A pandemia com certeza impactou fortemente a Europa da época, porém é possível que algumas concepções tenham sido exageradas
Um artigo científico publicado na revista Nature Ecology & Evolution em fevereiro de 2022 desafia as noções que historiadores tinham, até então, do nível de mortalidade alcançado pela peste negra, pandemia devastadora que se abateu sobre os países da Europa durante o século 14 (ou, mais especificamente, no período entre 1346 e 1352).
Atualmente, é bem aceita entre os historiadores a ideia de que uma parte assustadora da população europeia foi morta pela doença, algo entre 30% e 50%. No entanto, a conclusão do estudo recente é que a praga não foi letal e nem tão difundida quanto imaginávamos.
Locais que hoje correspondem à Suécia, Grécia e porção central da Itália, por exemplo, foram afetados pela pandemia de maneira trágica, de acordo com as descobertas. Em outras partes do continente, todavia, o cenário era diferente.
Para chegarem a esses dados, eles analisaram algo inusitado: pólen fossilizado datado da época. Um total de 1.634 amostras foram recolhidas de lagos e pântanos espalhados por 19 países diferentes da Europa.
“Esses grãos nos permitem reconstruir a paisagem local e as mudanças ao longo do tempo. Eles iluminam o uso humano da terra e a história da agricultura", explicaram três dos pesquisadores responsáveis pela investigação em um texto publicado no The Conversation.
Se um terço ou metade da população da Europa morresse em poucos anos, seria de esperar um quase colapso das plantações cultivadas na era medieval. Ao aplicar técnicas estatísticas avançadas aos dados de pólen disponíveis, testamos esse cenário, região por região”, continuou o comunicado.
Nos locais citados anteriormente como abalados pela peste negra, foram encontradas evidências desse abandono do cultivo, que foi interpretado como consequência da falta de mão de obra causada pela mortalidade alta do período.
Já nos outros, como a República Tcheca e a parte nordeste da Espanha, a produção agrícola continuou a mesma de antes da pandemia. Curiosamente, ainda existem lugares, tais como os países bálticos, a Polônia e o trecho central da Espanha, em que houve um aumento das plantações.
Os especialistas especulam que fatores como divisão da população entre o campo e a cidade (com os espaços urbanos ocupando um espaço bem menor e possuindo maior densidade demográfica), rotas comerciais e climas variados podem ter causado essa propagação desigual da peste negra.
Vale lembrar aqui que a doença era causada pela bactéria "Yersinia pestis" e transmitida por pulgas. Assim, faz sentido a necessidade de levar em consideração a maneira como as condições da época podiam afetar o inseto.
Um detalhe importante é que os autores do artigo científico evitaram estabelecer uma nova estimativa de mortes causadas pelo patógeno, enfatizando que sua intenção principal é combater as generalizações que podemos fazer a respeito de uma das piores pandemias já enfrentadas pela humanidade, conforme repercutido pela revista Smithsonian.
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