Em entrevista ao site Aventuras na História, o historiador Tim Bouverie, autor de “Negociando com Hitler”, discorre sobre as estratégias diplomáticas usadas por britânicos para tentar impedir a 2ª Guerra mundial
Logo após a Primeira Guerra Mundial, tanto o lado que ganhou, quanto o que perdeu, só pensava em uma coisa: evitar um novo conflito. Afinal, não era pra menos, mais de 16,5 milhões de pessoas haviam morrido naquele período de pouco mais de quatro anos.
Os ingleses sofreram com 723 mil baixas; os franceses com 1,7 milhão. Já os russos tiveram 1,8; enquanto os alemães foram os que mais perderam pessoas: cerca de 2 milhões de vítimas.
Independente do lado que conta essa história, uma coisa é certa, pessoas em vilas, escolas cidades ou onde quer que fosse tinham um único mantra em relação às guerras: “Nunca mais!”.
A partir desse pensamento, franceses e britânicos passaram uma adotar a política de apaziguamento, concedendo concessões ‘razoáveis’ aos alemães e italianos durante os anos 1930. Em novembro de 1937, por exemplo, Lorde Halifax, o Secretário de Relações Exteriores, teve uma audiência com Adolf Hitler em Berghof.
Halifax considerou que o encontro foi um sucesso. “A menos que eu esteja totalmente enganado ... Hitler foi sincero quando disse que não queria a guerra”, escreveu em uma carta destinada ao primeiro-ministro Neville Chamberlain. Ele não poderia estar mais errado.
Em 'Negociando com Hitler', publicado recentemente pela Planeta de Livros, o historiador Tim Bouverie discorre sobre as estratégias diplomáticas usadas por britânicos e franceses para tentar impedir que uma segunda guerra mundial acontecesse.
O livro investiga a desconhecida história dos catastróficos anos que compreendem a indecisão e diplomacia que contribuiu para o domínio de Hitler na Europa.
Se baseando em documentos e fontes inéditas entre historiadores, Bouverie elabora com maestria uma obra que apresenta políticos, aristocratas e diplomatas que acabaram sendo responsáveis pelo futuro do mundo naquele período.
"Bouverie nos leva não apenas para os bastidores do parlamento e do governo inglês mas também para as salas de estar e restaurantes da decadente Grã-Bretanha imperial, onde Hitler gozou de surpreendente apoio entre a classe dominante e até mesmo alguns membros da família real", diz a sinopse da obra.
“A opinião pública na Grã-Bretanha e na França, nas décadas que se seguiram à Primeira Guerra Mundial, foi fortemente pacifista. Mas esse pensamento foi influenciado pelo fato de que os políticos britânicos, em particular, se recusaram a alertar o público sobre os perigos de uma Alemanha ressurgente”, explica Bouverie em entrevista exclusiva ao site Aventuras na História.
Tim revela que, para evitar o domínio de Hitler sobre a Europa, as potências vitoriosas da Primeira Guerra Mundial teriam de agir muito, muito antes. “Eles teriam que cumprir cláusulas do Tratado de Versalhes que proíbem a Alemanha de aumentar suas forças armadas e teriam que se opor ativamente, com a força das armas, aos primeiros golpes de política externa de Hitler, como a remilitarização da Renânia”, explica. “Infelizmente, não houve apoio público para nenhuma dessas ações”.
“Em 1938, época da crise tcheca, era tarde demais para deter Hitler sem uma grande guerra europeia, mas havia um forte argumento a ser defendido de que a Grã-Bretanha e a França estavam em uma posição estratégica e diplomática mais forte”, completa.
A ficha
O apaziguamento, a ilusão fatal de que a Alemanha nazista poderia ser contida comprando-a com concessões, foi o erro britânico mais decisivo do século 20. Pouco depois, muitas pessoas na classe dominante britânica ficaram horrorizadas com Hitler e perceberam que ele era uma ameaça.
No entanto, a maioria tremeu perante perigo, em vez de tomar as medidas necessárias para combatê-lo ainda em sua raiz. Uma preocupação era que a Grã-Bretanha tinha poucos aliados. Além disso, para grande parte da classe política britânica, a União Soviética de Stalin era ainda mais perigosa do que o nazismo.
“As pessoas tendem a acreditar que a verdadeira natureza do regime nazista não foi revelada até o final de tudo: que só no fim da década de 1930 ou mesmo após o término da Segunda Guerra Mundial em si que os males do governo de Hitler se tornaram comumente conhecidos”, diz o historiador.
“Porém, durante minha pesquisa, uma das coisas que me impressionou foi quanta informação havia disponível e como tanto o governo quanto o público sabiam sobre a ditadura nazista, a perseguição aos judeus e o desejo de Hitler de fazer tudo aquilo, além de possuir militares ilegais desde o início da década”, rebate.
Outro ponto que chama a atenção é a credulidade de alguns dos principais aristocratas da Grã-Bretanha. “Tive a sorte de ter acesso, pela primeira vez, a uma série de arquivos aristocráticos altamente importantes. Muitos deles apoiavam não apenas a política de apaziguamento além de todos os limites razoáveis, mas também simpatizavam ativamente com o regime nazista”.
O poder
Um fator que pode ter influenciado na política de apaziguamento era a opinião pública. Stanley Baldwin, antecessor de Chamberlain como primeiro-ministro conservador, mais tarde fez uma admissão notória de que não foi honesto com o povo britânico sobre a necessidade de reconstruir as forças armada. Ele tinha medo de que isso custasse a ele as eleições de 1935, afinal, os eleitores eram "pacíficos".
Porém, a culpa não foi apenas da direita britânica. Após o triunfo da propaganda nas Olimpíadas de Berlim, em 1936, David Lloyd George, o liberal que liderou a Grã-Bretanha na primeira guerra mundial, declarou que Hitler era “o maior alemão da época”.
Já em relação à Família Real, ele faz algumas ressalvas. “A família real apoiou totalmente a política de apaziguamento e convidou Neville Chamberlain para a varanda do Palácio de Buckingham, seguindo o acordo de Munique. 'Podemos ter obtido uma grande vitória, em vez de trair um país menor', comentou um funcionário do Ministério das Relações Exteriores”.
“No entanto, seria errado dizer que o rei e a rainha eram pró-fascistas”, discute. Entretanto, o mesmo não pode ser dito de Eduardo VIII. “O ex-duque de Windsor, Eduardo VIII, por outro lado, era certamente simpático aos ditadores e ao regime nazista. Ele não era muito inteligente e, como muitos de sua classe, tinha pavor do comunismo”, conclui.
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