Revelação veio após a análise de esqueletos de 30 indivíduos enterrados em um cemitério próximo à terceira catarata do rio Nilo
Pesquisadores descobriram, no Sudão, evidências do uso mais antigo conhecido de tiras de cabeça — chamadas tumplines — para transporte de mercadorias e crianças na Idade do Bronze.
A prática era adotada por mulheres da Núbia há cerca de 4.000 anos, segundo estudo publicado na edição de março do Journal of Anthropological Archaeology.
A revelação veio após a análise de esqueletos de 30 indivíduos — 14 mulheres e 16 homens — enterrados em um cemitério próximo à terceira catarata do rio Nilo, na antiga região do reino de Kush.
Os restos mortais mais reveladores pertencem a uma mulher de elite, com cerca de 50 anos à época da morte, que apresentava as marcas mais evidentes associadas ao uso prolongado das faixas.
"Essa é a primeira evidência clara de que mulheres usavam tumplines para carregar cargas já na Idade do Bronze", afirmou Jared Carballo-Pérez, bioarqueólogo da Universidade Autônoma de Barcelona e autor principal do estudo, em entrevista por e-mail à Live Science.
As marcas detectadas incluem desgastes específicos nas vértebras cervicais e em áreas do crânio, compatíveis com o uso contínuo de faixas que transferem o peso da testa para a parte superior das costas.
Essas alterações foram notadas com mais frequência nos esqueletos femininos, indicando que as mulheres assumiam grande parte do trabalho de transporte da época.
O cemitério analisado está localizado a cerca de 10 quilômetros ao norte de Kerma, então capital do reino de Kush. Segundo o estudo, a cidade era um centro urbano movimentado, com armazéns, estruturas religiosas, cervejarias, padarias e fortificações.
Com base na análise dos ossos, os pesquisadores acreditam que as mulheres da região — inclusive em Kerma — usavam as faixas para transportar tanto mercadorias quanto crianças pequenas. Imagens do Egito Antigo corroboram essa teoria: em tumbas da 18ª dinastia, núbias são retratadas carregando crianças com o auxílio de faixas presas à testa.
A mulher de elite encontrada em Abu Fátima foi sepultada com itens de luxo, incluindo um leque de penas de avestruz e um travesseiro de couro.
Embora sua identidade permaneça um mistério, esses objetos sugerem que ela ocupava uma posição de destaque em sua comunidade. No entanto, mesmo com o status elevado, os sinais de desgaste em seu esqueleto indicam que ela também participava do transporte de cargas pesadas.
Análises isotópicas apontam que ela pode ter vindo de outra região do reino de Kush, possivelmente da segunda catarata do Nilo, ao norte do cemitério onde foi enterrada.
A prática do uso de tumplines atravessou os séculos. "Ela ainda está viva hoje em regiões rurais da África, Ásia e América Latina", observou a equipe de pesquisadores à Live Science. A descoberta, portanto, não apenas ilumina aspectos da vida cotidiana na Idade do Bronze, como também traça um elo fascinante entre o passado e o presente.