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Matérias / Santos Dumont

Aviões e guerras: O uso bélico da invenção de Santos Dumont

Também conhecido como "pai da aviação", Santos Dumont presenciou, com tristeza, o uso bélico de sua invenção

Éric Moreira, sob supervisão de Thiago Lincolins Publicado em 19/07/2023, às 13h03 - Atualizado em 20/07/2023, às 10h01

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Avião alemão da Primeira Guerra Mundial e o inventor Alberto Santos Dumont - Foto de Europeana pelo Wikimedia Commons / Domínio Público via Wikimedia Commons
Avião alemão da Primeira Guerra Mundial e o inventor Alberto Santos Dumont - Foto de Europeana pelo Wikimedia Commons / Domínio Público via Wikimedia Commons

Neste 20 de julho, o Brasil relembra e vibra com os 150 anos desde o nascimento de uma das figuras mais emblemáticas da história do Brasil, bem como chave para uma das maiores conquistas da humanidade: Alberto Santos Dumont, o "pai da aviação".

Nascido no ano de 1873 em João Gomes — que posteriormente viria a se chamar Palmira e, hoje, recebe o nome do inventor em sua homenagem —, município de Minas Gerais, Dumont foi filho de Henrique Dumont, um engenheiro e cafeicultor brasileiro, com Francisca Santos Dumont, de origem portuguesa. Desde a infância demonstrou grande curiosidade e criatividade.

Como já era membro de uma família privilegiada socialmente, Dumont nunca sofreu com grande pressão para se inserir no mercado de trabalho. Em vez disso, recebeu total apoio do pai, que incentivou seus estudos e inventos, tendo até mesmo viajado à França para estudar engenharia.

Foi no país europeu, berço de incontáveis inovações e que exalava inventividade, que Dumont teve a oportunidade de conhecer profissionais e materiais de ponta — para a época —, sendo esse o empurrãozinho certo para que ele se lançasse cada vez mais em um dos maiores sonhos da humanidade: voar.

Ao longo de sua vida, estudou e aperfeiçoou tudo que tinha ao alcance no que se refere a aerodinâmica, criando incontáveis balões, dos quais era entusiasta. Mas isso não bastava, e Dumont nunca deixou de melhorar essas criações, até que, no dia 7 de setembro de 1906, finalmente alçou voo com o 14-bis, o primeiro avião da história — título este reivindicado também pelos admiradores dos irmãos Wright.

O ilustre inventor faleceu aos 59 anos em 23 de julho de 1932. Com uma morte alvo de controvérsias, sabe-se que o uso bélico de sua mais importante criação o entristeceu. 

O inventor Alberto Santos Dumont
O inventor Alberto Santos Dumont / Crédito: Domínio Público via Wikimedia Commons

Inovação e futurismo

Como já mencionado, muitas das inovações de Dumont só foram possíveis graças a sua formação acadêmica na França, em uma época onde ali viviam inúmeros inventores e a cidade de Paris respirava avanços técnicos.Na mesma época, somente 3 anos depois, surgiu também o chamado 'Manifesto Futurista' (1909), escrito pelo italiano Filippo Tommaso Marinetti e publicado no jornal francês Le Figaro.

A obra, por sua vez, marcou o surgimento do Futurismo, um dos primeiros movimentos da arte moderna, que, na verdade, culminou no nascimento de um novo período para a própria humanidade. Isso porque, em 11 itens, o manifesto proclamava uma ruptura com o passado, além de promover identificação entre homem e máquina, bem como a velocidade e o dinamismo do novo século; o que não se distanciava do que já era a vida de inovações dos parisienses.

A leitura da ciência como transformação do mundo era vista como algo tremendamente positivo. As grandes feiras eram expectativas de comércio, eram vistas com bons olhos. Então, a ideia da ciência como aquilo que daria mais conforto, mais tranquilidade ao homem, era um mito fundamental", explica o historiador Rodrigo Rainha, professor da Faculdade Estácio, em entrevista excluvisa à Aventuras na História.

No entanto, o que parecia a princípio como um sonho aos grandes inventores do mundo, a vida agitada dos novos inventos e tecnologias emergentes, se tornou contexto e palco de um dos eventos mais importantes da história recente da humanidade, e também um pesadelo: a Primeira Guerra Mundial (1914 - 1918).

O avião e a guerra

Iniciada oficialmente no dia 28 de julho de 1914, a Primeira Guerra Mundial foi o primeiro grande conflito global a fazer uso da ainda emergente tecnologia dos aviões. No entanto, é importante lembrar que, na época, o mundo ainda presenciava um período de transição nessas tecnologias, de forma que era possível ver nos campos de batalha, ao mesmo tempo, cavalos, bicicletas, tanques e aviões.

Porém, "há uma aceleração da tecnologia com a guerra", segundo Rodrigo Rainha, de maneira que foram utilizados aviões pelas nações mesmo nessa época, menos de 10 anos depois do primeiro voo do 14-bis de Dumont.

Infelizmente, para o inventor brasileiro, um pacifista, o conflito levaria à morte quase 20 milhões de pessoas, "deflagrando uma grande dor" sobre o que significava sua criação, que auxiliara grandemente nesse saldo.

Um dos primeiros modelos de aviões utilizados na Primeira Guerra Mundial (1914 - 1918)
Um dos primeiros modelos de aviões utilizados na Primeira Guerra Mundial (1914 - 1918) / Crédito: Domínio Público via Wikimedia Commons

Oposição ignorada

Devido a sua revolucionária criação, Dumont se tornaria uma celebridade europeia nos anos que se seguiriam. Ele estava presente no ambiente em que surgiram outras grandes criações. Um exemplo mencionado por Rainha é a proximidade entre o brasileiro e o historiador francês Pierre de Frédy — mais conhecido pelo título nobiliárquico de Barão de Coubertin —, fundador dos Jogos Olímpicos na era moderna, de maneira que inclusive defendia o uso de aviões em modalidades esportivas.

Porém, a guerra levou o mundo a tomar outros rumos e direcionar seus olhos para outro uso da maior criação de Dumont. Mas é importante pontuar: ele renegava os usos bélicos do avião, preferindo que o transporte servisse somente como, de fato, um transporte, ou mesmo no esporte e lazer.

"Nos anos 1920, ele imagina que vai conseguir uma mobilização de crítica ao uso do avião como um processo para a guerra, para o uso do avião em outras funções", explica Rodrigo Rainha.

No entanto, ofuscado pelos avanços da guerra e em um mundo ainda em recuperação, "esse movimento não teve eco, ainda que tenha saído em uma revista ou outra, ou aparecido em uma tentativa de projeto. O utilitarismo do momento acaba desvalorizando essa perspectiva", de forma que o discurso de Dumont, contrário ao uso bélico dos aviões, não se disseminou tanto quanto gostaria.

Provavelmente foi o começo do fim de Dumont: uma criação revolucionária, praticamente uma doação do inventor ao mundo, pensada em garantir que o homem chegasse mais próximo dos céus, foi responsável pela queda de milhões de pessoas. E assim que, com um "grave quadro de depressão, associado ao uso de aviões de forma bélica e as notícias que o rádio trazia sobre os impactos da guerra", que Dumont foi da glória à sua própria ruína.