Em 1994, vocalista da Legião Urbana definiu fascistas como ‘idiotas com ideologia’ e criticou autoritarismo: "Tem nazista em tudo quanto é canto"
Entre a madrugada do dia 31 de março e 1º de abril de 1964, um Golpe de Estado depôs o então presidente João Goulart. Por longos 21 anos, até 1985, o país viveu um regime autoritário que perseguiu, torturou e executou opositores, quem se manifestasse contra o governo e até mesmo civis.
Com o Congresso dissolvido e a liberdade suprimida, todas as áreas da sociedade sofreram. Na música, por exemplo, compositores tiveram suas canções censuradas ou até mesmo foram obrigados a se exilar.
Uma das mais importantes bandas de rock da história do nosso país, a Legião Urbana, surgiu sob esse contexto — mas já em sua final — em 1982. Formada em Brasília, a composição mais conhecida da banda foi feita por Renato Russo, Marcelo Bonfá, Dado Villa-Lobos e Renato Rocha.
Embora o conjunto só tenha estourado, de fato, um ano depois do regime ser encerrado, o vocalista Renato Russo viveu durante o período antidemocrático do país e fez questão de externar seu posicionamento contra a ditadura.
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O primeiro momento entre eles, recorda matéria publicada pela Rolling Stone Brasil, aconteceu em 1994, em entrevista à MTV Brasil. Naquela época, Russo promovia seu álbum solo 'The Stonewall Celebration Concert'; no qual ele diz apresentar uma mensagem contra o autoritarismo.
Esse meu disco solo tem uma motivação diferente. É para falar contra o fascismo mesmo", disse, conforme transcrição feita pelo Whiplash.
"A grande imprensa está vacilando e pisando na bola. Vejo jornais grandes aqui do Rio de Janeiro dando página inteira para fascistas carecas. Os caras dizendo que gostam de dar porrada e ninguém faz nada. Tem nazista em tudo quanto é canto. Em São Paulo, tem esses babaquinhas carecas, que são bichas enrustidas", prosseguiu.
O vocalista ainda definiu os fascistas como "idiotas com ideologia" e declarou que seu disco seria uma resposta inspirada por eles. Renato Russo também aproveitou a conversa para criticar quem pedia pela volta da ditadura no país.
"Aqui no Brasil, tem gente com esse papo de que os militares precisam voltar. Imagina! Isso aconteceu há menos de 10 anos. Esse povo esqueceu já? Nós esquecemos como é ruim não ter liberdade?", indagou.
No mesmo ano, a Legião Urbana se apresentou no 'Programa Livre' do SBT, comandado pelo apresentador Serginho Groisman. Na oportunidade, o tema voltou a ser comentado por Renato Russo enquanto o artista discutia sobre a canção '1965 (Duas Tribos)' — que apresenta uma referência ao início da ditadura militar no Brasil — que faz parte do álbum 'As Quatro Estações' (1989).
"Nunca vi ninguém falando sobre essa música, mas basicamente ela fala sobre um momento no nosso país que de repente fechou tudo. Acho sempre importante lembrar que hoje a situação pode estar difícil para caramba, mas temos uma coisa muito preciosa, que é a liberdade. Eu posso vir aqui cantar. Vocês podem vir aqui e fazer as perguntas que vocês quiserem", discursou.
Renato ainda continuou que, num passado recente, "dependendo das ideias que seu pai ou irmão tivessem, poderia bater gente na sua casa"; fazendo uma referência ao fato de que a polícia tinha autoridade para prender as pessoas consideras suspeitas de serem contra o regime.
Eles iam pegar essa pessoa e você nunca mais ia saber o que tinha acontecido. Não se fala nisso. É algo perigoso falar 'éramos felizes naquela época'. Não me lembro de ser feliz naquela época", proferiu.
Por fim, Renato ainda explicou o pensamento por trás canção e falou sobre as coisas que a ditadura escondeu debaixo do tapete. "Fazer redação dizendo que o presidente é maravilhoso, quando de repente muito tempo depois descobrimos que pessoas estavam sendo mortas em nome de uma grande coisa que não se sabe o que é. Acho isso péssimo. A música fala especificamente de tortura e dessa ideia do Brasil ser o país do futuro".