A lendária dupla pop britânica negociou com o governo do país asiático por 18 meses, atravessando pedidos do Queen e Rolling Stones
Durante o início da década de 1980, a China passava por um reposicionamento depois da turbulenta e intensa Revolução Cultural, que buscou vangloriar os atos de Mao Zedong e instaurar um padrão de comportamento — resultando em um fechamento da compreensão chinesa ao mundo exterior.
Por isso, a necessidade de receber estrangeiros e seus investimentos financeiros era uma das prioridades do Partido Comunista Chinês, porém, havia um entendimento de que a abertura cultural e comercial havia de ser gradativa. Sabendo do fechamento, o Queen e os Rolling Stones tentaram negociar a entrada no país para a realização de shows, sem sucesso.
Indo na direção contrária ao calmo processo de reabertura, ambas as bandas tocavam rock, discutiam fatores cotidianos nas letras e, principalmente, exerciam uma enérgica presença de palco. Um outro conjunto britânico, entretanto, recebeu o sinal verde do governo para se apresentar em Pequim e em Guanzhou.
Wham! na China
Durante 18 meses de negociação, Simon Napier-Bell tentou fazer com que o Wham!, grupo que ele agenciava, tocasse na China e se tornasse o maior grupo pop do mundo por ultrapassar barreiras políticas e culturais. Liderada pelos dois galãs George Michael e Andrew Ridgeley, a boa recepção no país asiático também poderia reverberar numa melhora da imagem internacional, garantindo uma abertura maior para a recepção de estrangeiros.
Com o aval para tocar na China finalmente sendo aprovado, a dupla incluiu os shows chineses em abril de 1985 na turnê mundial. Os anúncios começaram a ser espalhados pelas cidades das apresentações, surpreendendo a população que, parcialmente, nunca havia sequer ouvido falar sobre Wham! ou escutado alguma música. De acordo com a BBC, o ingresso custava 5 yuans (cerca de R$ 4,06) — relativamente caro para uma população com custos controlados.
Sendo assim, a grande maioria do público que compôs os dois ginásios era convidada por membros do Partido Comunista e Ministério da Cultura. Porém, para continuar exercendo o controle, a abertura teve uma regra; todo membro da plateia recebeu, ao entrar, uma fita cassette contendo, de um lado, as músicas do Wham!, e de outro, versões comunistas das mesmas músicas cantadas pela chinesa Cheng Fangyuan.
No palco chinês
Em Pequim, a dupla de apresentou no Workers Gymnasium, com uma multidão de 12 mil pessoas no local. Três dias depois, o show em Guangzhou foi menor, recebendo apenas 5 mil pessoas. O conjunto não recebeu nenhuma quantia do governo chinês ou dos administradores das arenas, com todo o dinheiro revertido ao país, como noticiou Chicago Tribune na época.
Mesmo assim, o grupo fez questão de se apresentar, atraindo grande atenção da imprensa mundial e tendo os custos financiados por George Michael, que havia solicitado controle criativo sobre as imagens capturadas na turnê. Pulantes, usando topetes e roupas coloridas, a sensação das plateias foram mistas; os mais velhos não apenas desconheciam o grupo, como se mantiveram sentados e em silêncio, apenas aplaudindo na conclusão das músicas.
Já os mais jovens, acalorados com a presenta ocidental, pulavam e gritavam na plateia — mas não por muito tempo. Toda vez que alguém levantava, uma autoridade ordenava o retorno para o assento, acompanhado do mínimo de tumulto possível. Mesmo assim, a apresentação foi capaz de mudar os olhares internacionais do país e, no ano seguinte, o documentário “Wham! in China: Foreign Skies”, relatando a viagem, chegou a ser a sexta fita de vídeo musical mais vendida no mundo.
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