Sequestrado em sua casa, quando tinha 10 anos, em 1973, Carlinhos jamais foi encontrado e se tornou tema do Linha Direta
Publicado em 07/05/2023, às 17h00 - Atualizado em 08/05/2023, às 19h24
Na última quinta-feira, 4, o Linha Direta voltou a ser exibido pela TV Globo após 15 anos. Apresentado pelo jornalista Pedro Bial, a atração recordou o sequestro e assassinato de Eloá Cristina em seu primeiro episódio.
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Sob o comando de Bial, o Linha Direta passa por sua quarta fase: a primeira foi comandada por Hélio Costa, entre março e junho de 1990; Marcelo Rezende esteve a frente da atração entre maio de 1999 e agosto de 2000.
Já Domingos Meirelles foi o apresentador mais longevo do Linha Direta, onde ficou no ar de 17 de agosto de 2000 até 6 de dezembro de 2007. Entre os casos apresentados pelo programa, o sequestro de Carlinhos é um dos mais chamou a atenção do Brasil. O programa em questão foi exibido em 26 junho de 2003.
Numa chuvosa noite de quinta-feira, em 2 de agosto de 1973, Carlos Ramires da Costa, até então com 10 anos, estava em casa ao lado de sua mãe, Maria da Conceição Ramires da Costa, e quatro de seus seis irmãos — Vera Lúcia, de 15 anos; Carmem, de 14; Eduardo, de 13; e João, de 11 — assistindo televisão quando a luz do imóvel foi cortada.
Por volta das 20h35, um homem que usava uma bermuda azul-marinho e uma blusa vermelha invadiu a residência, que ficava localizada na Rua Alice, n.º 1.606, no bairro das Laranjeiras, na zona sul do Rio de Janeiro.
Segundo o jornal O Globo da época, o sujeito era um homem negro com cabelo estilo black power. Ao entrar na casa, ele pediu "a criança menor que estava em casa". O criminoso ainda trancou a mãe e os irmãos de Carlinhos no banheiro.
O sequestrador ainda teria deixado um bilhete, escrito a mão, pedindo um regate no valor de 100 mil cruzeiros, que deveriam ser pagos até o dia 4 de agosto, relatou o Jornal do Brasil na ocasião.
Aviso a você que a criança esta em nosso poder e só entregaremos após ser pago o resgate de cem mil cruzeiros. Esta importância deverá cer [sic] em pequeno volume e metido dentro de uma bolsa e deverá cer [sic] depositado ensima [sic] de uma caixa de cimento que fica situada na Rua Alice cruzando com a Rua Dr. Júlio Otoni, junto a duas placa [sic] no dia 4/8/1973 às 02:00 horas, digo duas horas do dia quatro, e lembre si [sic] de que qualquer reação a vítima será liquidada. OBS: Depois de ser feito este depósito deverão seguir em direção ao Rio Comprido e esta carta deverá ser devolvida no ato."
Pouco depois, o pai de Carlinhos, o industrial João Mello da Costa, que fazia uma entrega em Copacabana, chegou ao local acompanhado de seus dois outros filhos: Roberto, de 8 anos; e Luciana, de 3.
Junto de um funcionário, identificado como Abel Alves da Silva, João Mello chegou a perseguir o criminoso, que conseguiu fugir pelo matagal após pular o muro da casa. A polícia militar foi acionada em seguida.
Segundo o bilhete deixado pelo sequestrador, os cem mil cruzeiros deveriam ser deixados em uma bolsa numa caixa de cimento que se localizava entre a esquina das ruas Alice e Doutor Júlio Otoni, no cruzamento onde ficava placas de sinalização do Departamento de Estradas e Rodagem (DER).
Como as autoridades foram informadas, no mesmo dia do sequestro uma equipe do Corpo de Bombeiros e da 9ª Delegacia da Polícia Civil foram até a região citada para realizar buscas no local. Quando já passado das 21 horas.
A essa altura, rádios e emissoras de televisão já haviam repercutido o sequestro de Carlinhos, o que aumentou o número de interessados pelo ocorrido. Ainda assim, as buscas seguiram até o início da madrugada e foram recomeçadas no início da manhã seguinte.
Em poucas horas, o bilhete deixado pelo sequestrador já estampava as manchetes dos jornais e foi lido na íntegra pelos mais variados veículos de imprensa. A tensão aumentava conforme pistas não surgiam.
No dia da entrega de Carlinhos, policiais se disfarçaram de pipoqueiros e vendedores de sorvete para vigiarem o perímetro. Alguns repórteres também acompanhavam a ação, que ainda teve apoio de agentes do DOPS.
Conforme indicado pelo bilhete, João Mello levou a bolsa com o dinheiro e a deixou no local determinado. Mas o malote continha apenas algumas cédulas de cruzeiro, o restante eram papéis picados. Apesar de toda a trama, ninguém apareceu para fisgar a isca.
Uma das linhas de investigações se virou contra os diretores da clínica médica Dr. Filizzola, que ficada ao lado da casa da família de Carlinhos. O motivo se deu, pois, dias antes do sequestro, o Dr. Mário Filizzola ofereceu 60 mil cruzeiros para comprar o imóvel.
Marceneiro da clínica, Kleber Ramos chegou a ser preso após ser reconhecido pela irmã mais velha de Carlinhos. Segundo o Jornal do Brasil, foi ela quem recebeu o bilhete das mãos do sequestrador. Porém, ele provou seu álibi para a polícia: havia saído da clínica por volta das 20h acompanhado de três mulheres. Acabou solto depois de 72 horas.
Posteriormente, o perito Carlos Éboli estudou o bilhete deixado pelo sequestrador. Ele constatou que a mensagem foi escrita três dias antes do sequestro e os erros gramaticais foram feitos de propósito para confundir os pais de Carlinhos.
Entretanto, logo Maria da Conceição, mãe do jovem, passou a ser suspeita pelo crime devido seu estranho comportamento. Frequentadora de um centro espírita, todas às quintas-feiras, ela havia decidido ficar em casa no fatídico dia. Além disso, quando as autoridades chegaram ao local, após o sequestro, ela assistia TV calmamente.
Um dia após o ocorrido, a mãe de Carlinhos prestou depoimento na delegacia local. Outro detalhe interessante: ela havia colocado sua melhor peruca e usava uma maquiagem exagerada.
A polícia a descreveu como uma mãe pouco cuidadosa e que gastava todo o dinheiro que tinha com roupas e bilhetes de loteria. João Mello também foi incluído entre os suspeitos por estar passando por sérias dificuldades financeiras. Mas nenhuma dessas hipóteses foi adiante.
Segundo o Jornal do Brasil, em janeiro de 1974, o assaltante Adilson Cândido da Silva se entregou às autoridades admitindo o sequestro de Carlinhos. Ele alegou que jogou o corpo do menino no mar a mando de seu próprio pai. Seis meses depois, uma ossada foi encontrada na região indicada por Adilson, mas exames de DNA identificaram que os restos mortais não eram de Carlinhos.
Esse caminho também ficou sem desfecho por falta de provas. Outras linhas de investigação surgiram ao decorrer dos meses. O único fato concreto, até então, é que o paradeiro de Carlinhos jamais foi encontrado pelas autoridades.