Livro de 1937 imaginou um mundo onde o amor não existe, Hitler é idolatrado como um deus e mulheres são apenas animais falantes
Isabela Barreiros Publicado em 25/06/2020, às 10h32
Era 1937, dois anos antes do início da Segunda Guerra Mundial, quando a escritora britânica Katharine Burdekin publicou o livro Noite da Suástica, sob o pseudônimo masculino de Murray Constantine. A distopia pode ser considerada como uma antecessora a 1984, de George Orwell, e O Conto da Aia de Margaret Atwood. Mas o que eles têm em comum? Imaginam o mundo ante o autoritarismo das mais diversas formas.
No caso da Noite da Suástica, Burdekin simula em sua escrita quais seriam as consequências de uma vitória nazista em escala global, antes mesmo do conflito mundial acontecer e expor as ameaças da ideologia à humanidade.
700 anos depois do triunfo alemão, o líder nazista Adolf Hitler é adorado como um deus. A "Capela do Santo Hitler", local narrado no livro, possui formato de suástica e transforma um dos maiores genocidas do planeta em ícone religioso. Assim como em 1984, a História é reescrita e, nesse caso, retrata o Führer como um homem de cabelos longos e loiros e olhos azuis — representante máximo da superioridade ariana pensada pelo nazismo.
Nesse mundo, as mulheres também são vítimas de uma hegemonia masculina que as converte em “animais falantes”, termo utilizado por uma das personagens da obra para designá-las. Como são nada mais que bichos que falam, elas são vistas apenas como seres capazes de reprodução, sendo usadas apenas para tal fenômeno biológico, assim completamente desvalorizadas. É por isso que, segundo a religião dominante, Hitler "não nasceu de mulher", mas sim de Deus, o Trovão.
Uma questão importante é o fato de que as autoridades descobriram que dominar o povo por meio da própria religião seria mais fácil do que fazê-lo via força. Nesse ponto, a História também é recontada de maneira mais favorável àqueles no poder, e não se sabe muito sobre como era a vida antes da ascensão do nazismo — situação similar ao que aconteceu no mundo narrado em 1984.
Em um mundo dividido entre a Alemanha e o Japão, Burdekin descreve uma sociedade também segmentada em estratos sociais rígidos. Os Cavaleiros, ao topo da pirâmide, são descendentes dos 3 mil homens escolhidos por Hitler.
Em baixo deles, está o restante dos homens alemães, denominados como Nazistas, seguidos pelos estrangeiros, os Hitlerianos. E, por último, as mulheres, que vivem em lugares separados e enjauladas.
Essa expressão de domínio masculino no fascismo também antepõe o mundo narrado por Margaret Atwood. Elas nunca devem contradizer uma ordem masculina e também são obrigadas a encaminhar ao “mundo dos homens” seus descendentes masculinos.
O amor não existe mais. Nem a cultura, a imaginação, e a própria História. O totalitarismo, o fundamentalismo religioso e o patriotismo fanático tornaram o planeta um local quase impossível de se viver, especialmente para as camadas marginalizadas da sociedade, que ficam de fora de toda a situação de poder — não muito diferente do que acontece no mundo real, no entanto.
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