Produções sobre anos da ditadura ajudam a entender lances históricos e geram polêmicas até hoje
Filmes e vídeos são uma boa maneira de conhecer um pouco mais os fatos ligados
à ditadura. E um sinal das paixões que as diferentes visões sobre o período despertam até hoje. Com frequência, lançamentos sobre a época atiçam controvérsias entre cineastas, ex-ativistas e gente que viveu ou analisou aqueles anos.
Só entre 1964 e 2004 foram lançados pelo menos 65 filmes retratando algum aspecto da ditadura – entre curtas, longa-metragens e documentários –, segundo levantamento do Núcleo de Cinema e Vídeo, do Centro Cultural São Paulo. Os mais famosos são 'O que É Isso Companheiro?' (1997), indicado ao Oscar de melhor filme estrangeiro, e 'O Ano
em que meus Pais Saíram de Férias' (2006), vencedor do Leão de Ouro do Festival
de Berlim.
O primeiro, baseado no livro homônimo de Fernando Gabeira, narra, com várias licenças em relação à história e ao livro, a ação dos guerrilheiros – incluindo Gabeira – que seqüestraram em 1969 o embaixador americano, para trocá-lo por prisioneiros.
Na época do lançamento, o filme foi criticado pela esquerda, que acusou Barreto de ter transformado os personagens principais em militantes infantilizados, de ter retratado mais dramas de consciência no torturador que no guerrilheiro e de ter centrado a narrativa muito mais na ação que em questões políticas. Barreto rebateu as críticas afirmando que a ausência de ideologia só favorece o resultado final. “Não queria fazer um filme panfletário, o que considero má dramaturgia”, disse.
Outra produção inspirada em fatos reais é Lamarca (1994), do diretor Sérgio Rezende. O filme conta em tom épico a história de Carlos Lamarca, líder guerrilheiro e ex-capitão do
Exército, morto em 1971. O Bom Burguês (1983), dirigido por Oswaldo Caldeira, também é baseado em fatos verídicos. Narra a história de um funcionário do Banco do Brasil que teria aplicado um golpe que lhe permitia levar vida de milionário e financiar as operações dos grupos de esquerda.
Pra Frente, Brasil (1982), dirigido por Roberto Farias e patrocinado pela Embrafilme, gerou uma crise institucional que resultou na demissão do diretor da estatal, que financiava a produção cinematográfica até o início dos anos 90. Os militares não gostaram de ver o órgão produzir um filme que mostrava a tortura e a repressão por trás
da euforia do milagre econômico e da conquista da Copa de 70.
A minissérie de TV 'Anos Rebeldes' também rendeu comentários. Entre julho e agosto de 1992, a TV Globo exibiu a produção dividida em 20 capítulos. Baseada nos livros '1968 – O Ano que Não Terminou', de Zuenir Ventura, e 'Os Carbonários', de Alfredo Sirkis, 'Anos Rebeldes' foi ao ar no momento em que os estudantes pintavam a cara para pedir
o impeachment do presidente Fernando Collor. Ela está disponível no Globoplay.
Apesar de ter como tema principal uma história de amor, mostra o clima dos anos de chumbo, com repressão violenta e sem liberdade de expressão. A narrativa, que se passa no Rio, enfoca a trajetória de um grupo de estudantes de classe média do tradicional
Colégio Pedro II, de 1964 até 1979. O núcleo central gira em torno do romance entre a individualista Maria Lúcia, filha de um comunista, e João Alfredo, envolvido com a luta armada.
Ação entre Amigos (1998) é outra das produções mais recentes sobre o período. Dirigido por Beto Brant, o filme narra a história de quatro amigos que, no início dos anos 70, participam da luta armada, são presos e torturados. Vinte e cinco anos depois, em um
de seus reencontros, eles vêem na foto de uma reunião política o homem que
os torturou por meses. Os documentários sobre o período abordam do movimento estudantil de 1968 à campanha das Diretas Já.
Barra 68 (2000), dirigido por Vladimir Carvalho, retrata a invasão da Universidade de Brasília. As produções ABC da Greve (1979/1990), de Leon Hirszman, Greve! (1979), de João Baptista de Andrade, e Linha de Montagem (1982) de Renato Tapajós, falam sobre
as greves que afrontaram o regime militar no ABC paulista entre 1978 e 1980.
Céu Aberto (1985), também de João Baptista de Andrade, mostra o processo de redemocratização até a aflição popular na morte de Tancredo Neves. Esses documentários são ainda mais difíceis de encontrar que a produção de ficção, cujas obras muitas vezes não estão disponíveis em VHS ou DVD. Nesses casos, para assistir a
eles, é bom ficar atento a mostras ou programações especiais de cineclubes e canais de TV a cabo.