Fundador do grupo responsável pelas maiores redes varejistas do país, o homem sofreu agressões em uma angústia de seis dias
Enquanto se dirigia ao trabalho na manhã de 11 de dezembro de 1989, o empresário Abilio Diniz não conseguiu concluir o trajeto. Uma ambulância parou na frente de seu carro, impossibilitando a passagem por completo. O que se parecia inicialmente como um problema durante uma emergência, na verdade, era o maior susto de sua vida.
Da ambulância, falsificada em um Chevrolet Caravan, desceram homens armados com revólveres e fuzis, rendendo e levando o varejista ao carro. Entre o cruzamento no Jardim Europa e o bairro do Jabaquara, o empresário chegou a tentar a luta corporal, mas conseguiu ser conduzido até o cativeiro em frente à Praça Hachiro Miyazaki.
Ao conseguir contato com a família, o grupo de sequestradores solicitaram US$ 30 milhões, além de se identificarem como membros do MIR (Movimento da Esquerda Revolucionária). Ao longo de uma investigação criteriosa, uma nota fiscal em nome de um dos criminosos conseguiu levar a polícia ao endereço, iniciando uma cansativa negociação.
Do medo a paz
Durante seis dias, o empresário ficou na residência com uma alimentação mínima, intimidação constante e até agressões físicas. Sem banheiro ou água encanada, foi instalado no subsolo em um quarto de três metros quadrados, com a ventilação passando por um duto improvisado, com luzes ligadas durante o dia todo. Com apenas uma banqueta e um colchão, o varejista não tinha noção de dias, períodos ou comunicação externa.
Cientes de que Abilio era um atleta e costumava frequentar academias, as trancas e suportes foram reforçados para que não houvesse uma tentativa de escape ou de uma segunda luta corporal. Em um dos quartos, os sequestradores chegaram a adquirir e armazenar um caixão, em caso de falecimento da vítima. No terceiro dia, a equipe policial chegou ao local e iniciou as negociações com o auxílio do próprio sequestrado.
Após mais de 130 horas, a negociação foi concluída pelo cardeal dom Paulo Evaristo Arns, então Arcebispo da Arquidiocese de São Paulo, que garantiu a segurança e benção de todos os presentes no cativeiro, de maneira que saíssem com segurança. As 17h, os sequestradores foram levados para um ônibus e Abilio saía andando lentamente, abraçado por amigos, após o pagamento do valor solicitado.
Alguns fatos distintos fizeram o crime ser relacionado a fatores políticos; com o sequestro concluído na véspera do segundo turno da eleição presidencial, disputada por Fernando Collor de Melo e Luiz Inácio Lula da Silva, a polícia revelou que os membros do MIR — 2 argentinos, 2 canadenses, 5 chilenos e 1 brasileiro — tinham material de propaganda do PT em um apartamento atribuído a um dos membros.
Com bandeiras, camisetas e sacolas estampando o partido petista, diversos jornais do país noticiaram uma associação da organização política com os criminosos. Tal fator adicionou ainda mais polêmica às eleições de 1989. No entanto, representantes do partido petista alegaram que não tinham conexão com o ato e que o material foi espalhado de maneira depreciativa por autoridades.
O então Ministro da Justiça, Saulo Ramos, chegou a levantar a hipótese de que o material foi instalado para que os criminosos se beneficiassem da lei de crimes com motivação política e evitassem penas maiores. A investigação concluiu que o partido não interviu no crime. Todos os 10 sequestradores foram presos, com os nove estrangeiros extraditados.