Dono de uma mente brilhante, Carlos Chagas entrou para a História ao descrever por completo a tripanossomíase americana (doença de Chagas)
No dia 22 de abril de 1909, a Academia Nacional de Medicina testemunhou um marco significativo na história médica do Brasil: o anúncio formal, feito pelo sanitarista Oswaldo Cruz, da descoberta de uma nova enfermidade por Carlos Chagas. Essa doença, que se tornaria conhecida como Tripanossomíase americana ou doença de Chagas, representou um avanço notável no campo das ciências biológicas.
A trajetória que culminou na descoberta iniciou-se em 1907. Naquele ano, Carlos Chagas, um pesquisador afiliado ao Instituto Oswaldo Cruz, foi enviado a Lassance, no norte de Minas Gerais, com a missão de combater a malária entre os trabalhadores da Estrada de Ferro Central do Brasil.
Durante suas atividades no local, ele notou a presença de um inseto hematófago, popularmente chamado de barbeiro devido à sua predileção por picar o rosto das pessoas durante a noite. Este inseto habitava as frestas das rústicas casas de pau-a-pique da região, informa o Instituo Fio Cruz em artigo.
Em suas pesquisas sobre o barbeiro, Chagas identificou um novo parasita, que denominou Trypanosoma cruzi em homenagem a Oswaldo Cruz. Ao observar inexplicáveis alterações patológicas nos habitantes locais e verificar a presença do parasita em animais domésticos e em experimentos laboratoriais, ele iniciou uma investigação minuciosa para compreender a relação entre o microrganismo e as condições de saúde da população.
A descoberta é considerada singular na medicina por englobar todo o ciclo da doença: desde o agente etiológico, passando pelo vetor até os reservatórios domésticos e a manifestação clínica da doença.
Carlos Justiniano Ribeiro Chagas nasceu em 9 de julho de 1879, em Oliveira, Minas Gerais. Órfão de pai aos quatro anos, inicialmente preparou-se para seguir Engenharia na Escola de Minas em Ouro Preto, conforme o desejo materno. No entanto, sua vocação científica o levou à Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro em 1897.
Ao concluir seu curso em 1903 com uma tese sobre malária — Estudos hematológicos no impaludismo — Chagas começou seu envolvimento com Oswaldo Cruz. Apesar do convite para integrar o Instituto Manguinhos permanentemente, optou por se dedicar à prática clínica.
Em 1904, estabeleceu-se como médico no Rio de Janeiro e formou família com Íris Lobo. Sua primeira grande campanha contra a malária ocorreu em Itatinga, São Paulo, onde adotou técnicas inovadoras para desinfectar casas e combater infecções domiciliares — estratégia que se tornou referência global no combate à doença. Retornando ao Rio em 1906, Chagas assumiu definitivamente seu posto no Instituto Oswaldo Cruz.
A expedição ao Vale do Amazonas em 1912 resultou num levantamento detalhado das condições médico-sanitárias locais. O relatório apresentado ao governo destacou a precariedade vivida pelos habitantes e reforçou a necessidade urgente de medidas sanitárias para impulsionar o desenvolvimento econômico regional.
Com a morte de Oswaldo Cruz em 1917, Carlos Chagas assumiu a direção do Instituto Manguinhos. Sob sua liderança, foi dada prioridade à pesquisa sobre endemias rurais e à organização interna do Instituto. Ele ampliou cursos e diversificou a produção científica e medicinal da instituição. Em 1920, o Instituto passou também a controlar a qualidade dos produtos utilizados na medicina humana no Brasil.
Dono de uma mente brilhante, Carlos Chagas faleceu aos 55 anos devido a um infarto, deixando um legado imensurável para a ciência médica brasileira e mundial.