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Matérias / Herberts Cukurs

Herberts Cukurs: O aviador nazista reverenciado como Santos Dumont na Letônia

Em entrevista, a jornalista Patricia Hargreaves reflete sobre Herberts Cukurs: 'Ele está para a Letônia, assim como Dumont está para a gente'

Fabio Previdelli
por Fabio Previdelli
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Publicado em 09/10/2024, às 19h00

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Herberts Cukurs, o ‘nazista dos pedalinhos’ - Latvian Military via Wikimedia Commons
Herberts Cukurs, o ‘nazista dos pedalinhos’ - Latvian Military via Wikimedia Commons

Exímio aviador na Letônia, Herberts Cukurs se tornou um herói nacional. Considerado pioneiro na aviação de longa distância, ganhou reconhecimento internacional por seus voos solo na década de 1930 — chegando a receber o conceituado Troféu Harmon. 

Cukurs também construiu ao menos três aeronaves sozinho, além de projetar o protótipo de bombardeiro de mergulho Cukurs C-6bis em 1940. Pós-Segunda-Guerra Mundial, o letão veio ao Brasil, onde instalou os pedalinhos na Lagoa Rodrigo de Freitas, no Rio de Janeiro. 

"O Herberts Cukurs, logo que chegou ao Brasil, criou um parque aquático na Lagoa Rodrigo de Freitas", explica a jornalista Patrícia Hargreaves em entrevista exclusiva à equipe do Aventuras. 

"Por lá tinha até lancha de puxar esqui. No entanto, que tinha mais diferente, é que ele construiu os primeiros pedalinhos da Lagoa Rodrigo de Freitas — que estão lá até hoje. É um passeio clássico de pai com filho, de turistas. Ele faz parte do cenário da cidade", contextualiza. 

Ex-editora da Aventuras na História, Hargreaves acaba de lançar a áudio série 'Do Céu ao Inferno: O Caso Herberts Cukurs', um projeto original da Audible. Dividido em nove episódios, o projeto documental resgata a trajetória controversa de Cukurs; acusado de crimes brutais durante o Holocausto. 

O caso do Cukurs tem uma particularidade: ele não pode ser chamado de criminoso. Porque ele nunca foi julgado por um tribunal. O que se pode dizer é que sobreviventes da Segunda Guerra acusaram ele de ter cometido assassinatos e outros tipos de crimes com as próprias mãos. Mas ele nunca foi para um tribunal", explica.

Cukurs, o herói nacional

Para entender a importância de Herberts Cukurs para o povo letão, primeiro é preciso compreender o contexto de seu país. Em 1918, começou a Guerra de Independência da Letônia, apoiada pela Estônia, Polônia e alguns aliados ocidentais — como o Reino Unido — contra a então União Soviética e os bolcheviques da República Socialista Soviética da Letônia. O conflito acabou em 11 de agosto de 1920, com a libertação do país. 

No entanto, o país sofreu com duas invasões na Segunda Guerra: a primeira pela própria União Soviética, em 1941, e, no ano seguinte, pelos nazistas. No segundo episódio, o aviador se alistou para servir o Arajs Kommando, uma unidade subordinada que servia a SS nazista. Tudo isso por "vontade própria", conforme explica Patricia

O papel de Cukurs nesse período é muito debatido e controverso. Afinal, historiadores, como Andrew Ezergailis, apontam que o letão teria sido um dos líderes das atrocidades que aconteceram no Gueto de Riga e no Massacre de Rumbula

Além disso, nos anos que sucederam a Segunda Guerra, sobreviventes do Holocausto denunciaram atrocidades cometidas por Herberts. Uma dessas denúncias foi feita por David Fischkin que, entre outras coisas, relatou: "Quando uma criança chorou, ele a tirou da mãe e a fuzilou ali mesmo". 

Por outro lado, outros pesquisadores — além do próprio Cukurs — negam sua participação, como Ezergailis também contrapõe em seu livro The Holocaust in Latvia, 1941-1944: The Missing Center'. 

"Nas minhas pesquisas, eu descobri três coisas. A primeira: ainda existe hoje, na Letônia, pais de origem dele, um processo em aberto no Ministério Público que busca definir, decidir ou julgar se ele era realmente um criminoso de Guerra ou não", revela Hargreaves

"A segunda: existem quatro livros recentes dele. Entre esses quatro, três eram de estrangeiros e um era de um historiador brasileiro que fez a tese de doutorado dele baseado no Cukurs", continua, citando o trabalho do historiador Bruno Leal, professor de História Contemporânea pela Universidade de Brasília (UnB), que escreveu 'O homem dos pedalinhos. Herbert Cukurs: A história de um alegado criminoso nazista no Brasil do pós-guerra' (FGV Editora). 

Mas o que mais me espantou foi que, naquela mesma pesquisa, eu descobri que ele era tema de um musical na Letônia", prossegue. 
Cena do musical 'Cukurs, Heberts Cukurs' - Raimonds Birkenfelds/Divulgação

Conforme relatado pela Radiodifusão Pública da Letônia (LSM), o musical 'Cukurs, Herberts, Cukurs' estreou em Liepaja, cidade natal do aviador letão, em 11 de outubro de 2014. 

"Não somos os defensores de Herbert Cukurs e não somos seus juízes", disse o produtor Juris Millers na sessão de estreia da peça. "Espero que esta performance faça você pensar", relatou o LSM.

O veículo descreveu o espetáculo controverso como um show que "faz poucas perguntas sérias [sobre o assunto] e não sugere nenhuma reposta, além da forte implicação de que Heberts Cukurs era um bom sujeito que salvou, em vez de matar, judeus".  

"O Cukurs, antes da Guerra, era uma personalidade na Letônia. Ele era famoso por lá", contextualiza Patricia. "Ele foi um piloto e projetista de avião. Ele está para a Letônia, historicamente, como fama, assim como Santos Dumont está para a gente". 

Ele é uma referência de criador. A gente não sabe a cara do Santos Dumont? Na Letônia eles sabem a cara do Herberts Cukurs", finaliza.

++ Confira abaixo a entrevista completa de Patricia Hargreaves à equipe do Aventuras na História!