Projeto de 2017 reconstruiu a face de Nebiri, um dignitário que viveu sob o Egito Antigo do faraó Tutmés III
O que restava de uma antiga múmia egípcia, — que incluía apenas uma cabeça bem preservada e seus órgãos internos armazenados em potes de canopia, — foi recuperado pelo egiptólogo italiano Ernesto Schiaparelli durante uma expedição às terras que guardam tesouros do Egito Antigo em 1904.
"Ele tinha entre 45 e 60 anos quando morreu", explicou Raffaella Bianucci, bioantropologista da Seção de Medicina Legal da Universidade de Torino, Itália em 2017. "Seu túmulo no Vale das Rainhas foi saqueado na antiguidade e seu corpo deliberadamente destruído."
O corpo mumificado foi armazenado no Museu Egípcio em Turim logo após sua descoberta, porém, ao longo dos anos, passou por uma série de estudos que possibilitaram novas compreensões sobre o seu passado: da identificação de uma doença crônica até o desenvolvimento de uma reconstrução facial da múmia.
Os pesquisadores foram até mesmo capazes de identificar o indivíduo embalsamado por meio de símbolos e desenhos identificados. Tratava-se de Nebiri, dignitário que viveu sob o Egito Antigo do faraó Tutmés III, da 18ª Dinastia, que reinou a região entre 1479 e 1425 a.C.
"A reconstrução é boa, mas isso não é apenas arte aos meus olhos", opinou Philippe Charlier, patologista forense e antropólogo físico da Universidade de Paris 5, ao portal Live Science em 2017.
"É um trabalho forense sério baseado nas mais recentes técnicas de reconstrução facial e superposição de tecidos moles sobre o crânio. Além da beleza, existe a realidade anatômica”, completa.
Foi por meio desse trabalho técnico de perícia forense moderna, que consiste em uma análise científica do crânio e dos tecidos, por meio de um tipo de tomografia computadorizada e de reconstrução facial, que os especialistas puderam “dar rosto” novamente a Nebiri, trazendo sua face “dos mortos”.
A aproximação facial revelou um homem egípcio entre 45 e 60 anos, que morreu há 3.500 anos, com um nariz proeminente, sobrancelhas retas, lábios mais ou menos grossos e queixo largo.
Mas além das características faciais do dignitário, a tomografia feita pelos pesquisadores também revelou outras informações importantes sobre o embalsamamento em que o indivíduo estava envolvido.
Em um artigo publicado no periódico Forensic Science, Medicine and Pathology, os cientistas envolvidos na análise do corpo concluíram que a cabeça mumificada da múmia é fruto de uma "embalagem perfeita".
"A embalagem meticulosa criou uma barreira para proteger o corpo da colonização de insetos. Ao mesmo tempo, tinha uma finalidade cosmética, permitindo que as características faciais e do pescoço mantivessem sua aparência natural original", disse Raffaella Bianucci.
Eles perceberam ainda que existia um minúsculo orifício no crânio, mas que o cérebro em si não foi retirado. Isso indicou que fragmentos de tiras de linho foram inseridas dentro da cabeça da múmia, um tratamento meticuloso observado em múmias da alta sociedade da época.
"Fomos capazes de dar força ao argumento de que Nebiri era da alta elite", disse Robert Loynes, do Centro KNH de Egiptologia Biomédica da Universidade de Manchester. "É uma descoberta única que antecede os desenvolvimentos vistos no final da 18ª à 20ª Dinastia, reis, rainhas e parentes".