João Pedro estava jogando videogame com um primo quando teve sua adolescência interrompida
Naquela manhã de maio, o quarto que o jovem João Pedro, de 14 anos, dividia com sua irmã mais nova, Rebeca, de 4, tinha ganhado uma televisão e uma cama nova. Depois disso, ele ainda teve permissão para ir à casa de um primo jogar videogame.
Era um bom dia para o adolescente, que faria 15 no mês seguinte. Até que, de repente, tudo mudou quando uma operação conjunta entre policiais civis e federais entrou na residência onde ele estava, no Complexo do Salgueiro.
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João foi atingido nas costas por um dos projéteis, e, apesar de ter sido supostamente levado para um hospital na capital no helicóptero dos próprios oficiais, seu ferimento era muito grave, de forma que ele acabou morrendo no caminho.
Segundo divulgado pelo G1 em 20 de maio de 2020, os familiares não puderam acompanhá-lo no veículo, e nem foram informados de onde o menino foi parar, encontrando-o no IML do Tribobó 17 horas mais tarde.
Um ano mais tarde, a investigação da morte do adolescente negro ainda está longe de uma conclusão. “Há uma série de irregularidades gravíssimas, como a não preservação da cena do crime, destruição de provas e quebra de cadeia de custódia”, listou o defensor público Daniel Lozoya, que está representando o garoto carioca na Justiça, em entrevista recente à Folha de São Paulo.
O representante legal ainda disse ao veículo que o caso “está praticamente paralisado” desde outubro de 2020, em que foi feita a reconstituição do ocorrido com a ajuda do delegado Sérgio Sahione Ferreira, que comandava a Coordenadoria de Recursos Especiais, o órgão da Polícia Civil responsável pela operação que tirou a vida do adolescente. Mais de seis meses depois, todavia, o laudo da simulação ainda não ficou pronto.
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Segundo a Folha, Sérgio, que, aliás, pediu demissão dois meses após o ocorrido, afirmando que estava com dificuldade de dormir à noite, disse em seu depoimento que o alvo que a operação daquele dia pretendia atingir estava a 60 metros da casa onde o garoto brincava com seu primo.
De acordo com o delegado, o motivo para o ataque àquela residência, em especial, seria porque os integrantes da facção criminosa Comando Vermelho, a verdadeira razão pelo qual os policiais estavam ali, haviam “se deslocado para uma área de mata nos fundos da casa alvo”, e, em meio à fuga, teriam sido vistos por algum membro da operação entrando na casa onde estavam as crianças, assim levando os policiais e invadirem o local.
“A polícia quer forjar uma situação. Não tinha bandido. Entraram na casa e atiraram duas granadas. Além dos tiros. Só tinha adolescentes de família”, afirmou o pai do menino, Neilton Pinto, em uma entrevista via videochamada ao programa “Encontro com Fátima Bernardes”, no dia 20 de maio de 2020, segundo repercutido por uma matéria do Extra do mesmo período.
O veículo divulgou ainda que a residência onde o rapaz morreu ficou com 72 marcas de tiro, segundo uma contagem feita pela comunidade local. O caso gerou ainda muita comoção na época, com vários membros de comunidades cariocas organizando manifestações.
A despeito da ausência de respostas, os pais de João Pedro, assim como sua irmã Rebeca, atualmente com 5 anos de idade, têm tentado seguir em frente.
Em entrevista à Folha eles contaram que pintaram de rosa o quarto da menina, agora que ela não o divide mais com o irmão mais velho. “A cama que comprei, que era para os dois, agora só a minha filha dorme nela”, comentou ainda o progenitor.
Ainda de acordo com ele, toda vez que Rebeca vê o rosto do irmão passando no noticiário, o casal precisa explicar que o adolescente morreu por conta de um erro da polícia, e que agora está “com o papai do céu”. O consolo, infelizmente, não impede que a garotinha tenha pesadelos de vez em quando.