Imagem do monarca é revista nos 200 anos da chegada da corte portuguesa ao Brasil
Ao enviar suas tropas para invadir Portugal, há 200 anos, Napoleão Bonaparte deu, sem saber, um dos grandes impulsos para o desenvolvimento do Brasil. Encurralada pelo anúncio da chegada dos soldados franceses, a corte portuguesa transferiu-se para o Rio de Janeiro e pronto: a cidade se tornou a primeira a sediar um império europeu fora da Europa. Ganhou imprensa, banco, jardim botânico e outras obras importantes, que mudaram a fisionomia da cidade.
Não é à toa que a prefeitura do Rio está organizando uma série de eventos para comemorar o bicentenário da chegada da família real por aqui. Batizada de “D. João VI no Rio: 1808-2008”, a programação conta com concursos literários sobre o tema, encenações teatrais, um longa-metragem e a restauração de prédios históricos como o da Igreja Nossa Senhora do Carmo, já em andamento – o local serviu de Capela Real durante a estada de dom João VI no país.
“Quem conhece a história com seriedade sabe que dom João VI foi um estadista responsável pela criação das grandes instituições do país”, diz o embaixador e escritor Alberto da Costa e Silva, que dirige a comissão responsável pelas comemorações. Leia abaixo os principais trechos da entrevista que o diplomata concedeu a História.
História – A comemoração do bicentenário da chegada da família real vai enterrar definitivamente a visão caricaturesca sobre dom João VI, de ele ser um monarca glutão e dominado pela mulher, Carlota Joaquina?
Aberto da Costa e Silva – O processo de reconhecimento do papel de dom João VI começou bem antes desse projeto. Quem se debruça com seriedade sobre o tema sabe que nossas instituições nasceram com ele, sobretudo as culturais, como a imprensa e a primeira escola de artes do país, por exemplo. Mas não tenha dúvidas de que o evento ajudará a promover um resgate desse período por meio da promoção de novas obras sobre o tema e da recuperação de prédios históricos que marcaram o período.
O que sobrou da paisagem urbana da época?
Pouco, já que o Rio de Janeiro se modificou muito, principalmente na virada do século 19 para o 20. Por isso mesmo é tão importante o investimento da prefeitura na restauração de edifícios como a Igreja Nossa Senhora do Carmo, a antiga catedral. Foi lá que dom João VI foi coroado rei do Reino Unido de Portugal, Algarves e Brasil (fato ocorrido em fevereiro de 1818). A prefeitura vai identificar também os caminhos e pontos na cidade que foram referências no período.
Ao reconhecermos o papel da corte no Brasil, o que muda na visão dos brasileiros sobre a herança portuguesa?
Acredito que aquelas tolices de que o país seria melhor caso os holandeses houvessem conquistado o Brasil estão completamente superadas. Costumo dizer que nossa espinha dorsal é portuguesa, nosso sistema nervoso é africano e nosso útero é ameríndio. Ou seja: nossa estrutura é portuguesa. Por isso que, ao percorrer algumas ruas do centro do Rio, um cidadão poderia ser transportado para uma rua na cidade do Porto sem perceber.