Criada pelo brasileiro Cícero Moraes, a reconstrução facial forense mostra o rosto daquele que seria o pai biológico de Tutancâmon
Em meados de 1907, enquanto explorava a entrada de uma tumba no Vale dos Reis, no Egito, o egiptólogo inglês Edward R. Ayrton fez uma descoberta impressionante. A poucos metros de onde o faraó Tutancâmon foi enterrado, a sepultura escondia artefatos funerários e, especialmente, uma curiosa múmia.
Na época, o advogado norte-americano Theodore M. Davis, que patrocinou a expedição, divulgou a descoberta do estudioso para o resto do mundo como a identificação da tumba da Rainha Tí, mãe do polêmico faraó Aquenáton. Ele acreditou erroneamente que o corpo mumificado era de uma mulher devido a pelve ampla.
Foi assim que o antropólogo australiano Grafton E. Smith ficou responsável por analisar a múmia, afirmando que tratava-se de um indivíduo do sexo masculino. Mudando totalmente a hipótese inicial, o cientista ainda identificou o homem como Aquenáton. A questão, todavia, tornou-se mais complexa do que ele poderia imaginar no período.
Quando Ayrton e Davis colocaram as mãos na múmia, ela logo se transformou em pó e ossos, resultando apenas em um esqueleto, que se tornou objeto de inúmeras pesquisas. Envolvido em inúmeras controvérsias, os restos mortais se tornaram importantes a partir de sua proximidade com Tutancâmon.
Pesquisadores do FAPAB Research Center, na Itália, apontam que algumas pesquisas identificaram a múmia como o pai genético do faraó menino, novamente Aquenáton. Outros estudos criticaram essas análises, em um quebra-cabeça científico que não parece chegar ao fim.
Os críticos avaliam que as idades entre o indivíduo e Aquenáton são distintas: o primeiro teria morrido em torno de seus 20 anos, enquanto o faraó teria reinado por 17 anos, falecendo com o dobro da idade da múmia da tumba KV 55. Ainda assim, por se tratar de um período muito antigo, o tempo de governo e idade da morte do rei são contestados.
O incesto praticado na família real egípcia também complicou a análise dos resultados genéticos obtidos. Mas os cientistas fizeram uma nova sugestão: o corpo poderia ser de Semencaré, provavelmente o mais misterioso faraó de todo o Egito Antigo, que teria reinado entre 1338 a.C. e 1336 a.C.
Em março de 2021, pesquisadores do Centro de Pesquisa da FAPAB, na Itália, divulgaram um projeto no qual trabalharam nos últimos meses: uma reconstrução facial da misteriosa múmia da tumba KV 55.
O projeto foi realizado pelo egiptólogo Michael E. Habicht em parceria com o designer brasileiro especializado em reconstrução facial forense, Cícero Moraes, sob a direção de Francesco M. Galassi, médico e paleopatologista.
Eles afirmam em comunicado de imprensa que o projeto “traz de volta à vida, de forma metafórica, uma das mais controversas e importantes múmias da história do mundo”.
O trabalho se concentrou na reconstrução do rosto de KV55, uma múmia agora esqueletizada que ao longo dos anos foi atribuída por alguns ao Faraó Aquenáton e considerado o pai biológico do Faraó Tutancâmon”, escreveram os especialistas em sua página no Facebook.
A reconstrução facial foi criada a partir de dados obtidos por Moraes previamente, contando com evidências antropológicas, históricas e genéticas do indivíduo. Os cientistas também analisaram fotos e vídeos da múmia para que conseguissem obter detalhes anatômicos do esqueleto, além de pesquisarem a literatura sobre o indivíduo.
“Embora existam várias teorias e argumentos conflitantes que sempre caracterizarão o debate sobre KV 55, usando as evidências antropológicas disponíveis, escolhemos nos concentrar nos traços faciais desse indivíduo”, apontaram os pesquisadores.
O projeto apresenta grande importância histórica pois dá face à uma das mais enigmáticas múmias já encontradas no Egito Antigo, cuja identidade permanece em debate. Um estudo antropológico completo ainda será finalizado pela equipe e submetido a um jornal científico internacional.
+Saiba mais sobre o trabalho de Cícero Moraes por meio de seu site clicando aqui.