Documentos judiciais expõem cartas anuais do príncipe Andrew ao presidente chinês, com auxílio de suposto espião chinês e conhecimento da falecida rainha
O príncipe Andrew, duque de York, mantinha uma linha de comunicação regular com o presidente da China, Xi Jinping, com o conhecimento — e possível incentivo — do Palácio de Buckingham e da falecida rainha Elizabeth II, segundo documentos judiciais tornados públicos nesta sexta-feira, 4.
As revelações foram feitas por Dominic Hampshire, ex-conselheiro sênior do príncipe, durante um processo na Comissão Especial de Apelações de Imigração (Siac), envolvendo o empresário chinês Yang Tengbo, também conhecido como Chris Yang.
Yang, acusado de envolvimento com atividades de espionagem, foi banido do Reino Unido em março de 2023 por razões de segurança nacional. Embora negue qualquer atividade ilegal, os juízes da Siac o descreveram como um "confidente próximo" de Andrew, com acesso incomum e significativo ao duque.
De acordo com Hampshire, que trabalhou com o príncipe de 2019 a 2022, o duque enviava anualmente cartas de aniversário a Xi Jinping. As mensagens eram redigidas com a ajuda de Yang, que orientava a linguagem e o conteúdo segundo os protocolos culturais chineses.
Era um tipo de cortesia diplomática de alto nível. A rainha estava plenamente ciente e, ao que tudo indica, via com bons olhos esse canal direto", declarou Hampshire no processo, repercute o The Guardian.
As cartas, segundo ele, não continham assuntos delicados, mas representavam uma ponte simbólica entre a realeza britânica e a liderança chinesa. "Era um canal útil. Mesmo hoje, se o Palácio ou o governo precisassem que alguém falasse com o presidente chinês, o duque seria provavelmente a pessoa mais capaz de fazê-lo", afirmou.
Dominic também revelou que o Eurasia Fund — um projeto de investimento voltado a energias renováveis na África com financiamento chinês — chegou a ser mencionado por Andrew em reuniões com o atual rei, Charles III. No entanto, o Palácio negou qualquer aprovação formal ou envolvimento direto do monarca nesse, ou em qualquer outro empreendimento com Yang.
O ex-conselheiro pontuou que, apesar de sua proximidade operacional com o príncipe, Yang "nunca levantou uma bandeira vermelha" durante o tempo em que colaboraram. Ainda assim, Andrew acatou prontamente a recomendação oficial de cortar qualquer laço com o empresário chinês após sua expulsão do país. "Andrew não manteve mais contato e não recebeu qualquer apoio ou financiamento de Yang, ou de entidades chinesas", esclareceu Hampshire.
A revelação reacende o debate sobre o papel de figuras da realeza em relações internacionais informais e os riscos associados a vínculos com indivíduos sob suspeita de espionagem.
O caso também lança luz sobre os esforços do duque de York para manter relevância após o escândalo envolvendo Jeffrey Epstein e a entrevista desastrosa à BBC, que, segundo Hampshire, tornou sua reputação "irrecuperável" dentro da casa real.
A iniciativa Pitch@Palace, criada por Andrew para apoiar empreendedores, foi citada como um dos últimos êxitos de sua atuação pública. Yang era o principal representante do programa na China e teria sido um dos poucos aliados que permaneceram ao lado do duque após a queda de sua imagem.
Segundo o 'The Guardian', Yang, por sua vez, declarou que ajudou o príncipe a reconstruir sua reputação na China antes de 2016, mas que a entrevista à BBC destruiu esse esforço. Ele anunciou que pretende recorrer da decisão que o impede de retornar ao Reino Unido.
O Palácio de Buckingham, por ora, não fez novos comentários além do já divulgado: que o rei se reuniu com Andrew para ouvir propostas de financiamento, mas que Yang "não foi mencionado em momento algum" nas conversas.