Muitos acreditam que o bando de Lampião era composto de valentes heróis, todavia, esquecem de ver o ponto de vista das mulheres, submetidas às piores violências
O Cangaço foi um dos movimentos de infração da lei mais famosos da história do Brasil. A sua atuação nos sertões causou desespero e violência entre a população. Independentemente da versão que tivermos do bando de Lampião como heróis ou bandidos, é impossível ignorar o fato de que os bandoleiros cometeram diversas agressões.
Um dos fatores mais fortes na violência do cangaço era a violação do bando com as mulheres. O estupro era visto de maneira ambígua pelos cangaceiros: ao mesmo tempo em que era entendido como uma violação, era frequentemente praticado.
No caso dos estupros coletivos realizados pelos bandos, a prática ficou conhecida como gera. Frequentemente praticados com furor, era uma forma de dominação das mulheres sertanejas comuns entre os homens de Virgulino.
A jornalista Adriana Negreiros foi responsável por um relevante debate dessa infeliz cultura, através da biografia Maria Bonita: sexo, violência e mulheres no cangaço. Para ela, essa pratica comum, como forma de domínio e mantimento de poderes masculinos, tinham diversas motivações individuais.
Muitos casos de estupros eram formas de repressão ao que Lampião ou o bando reprovavam. O primeiro caso de violência relatado por Negreiros é o de uma mulher que Virgulino encontrou, que era casada com um homem de 80 anos. O cangaceiro, inconformado com a situação, degolou o idoso, partindo em seguida para cima da esposa, que foi agredida e estuprada (sempre tendo Lampião como o primeiro a violar a vítima). O rito era comum e praticado contra os inimigos do bando.
Porém, não eram apenas as mulheres de fora do bando que eram estupradas: muitas companheiras dos bandidos também passavam por violências do tipo, pois eram obrigadas a servirem à libido de seus maridos. Muitas delas, inclusive, entraram no bando em situações de sequestro, e começaram no mundo do crime por estupros. Inclusive, nenhuma delas poderia fugir sem antes ser baleada até a morte.
Maria Bonita, ou de Déa, não estava livre dessas agressões. Negreiros afirma em seu livro que “todas as cangaceiras, Maria incluída, eram tratadas como inferiores aos homens. Ela viveu uma existência marcada pela violência – e uma das mais fortes certamente foi entregar a filha recém-nascida, Expedita, para um casal, visto que as cangaceiras não tinham o direito de criar os próprios filhos”.
Outra vítima foi Dadá, que havia sido raptada por Corisco para entrar no cangaço aos 12 anos. Ela foi sequestrada dos braços dos pais, amarada a um jumento e levada para o interior da caatinga, até que o sequestrador parou, a jogou no chão e a estuprou violentamente.
Outro caso notório foi o de Dulce Menezes dos Santos, sequestrada ainda jovem pelo cangaceiro Criança, estuprada e mãe por obrigação. Muitos são os exemplos possíveis sobre o tema, e mesmo assim, a comunidade acadêmica tende a reduzir o peso dos fatores ligados à violência sexual na vida cotidiana do Cangaço.
Essa é uma das denúncias feitas pela revolucionária biografia escrita por Adriana. “Nenhuma dessas terríveis cenas me chocou tanto quanto a mais incômoda das constatações: a de que os relatos das cangaceiras são geralmente desacreditados em relação à extrema brutalidade da qual foram vítimas”, afirmou a autora.
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