A série foi publicada pelo jornal alternativo O Pasquim, e usava humor ácido para provocar reflexões sobre o regime militar brasileiro
O Pasquim foi um jornal que ficou marcado por sua linguagem criativa e irreverente em meio ao cenário opressor da ditadura militar brasileira. Entre as muitas mentes sem rédeas do veículo estava o cartunista Henrique de Sousa Filho, que era mais conhecido pelo seu apelido de Henfil.
O artista frequentemente usava a comédia como uma ferramenta política, usando por exemplo, o embate entre pensamentos conservadores e liberais como tema por trás dos personagens Cumprido e Baixinho, que personificavam essas ideias divergentes.
Outra icônica criação de Henfil foi o famoso “Cemitério dos Mortos-Vivos”, em que ele enterrava alegoricamente as figuras brasileiras que considerava estarem do lado errado da história: isto é, aqueles que defendiam o regime ativamente, aqueles que simpatizavam, e também aqueles que até podiam discordar mas preferiam manter-se calados frente aos crimes dos militares.
Sem medo de condenar nomes grandes ao seu cemitério de tinta e papel, o cartunista usou sua arte para falar contra muitos. Alguns exemplos são a apresentadora Hebe Camargo, a atriz Bibi Ferreira, o sociólogo Gilberto Freyre, o escritor Nelson Rodrigues, o técnico de futebol Zagalo e até uma das maiores lendas do aclamado esporte, Pelé.
Contudo, um dos casos mais famosos envolve a icônica Elis Regina. Isso porque em 1972 a cantora, pressionada por militares, acabou fazendo um show para militares durante as Olimpíadas do Exército. Foi suficiente para a artista ser alvo de criticas e parar no famoso cemitério de Henfil.
Nem sempre os leitores do Pasquim concordaram com as decisões de Henfil, todavia. Certa vez, por exemplo, o cartunista decidiu enterrar a talentosa escritora Clarice Lispector, o que gerou uma repercussão negativa. Em resposta às críticas, o artista contou para “O Jornal” em 1973 o que estava por trás de sua sentença:
“Eu a coloquei no Cemitério dos Mortos-Vivos porque ela se coloca dentro de uma redoma de Pequeno Príncipe, para ficar num mundo de flores e de passarinhos, enquanto Cristo está sendo pregado na cruz. Num momento como o de hoje, só tenho uma palavra a dizer de uma pessoa que continua falando de flores: é alienada. Não quero com isso tomar uma atitude fascista de dizer que ela não pode escrever o que quiser, exercer a arte pela arte. Mas apenas me reservo o direito de criticar uma pessoa que, com o recurso que tem, a sensibilidade enorme que tem, se coloca dentro de uma redoma”, explicou Henfil no trecho que foi repercutido pelo site da Biblioteca Nacional.
Conforme documentado no site da Biblioteca Nacional, através da biografia O rebelde do traço: A vida de Henfil, de Dênis de Morais, o jornalista Zuenir Ventura comentou que: “Henfil tinha razão ao achar que vivíamos um período em que não dava para você ficar em cima ou atrás do muro. Era importante, no processo de reconquista da democracia, a mobilização da sociedade civil e da intelectualidade. Henfil sabia que era indispensável ter todo mundo que se opunha à ditadura dentro de um mesmo saudável saco-de-gatos”.
Henfil morreu em 1988, levado pela AIDS, que teria contraído após uma transfusão de sangue com agulhas infectadas. O Pasquim acabou pouco depois, em 1991.
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