Conhecida como 'rainha da cocaína', sua trajetória de crimes será retratada em 'Griselda', nova série da plataforma de streaming Netflix
Publicado em 27/03/2020, às 08h00 - Atualizado em 16/01/2024, às 17h31
'Rainha da Cocaína', 'Viúva Negra' ou 'Rainha do Narcotráfico'. Chame-a como quiser. O fato é que Griselda Blanco entrou para o comércio de cocaína muito antes de Pablo Escobar sequer pensar nessa possibilidade.
No início dos anos 1970, 'El Patrón' ainda era jovem e ganhava a vida manobrando carros; enquanto isso, Blanco já criava seu império. A história da 'rainha do narcotráfico' será tema da minissérie 'Griselda', que estreia na Netflix no próximo dia 25 de janeiro.
+ Griselda Blanco: Veja o que aconteceu com a madrinha do Cartel de Medellín;
Antes de saber mais sobre a história da mulher, precisamos deixar claro que a ligação entre os dois narcotraficantes é incerta: enquanto muitos apontam que Escobar era protegido da 'Viúva Negra'; outros dizem que eles eram inimigos mortais. O fato, porém, é que Pablo se aproveitou muito das faças elaboradas por Griselda.
Entre tiroteios em shoppings, ataques de esquadrões de motocicletas e invasões de casas, Griselda Blanco se tornou uma das mulheres mais mortíferas de sua época — acredita-se que ela tenha sido responsável por, pelo menos, 200 assassinatos; mas o número pode ser ainda maior.
As pessoas tinham tanto medo dela que sua reputação a precedia onde quer que ela fosse", disse Nelson Abreu, ex-detetive de homicídios no documentário 'Cowboys de cocaína'. "Griselda era pior do que qualquer um dos homens envolvidos [no tráfico de drogas]".
Griselda Blanco Restrepo nasceu em Santa Marta, na Colômbia, em 14 de fevereiro de 1943, mas se mudou ao lado da mãe para Medellín quando tinha apenas três anos. Segundo o documentário 'cowboys de cocaína', sua vida de crimes começou logo cedo.
Aos 11 anos, ela teria sequestrado um menino de 10 e atirado em sua cabeça após sua família não pagar o resgate; ela ainda teria cometido outros delitos: como furto de carteiras. Nesta fase, ela também começou a vender seu corpo.
Nos anos seguintes, Griselda conheceu o contrabandista Carlos Trujillo, com quem acabou se casando e teve três filhos. O casamento não durou muito tempo, visto que Carlos acabou morto na década de 1970 — sendo o primeiro dos três maridos de Griselda a ter um fim 'trágico'.
Foi o segundo companheiro de Blanco, aliás, que lhe apresentou ao comércio de cocaína. Pouco após a morte de Trujillo, a colombiana se mudou para o Queens, em Nova York, ao lado de Alberto Bravo. Com uma ligação direta entre os países, o negócio dos dois passou a decolar. Neste mesmo período, Griselda passou a ser conhecida como 'la madrina' (ou, 'a madrinha' em tradução livre).
O apelido não foi por acaso, visto que ela encontrou um jeito novo de enviar o pó para os Estados Unidos: escondido nos sutiãs e roupas íntimas de jovens que eram enviadas como 'mulas' para o país. Com a aceleração do mercado, Bravo voltou para a Colômbia para reestruturar os canais de exportação enquanto Blanco expandia o império em Nova York.
Mas tudo desmoronou em 1975, quando o casal foi investigado por uma ação conjunta da Polícia de Nova York e de Administração de Repressão às Drogas, na chamada Operação Banshee. Antes de ser indiciada, porém, Griselda conseguiu fugir de volta para seu país.
Acredita-se que ela tenha matado Bravo após uma discussão sobre o sumiço de milhões de dólares. Uma lenda aponta que Griselda lhe acertou no rosto enquanto ela tomava um tiro no estômago. Outros dizem que Pablo Escobar teria sido o responsável por acabar com Bravo.
O que se sabe, porém, aponta o All That Interesting, é que a autópsia de Griselda Blanco, anos mais tarde, confirmou que ela tinha realmente uma cicatriz de bala na região de seu torso.
Com Alberto Bravo fora de jogo, Griselda Blanco ganhou o apelido de 'Viúva Negra'; além de ficar a frente, sozinha, de todo seu império das drogas. Apesar de ter sido presa, ela jamais deixou de enviar cocaína para os Estados Unidos.
Em 1976, por exemplo, especula-se que ela tenha contrabandeado a droga a bordo do navio Glória, que o governo colombiano havia enviado para a América como parte de uma corrida do bicentenário no porto de Nova York.
Dois anos depois, ela se casou com seu terceiro marido, o assaltante de bancos Dario Sepúlveda. Ainda em 1978, ela deu à luz ao seu quarto filho: Michael Corleone — nomeado em homenagem ao personagem de Al Pacino em 'O Poderoso Chefão'.
Usando suas habilidades como mulher de negócios, Griselda Blanco passou a levar a cocaína para um número cada vez maior de pessoas nos Estados Unidos. De volta ao país, viveu no luxo em Miami, quando ficou conhecida como a 'Rainha do Narcotráfico'.
Pioneira no comércio da droga por lá, ela também organizava festas selvagens que eram frequentadas pelos principais traficantes do mundo. Justamente nesta época, porém, eclodiu uma competição entre facções, o que incluiu o Cartel de Medellín.
Entre 1979 e 1984, o sul da Flórida se transformou em uma verdadeira zona de guerra, com o primeiro conflito ocorrendo em 11 de julho de 1979; quando a gangue de Griselda executou um traficante rival em um shopping. Trabalhadores do local ainda foram perseguidos pelos capangas da 'rainha da cocaína', mas ninguém se feriu gravemente.
Em outros casos, os assassinos chegam disfarçados em uma van de entrega blindada que tinha estampado em sua lateral a frase: "Fornecimento completo para festa Happy Time".
"Nós o chamávamos de 'vagão de guerra' porque suas laterais eram cobertas por aço de um quarto de polegada com portas para armas cortadas", lembrou Raul Diaz, um ex-detetive de homicídios do condado de Dade.
Com o 'vagão de guerra' sendo apreendido, porém, Blanco teve que encontrar outro veículo mais eficiente para as fugas; o que acabou resultando no uso de motocicletas em assassinatos.
Para se ter uma ideia, no início da década de 1980, 70% da maconha e da cocaína que chegavam aos Estados Unidos passavam por Miami; tudo isso com Griselda Blanco sendo a principal envolvida. No período, os assassinatos na cidade também aumentaram, transformando o local na 'capital americana do homicídio'.
Se não fosse por Griselda, os casos não teriam sido tão brutais, aponta Aldona Bialowas Pobutsky, professora da Unversidade de Oakland University e autora de 'Pablo Escobar and Colombian Narcoculture', em entrevista à A&E True Crime.
Outros criminosos matavam intencionalmente. Eles verificavam antes de matar. Blanco mataria primeiro e depois diria: 'Bem, ele era inocente. Isso é uma pena, mas ele está morto agora'", aponta.
Os conflitos de Griselda iam além das drogas. No final de 1983, ela ainda passou por um problema familiar depois que Sepúlveda sequestrou Michael Corleone e voltou para a Colômbia após uma discussão sobre a custódia do garoto.
O The Guardian aponta que Griselda encomendou a morte do companheiro, que supostamente acabou morto por assassinos fantasiados como policiais. Dario teria sido morto na presença de Corleone, que observou todo horrorizado.
Em seu auge, reporta o All That Interesting, na década de 1980, Griselda Blanco supervisionou uma organização que gerava um bilhão de dólares e cerca de 1.500 quilos de cocaína para os Estados Unidos todos os meses
No início de 1984, cansada do calor de Miami, ela decidiu se mudar para a Califórnia, onde passou a viver uma rotina discreta. Mas, cerca de uma ano depois, ela acabou sendo presa pela Administração de Repressão às Drogas. Com 42 anos na época, Griselda foi condenada a quase 20 anos de prisão por tráfico de drogas.
Enquanto estava detida, ainda foi acusada de três homicídios em primeiro grau, que poderia lhe render o corredor da morte. A principal testemunha era Jorge 'Rivi' Ayala — que acabou se envolvendo em um escândalo sexual com duas secretárias que trabalhavam no gabinete do procurador do estado. Assim, seu depoimento foi descredibilizado.
Após um acordo judicial, a 'madrinha da cocaína' foi deportada para a Colômbia, onde adotou uma nova vida. Mas sua história acabou em 3 de setembro de 2012, após compras em um açougue.
Abordada por um homem de meia-idade, que tinha acado de descer da garupa de uma moto, ela foi alvejada com dois tiros: um na cabeça e outro no ombro, caindo no chão sem esboçar qualquer tipo de reação.
"É uma espécie de justiça poética que ela tenha encontrado um fim que entregou a tantas outras pessoas", disse Bruce Bagley, autor do livro 'Drug Trafficking in the Americas'. "Ela pode ter se aposentado na Colômbia e não ser o tipo de jogadora que era no início, mas tinha inimigos persistentes em quase todos os lugares que você olha. Tudo que vai, volta".
*Matéria atualizada em janeiro de 2024 com mais informações;