Na Segunda Guerra, panfletos nazistas direcionados aos soldados negros tentavam fazê-los mudar de lado
Um grupo de soldados negros dos EUA caminha pela França após o Dia D em 1944. Só há negros: as tropas eram segregadas.
Avistam um avião solitário alemão. Antes que tenham tempo para se proteger, o solo é atingido... por folhetos. Contrariando ordens, alguém os tira do chão para ler. Começam descrevendo uma invasão de brancos a uma igreja no Harlem. E dizem, na página seguinte, que negros podem frequentar qualquer igreja na Alemanha.
E também:
“Nunca houve linchamentos de negros na Alemanha. Eles sempre foram tratados decentemente. (...) Por isso, você não precisa ter medo dos alemães(...) Não hesite — se você esperar demais, pode ser tarde”
Outros panfletos prometiam alimentação de qualidade a todos os soldados que se rendessem:
“Não há necessidade de fazer dieta. Há muita comida nutritiva e saudável para todos os prisioneiros de guerra”
A propaganda nazista tomou para si própria a improvável missão de convencer os soldados negros de que a vida para eles seria melhor na Alemanha.
Os folhetos enfatizavam o racismo dos Estados Unidos e questionavam o motivo de soldados negros estarem lutando por uma pátria que não os respeitava. Eles também apelavam para o emocional dos soldados, dizendo que afro-americanos servem apenas como bucha de canhão. Por que não voltar para casa e poupar as mulheres e filhos do sofrimento?
É difícil dizer qual foi o impacto desses folhetos para os soldados afro-americanos. Principalmente no fim de 1944, quando a Alemanha já estava próxima da derrota. Muito antes de eles chegarem às mãos dos soldados, a agência de propaganda dos EUA já havia apontado o que uma vitória nazista significaria para os afro-americanos.
Provavelmente eles notaram a ironia da coisa. Ou certamente notaram nos últimos dias da guerra.
Os soldados viram as consequências do racismo nazista quando liberaram campos de concentração. Vincent Tubbs, correspondente de guerra da Afro American, descreveu as cenas que encontrou no Campo de Concentração de Dachau: "Eu vi as atrocidades nazistas sobre as quais você lê e ouve sobre, mas nunca acredita até ver com seus próprios olhos. Incontáveis corpos carbonizados".
Os negros na Alemanha Nazista
Hitler, naturalmente, não era amigo dos negros. Mas eles não estavam em sua lista de prioridades. Na Alemanha nazista, havia apenas cerca de 25 mil negros entre 65 milhões de habitantes — um grupo pequeno demais para que o governo se importasse em exterminá-los. Eram principalmente fruto da experiência colonial alemã, que teve domínios nas regiões de Camarões, Namíbia, Ruanda, Moçambique e outras. Com a derrota na Primeira Guerra, as colônias foram transferidas para outras potências, mas vários funcionários coloniais e suas famílias permaneceram.
Os negros eram classificados junto a judeus e ciganos como não arianos. Eram tinham acesso proibido a locais públicos e eram vetados a cargos no funcionalismo e vagas nas universidades. Também não podiam fazer sexo com brancos, quanto menos terem filhos. Em 1937, até 500 crianças mestiças, os Bastardos do Reno, foram esterilizadas à força.
Sem contradição
A gigantesca hipocrisia era natural aos nazistas. Hitler e Goebbels, afinal, eram defensores do princípio da Grande Mentira: que uma defender uma óbvia falsidade enfática e emocionalmente desarmava seus oponentes, que acreditariam que ninguém poderia defender algo com tanta convicção se não fosse ao menos parcialmente verdade.
E as acusações contra o bem real racismo dos EUA também eram usadas na propaganda interna. Talvez nada possa ilustrar melhor a gritante incoerência dos negros da propaganda nazista que o cartaz antiamericano Terror Cultural.
Os EUA são um monstro com asas de bombardeiro e um pé de bomba invadindo a Alemanha. Ele carrega uma corda de forca dos linchamentos de negros. Sua cabeça é coberta por um capuz da Ku Klux Klan e em seu coração há negros numa gaiola.
Ao mesmíssimo tempo, ela tem dois braços negros. O direito carrega um disco, simbolizando a música degenerada americana: o jazz. O esquerdo segura um aco de dinheiro com um banqueiro judeu agarrado a ele. Os negros eram, assim, ao mesmo tempo vítimas do barbarismo americano e uma ameaça do barbarismo americano à cultura alemã.