuldade é mesmo o preço, considerado elevadíssimo para um cidadão cubano comum, cujo salário mensal médio é de US$ 30.  Nos pontos de acesso, é cobrado atualmente cerca de US$ 1 por hora. A internet por celular só foi totalmente liberada em 6 de dezembro de 2018, num anúncio do governo cubano.

Havana / Crédito: Divulgação


9. Gays foram perseguidos pelo governo?

Todos os anos, desde 2007, a ilha celebra o dia de luta contra a homofobia. Mas nem sempre foi assim. Entre os anos 1960 e 1970, o país manteve uma espécie de campo de concentração, com trabalhos forçados, as chamadas Unidades Militares de Apoio à Produção (Umap).

Segundo a associação das vítimas Umap Miami, para lá, eram enviados aqueles cujos comportamentos desviavam das condutas condizentes com a moral e os ideais revolucionários, incluindo os gays, que eram submetidos a insultos e divididos em “ativos” e “passivos”.

A perseguição foi admitida pelo próprio Fidel Castro, em entrevista ao jornal mexicano La Jornada, em 2010. Ele alegou então: “Nós tínhamos diante de nós problemas tão terríveis, questões de vida ou morte, que não prestamos atenção suficiente a isto”.


10. Cuba é pobre por causa do embargo dos EUA

Simpatizantes do regime defendem que a penúria é causada pelo embargo americano. Cuba, porém, pode fazer comércio com o resto do mundo (China, Espanha, Brasil, Alemanha e Portugal).

Nos últimos anos, já sob o comando de Raúl Castro, o crescimento PIB do país avançou não exatamente vistosos 2%. Mas Cuba seria rica se fosse capitalista? Talvez não.

 “Na comparação com a América Latina, Cuba se sai melhor do que seus vizinhos do Caribe e da América Central, mas está aquém das regiões mais desenvolvidas do continente, como o Cone Sul. Dificilmente o resultado seria diferente se Cuba tivesse outro regime político e econômico. Os problemas são estruturais, como a escassez de recursos naturais e a infraestrutura deficitária”, afirma Maurício Santoro, da Uerj.


11. Por que Cuba tem um IDH maior que o do Brasil?

Apesar de ter um orçamento mínimo, o governo caribenho consegue oferecer a sua população serviços e assistência que elevam seus indicadores. No ranking 2018 do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), compilado pela Organização das Nações Unidas (ONU), Cuba aparece na 73ª posição (0,777), à frente do México (0,774), Granada (0,772), Sri Lanka (0,770), Bósnia e Herzegovina (0,768), Venezuela (0,761) e do Brasil (0,759).

O relatório avalia o desenvolvimento dos países segundo alguns parâmetros de saúde, renda e educação. No caso de Cuba, seu desempenho é atribuído aos seus bons indicadores de educação e saúde, ainda que a economia seja frágil.


12. Cuba foi um fantoche da URSS?

A crise dos anos 90 mostrou que Cuba dependia economicamente da União Soviética. “Mas não como dependera antes dos EUA”, de acordo com a historiadora Joana Salém, da USP.

“Na sua relação com os EUA, Cuba saía em desvantagem, enquanto com a URSS, a relação havia sido economicamente vantajosa”. Os cubanos conseguiram negociar um preço mais alto para o seu açúcar e comprar petróleo mais barato do bloco soviético.

“Além disso”, lembra Salém, “Cuba demonstrou ter autonomia política em relação à URSS, quando se engajou nas lutas de independência da África e defendeu movimentos de emancipação. Sem falar nas divergências sobre a guerrilha: enquanto Cuba treinou guerrilheiros latino-americanos, a URSS adotou uma política contrária”.


13. A exportação de médicos é ação de propaganda?

Cuba tem no seu programa de exportação de médicos para o exterior um negócio duplamente lucrativo. Seu “exército de batas brancas” funciona como propaganda de governo e também garante à ilha recursos que hoje respondem, segundo a Organização Mundial de Saúde, por cerca de 15% do seu PIB.

 Os contratos firmados com outros países garantem ao governo cubano uma fatia considerável dos salários destinados aos profissionais. Entre os anos de 2013 e 2018, o Brasil recebeu profissionais cubanos para prestarem atendimento em municípios do interior, dentro do programa Mais Médicos, por intermédio da Organização Pan-Americana de Saúde (Opas).

Eles recebiam aproximadamente 30% do valor correspondente ao salário e, pelo contrato, o restante era repassado às autoridades da ilha. Conforme ilustra o documentário brasileiro recém-lançado Médicos Cubanos, alguns representantes da categoria consideram o programa uma forma de escravidão. Ainda assim, trabalhar no exterior pelo programa possibilita aos médicos acumular muito mais do que seria possível se atuassem na ilha, onde o salário é de US$ 67.


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