Em entrevista ao site Aventuras na História, ele conta sobre a visita do Rei do Pop no hospital, o assédio midiático e resultado dos processos jurídicos
Publicado em 18/11/2020, às 16h50 - Atualizado em 27/05/2022, às 08h00
No dia 13 de outubro de 1993, Michael Jackson desembarcava no Brasil para realizar um dos mais impressionantes shows já feitos em terras tupiniquins. Marcados para os dias 15 e 17 de outubro no Estádio do Morumbi, o equipamento da produção veio em dois aviões gigantes Antonov An-124, totalizando 400 toneladas de itens.
Ao longo dos dois dias seguintes, 29 carretas saíram para deixar tudo preparado no retorno do astro ao país, desde 1974. Por isso, a espera pelo espetáculo mobilizou a venda de 70 mil ingressos apenas no primeiro show. Se por um lado, a expectativa dos fãs brasileiros era imensa, Michael também fazia questão de conhecer ainda mais o país, realizando diversos passeios por São Paulo.
No primeiro dia, pouco após a descida do avião, Michael, acompanhado de filhos de amigos americanos, fez sua primeira parada. Foi ao parque de diversões Playcenter, conhecendo o dono, Marcelo Gutglas, e recebendo a então empresária de Xuxa, Marlene Mattos. Os encontros foram mínimos em relação às duas horas que se divertiu nos brinquedos, tendo o La Bamba como seu preferido, após apuração da Folha na época.
Plano frustrado
De acordo com a mesma reportagem da Folha, no dia seguinte, Michael teria tempo livre para realizar mais visitas durante sua estadia, cogitando visitar o setor infantil do Hospital Darcy Vargas. Para isso, o cantor decidiu fazer uma visita à fábrica de brinquedos Estrela, localizada em Guarulhos, 35 km a leste da capital paulista, para a compra de presentes.
Foi nesse momento que Márcio Alberto de Paula e, sua irmã, Renata, decidiram ver o motivo da movimentação no bairro, como contou em entrevista exclusiva à AH: “Os carros da comitiva dele passaram pela rua onde eu morava. Quando isso aconteceu, meus amigos da época é que disseram: “É o Michael Jackson... Vamos lá tentar vê-lo?”. Nesse embalo e empolgação típica de adolescentes, eu e minha irmã fomos por curiosidade”.
A descida do prédio não era planejada pelo rapaz, visto que não estava atento à chegada de Jackson no país: “Minha avó materna havia morrido tinha poucos dias, então, nenhuma atenção minha ou da minha família estava sendo dedicada para esse ‘evento’”. Mesmo assim, se aglomerou junto a alguns outros curiosos para ver o astro internacional. A comitiva do cantor, entretanto, não conseguiu encontrar a Estrela, perambulando pelas ruas do bairro — em alta velocidade e com curvas abruptas.
Em uma delas, uma van passou estreitamente ao lado de uma viatura policial — justamente onde os irmãos estavam apoiados. Quatro pessoas, incluindo um cinegrafista do SBT, saíram com ferimentos leves, contudo, Márcio foi prensado e sofreu fratura no fêmur direito, sem ter o socorro prestado pelo condutor.
Pouco depois, uma ambulância conduziu o jovem para o Pronto Socorro José Storopoli, sendo posteriormente transferido para o Hospital Anchieta.
Atropelado pelo Rei do Pop
Com o retorno de Michael ao hotel, o foco da imprensa nacional se voltou ao jovem Márcio, com 15 anos na época: “Existiam muitos repórteres e fotógrafos na porta do hospital onde fiquei internado. Por conta dessa situação incomum para o lugar, para os profissionais e demais pacientes, o próprio hospital disponibilizou seguranças que ficaram na porta do meu quarto, no andar e na entrada do local", afirmou o rapaz.
Uma visita ilustre, no entanto, surpreendeu o rapaz na tarde do segundo dia de internação: o próprio Rei do Pop subiu, sem avisar, ao quarto 123, ordenando a saída da imprensa e ficando 20 minutos no quarto com o garoto e os familiares.
“Era a materialização de tudo o que eu via na TV, nas revistas... bem ali na minha frente. Não dava para acreditar. Achei ele bonito! Além disso, ele era bem perfumado e o cheiro dele permaneceu no quarto por um tempo”, relembrou Márcio.
Com a família da vítima, Michael tirou fotos, dançou e apresentou os filhos dos amigos, que o acompanhava. O jovem Márcio descreveu a voz do astro como algo “impressionante” pela semelhança das gravações em estúdio.
Ele acrescentou que a preocupação do astro era notável: “Teve também as perguntas (muitas!) sobre como eu estava me sentindo, se já tinha passado a dor, onde eu havia me machucado e, claro, o pedido de desculpas. Ele tinha um ‘ar’ de garoto, brincalhão, bagunceiro”.
Assédio da imprensa
Amplamente noticiado, o tal “único brasileiro que viu Michael de perto” se tornou alvo para uma cobertura ainda maior do caso, como explicou o rapaz: “O acidente, a fratura... tudo isso foi fácil de tratar. O difícil foi lidar com essa necessidade mórbida que alguns veículos da época tinham por esse caso. O assédio era pavoroso... o bullying, então. Nossa!”. Enaltecido como fanático pelo astro — informação que Márcio faz questão de negar — o período foi descrito como “um show de horrores”.
Em um desses episódios, o extinto Notícias Populares, que já perseguia o rapaz com manchetes de duplo sentido, decidiu providenciar um encontro bizarro. Em 1994, LaToya Jackson, irmã e, na época, brigada com o cantor por validar as suspeitas de abuso sexual infantil, faria uma série de shows no Brasil, inclusive comentando o caso de Márcio como “uma coisa terrível” durante entrevista coletiva.
Mal sabia ela que, em 12 de outubro de 1994, se encontraria com a vítima, convidada pelo jornal para o show paulista. “Quando chegamos ao Palace [casa de shows], para minha surpresa, só havia eu, minha irmã, a equipe no NP e mais duas ou três pessoas. O show estava perto de começar e, diante da falta de público, pensei que a apresentação seria cancelada. Na minha cabeça, não tinha sentido ela fazer um show para 8 pessoas. Me enganei...”, brincou Márcio.
Após o termino a estranha apresentação, a equipe que acompanhava o jovem ainda o levou para o camarim, apresentando o rapaz como “o menino brasileiro envolvido em mais uma polêmica com o seu irmão” — buscando mais uma declaração polêmica da cantora.
No entanto, os repórteres saíram mais frustrados do que esperavam; LaToya esbanjou educação, tirou uma foto e ainda autografou para Márcio, sem acrescentar comentários.
Indenização
Durante o constante assédio midiático, um processo movido pelo pai de Márcio, João Alberto de Paula, solicitava a cobertura pelos custos hospitalares, pelos danos físicos que limitou o jovem durante todo o ano seguinte e por uma possível autopromoção do astro após a visita no hospital. Ao contrário do que foi divulgado pela produtora que promovia o show, o jovem nunca recebeu CR$ 1 milhão de indenização.
“Nunca fui indenizado. Muita gente ainda pensa que isso aconteceu... mas não! Eu tive todas as despesas do hospital pagas enquanto eu estive internado”. O processo prosseguiu na justiça americana contra o próprio cantor, tendo a indenização negada em território americano, como noticiou o Estadão em 2002. Ao ser retomada na justiça brasileira, a solicitação permaneceu de maneira inconclusiva.
Sobre a tal publicidade com o acidente, Márcio explica que há dúvidas, mas prefere acreditar na generosidade: “Tempos depois, uma assessora de imprensa de uma celebridade brasileira conversou comigo e disse que ele só foi ao hospital porque ela havia dito: “Vá lá, visite o menino porque essa situação pegou mal pra você no Brasil, entre outros”. [...] Não sei se é totalmente verdade e não tenho a ideia de tentar descobrir se a assessora, de fato, agiu no ‘backstage’”, acrescentou.
Depois de Michael
Os episódios também renderam frutos positivos para Márcio, que recebeu dezenas de presentes relacionados ao cantor: “Eram LP’s, fitas K7, VHS de shows, livros e revistas importados... Acho que chegou uma época em que tudo que existia do Michael, eu tinha. Com exceção da minha família (pais e irmãs), acho que todos me deram presentes do Michael. Amigos, outros familiares, colegas de escola... (risos)”. De acordo com ele, apenas as fotos pessoais restaram, doando o resto para fãs do músico e amigos.
Hoje, aos 42 anos, ele explica que a influência da imprensa o inspirou a se formar na área da Comunicação: “Tem gente por detrás das câmeras fazendo tudo acontecer da maneira como tem que acontecer: com verdade e responsabilidade. Isso me inspirou sim, claro! Afinal, penso que, qualquer profissional que atue no seu respectivo segmento com seriedade e profissionalismo, é uma grande fonte de inspiração”, acrescentou.
Por fim, ele explicou que sente ter “sobrevivido” a exposição midiática, mas que, frequentemente, esquece o episódio, comentando raramente. “Mesmo sendo raro eu tocar nesse tema, fico feliz quando consigo ajudar alguém a superar um trauma ou uma situação que se “assemelhe”. Esse foi o melhor aprendizado: estender a mão a quem se identifica com o que passei, acolher, respirar fundo e sentir orgulho da pessoa que me tornei”, concluiu.
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