A Revolta da Vacina, entre 10 e 16 de novembro de 1904, foi marcada por protestos contra a vacinação obrigatória e gerou 945 prisões, 110 feridos e 30 mortos
Nos séculos 18 e 19, surtos de doenças como febre amarela, peste bubônica e varíola eram frequentes no Brasil. Embora as vacinas tenham ajudado a controlar muitas dessas enfermidades, o processo não foi simples.
A Revolta da Vacina, entre 10 e 16 de novembro de 1904, foi marcada por protestos contra a vacinação obrigatória, gerando 945 prisões, 110 feridos e 30 mortos, impulsionados por fatores como política, medo e desinformação.
O médico sanitarista Oswaldo Cruz, formado em microbiologia na França, foi um dos principais responsáveis por essas transformações. De volta ao Brasil, ele se uniu a Vital Brazil, Emílio Ribas e Adolpho Lutz para combater surtos de peste bubônica nos portos de Santos e Rio de Janeiro.
Segundo o portal do Instituto Butantan, a eliminação dos roedores como vetores da doença o tornou uma figura conhecida, e, em 1903, ele foi nomeado diretor-geral de saúde pública, com a missão de controlar a febre-amarela.
Após estudar métodos cubanos de combate à doença, Cruz implementou medidas de controle do mosquito Aedes aegypti, resultando na redução de casos. A luta contra a varíola, uma das doenças mais mortais da época, foi o próximo desafio.
Em 1904, o Rio de Janeiro, com cerca de 800 mil habitantes, enfrentava sérios problemas sanitários devido ao crescimento desordenado da cidade, com rede de esgoto precária e falta de coleta de lixo. Doenças como varíola, cólera e tuberculose eram comuns. Um surto de varíola, que matou 3.500 pessoas naquele ano, levou Oswaldo Cruz a propor ao governo a vacinação obrigatória contra a doença em todo o país.
Embora a vacinação contra varíola fosse obrigatória no Rio desde 1837, a baixa produção de vacinas impediu a efetividade dessa medida. Em 1884, a produção em larga escala começou, e, em 1904, um novo projeto de lei foi aprovado, tornando a vacinação realmente obrigatória, conforme informações do portal.
A Lei nº 1.261, de 31 de outubro de 1904, concedeu amplos poderes às autoridades sanitárias, permitindo a aplicação de multas para aqueles que se recusassem a tomar a vacina contra a varíola. A lei também exigia um atestado de vacinação para matrícula escolar, casamento, viagens e até para conseguir emprego.
De acordo com o Instituto Butantan, resistência à lei vinha principalmente dos opositores do presidente Francisco de Paula Rodrigues Alves, paulista que governava o Brasil em um período marcado pela alternância de poder entre políticos de São Paulo e Minas Gerais, conhecido como República do Café com Leite.
A obrigatoriedade da vacinação foi utilizada pelos republicanos como uma forma de ataque ao presidente. Em 5 de novembro de 1904, após um encontro no Centro das Classes Operárias, foi criada a Liga Contra Vacina Obrigatória, liderada pelo senador Lauro Sodré.
Cruz, por sua vez, argumentava que, em vários países europeus, a vacina havia sido um sucesso, salvando inúmeras vidas. Contudo, muitos políticos se opuseram à medida e a população, desinformada, temia que a vacinação obrigatória resultasse em invasões frequentes de suas casas pelos agentes de saúde, que tinham autorização para entrar nas residências.
Além disso, boatos sobre a vacina, que usava o vírus da varíola bovina, afirmavam que quem se vacinasse ficaria com características de um boi, alimentando ainda mais o medo e a rejeição.
A Revolta da Vacina teve início em 10 de novembro de 1904, liderada pela Liga Contra Vacina Obrigatória. Segundo o jornal Gazeta de Notícias, em 14 de novembro, os protestos foram intensos, com tiros, gritos, interrupção de trânsito, fechamento de estabelecimentos, assaltos e destruição de bondes e edifícios públicos.
Os confrontos começaram com uma reunião de opositores à lei, incluindo estudantes, e rapidamente se espalharam, com mais de duas mil pessoas enfrentando as forças do governo. O transporte público entrou em colapso, e as lojas fecharam.
O saldo foi de 945 prisões, 110 feridos e 30 mortos, além de 461 deportados para o norte, onde foram condenados a trabalhos forçados. Com o agravamento da situação, o governo decretou estado de sítio em 16 de novembro, suspendendo temporariamente os direitos civis.
A revolta perdeu força, e no mesmo dia, o presidente Rodrigues Alves revogou a lei, mas manteve Oswaldo Cruz, alvo principal das manifestações, como diretor-geral de saúde pública, repercute o portal.
Após a revolta, a vacinação contra a varíola passou a ser voluntária. Em 1906, os casos de varíola caíram drasticamente, mas uma epidemia em 1908 provocou 6.500 mortes. Isso fez com que a população, temerosa da doença, procurasse os postos de saúde para se vacinar. Desde 1980, a varíola foi considerada erradicada pela OMS.