Um curioso livro publicado em 1657 por Cyrano de Bergerac imaginou viagens espaciais; confira a descrição e conheça o escritor
No século XVII, um livro imaginou uma máquina que prometia levar seres humanos a novos mundos. Essa engenhoca era uma caixa de dimensões adequadas para um passageiro, equipada com um teto de cristal oco que concentrava os raios solares, repercute a BBC.
À medida que o ar quente se acumulava no interior, ele saía por um tubo na parte superior, criando um efeito de aspiração que, segundo seu criador, poderia impulsionar a estrutura para cima.
Embora os detalhes da propulsão a vácuo permaneçam um mistério, é notável que, em pleno século XVII, já houvesse especulações sobre viagens espaciais. A mente criativa por trás dessa ideia audaciosa pertence a Hercule-Savinien de Cyrano de Bergerac (1619-1655), que escreveu "História Cómica dos Estados e Impérios da Lua".
Cyrano foi um soldado e duelista que se afastou das batalhas devido a ferimentos aos 20 anos. Com formação universitária e fluente nos debates filosóficos e científicos da época, ele se destacou como escritor e dramaturgo. Entre suas obras mais relevantes estão "Os Estados e Impérios da Lua" e sua sequência "Os Estados e Impérios do Sol", publicadas postumamente.
Esses livros se inserem na tradição das sátiras sociais e exploram temas de civilização através dos encontros com seres extraterrestres. As narrativas de Cyrano criticam a sociedade europeia ao mesmo tempo em que provocam reflexões sobre o humano e o desconhecido.
A ideia de viajar à Lua não era exclusiva de Cyrano; desde as observações de Galileu Galilei sobre o satélite natural da Terra em 1610, surgiram discussões sobre a natureza lunar. Galileu desafiou a visão aristotélica da Lua como um corpo perfeito ao revelar suas montanhas e vales. Este novo entendimento despertou o interesse entre escritores contemporâneos.
Além disso, uma obra notável anterior a Cyrano foi "O Homem na Lua" do bispo inglês Francis Godwin, onde um herói viajava à Lua utilizando gansos selvagens. Contudo, a abordagem de Cyrano era mais ambiciosa; suas sátiras não apenas apresentavam mundos imaginários, mas também questionavam normas estabelecidas.
Cyrano utilizava sua narrativa para explorar ideias científicas da época. Por exemplo, seu protagonista Dyrcona viajava em uma embarcação peculiar feita com garrafas de orvalho e discutia teorias astronômicas com outras figuras fictícias. Em suas aventuras interplanetárias, ele confrontava conceitos como o geocentrismo aristotélico versus as teorias heliocêntricas defendidas por Galileu.
Em seu retorno à Terra, após visitar o Sol – descrito como um lugar brilhante onde as almas vão após a morte – Dyrcona reflete sobre suas experiências e interações com filósofos. É evidente que as provocações literárias de Cyrano abordavam questões consideradas perigosas na época.
Um relato marcante descreve a sensação de decolagem da máquina inusitada, explica a BBC.
"De repente, senti que meu estômago tremia, como um homem erguido por um aparelho. Ia abrir a escotilha para descobrir a causa deste sentimento, mas quando estendi minha mão, notei através do buraco no chão da minha caixa que minha torre já estava muito longe abaixo de mim, e meu pequeno castelo no ar, empurrado para cima sob meus pés, me deu um vislumbre momentâneo de Toulouse se afundando na Terra".
Cyrano faleceu após ser atingido por uma viga enquanto caminhava pelas ruas aos 36 anos. Apesar disso, seu legado permanece como um testemunho do potencial humano para imaginar futuros além dos limites conhecidos.