Hoje parte da Lista de Patrimônios Mundiais da UNESCO, Cais do Valongo já foi o maior porto receptor de escravos do mundo
Éric Moreira, sob supervisão de Thiago Lincolins Publicado em 12/03/2023, às 08h00 - Atualizado em 12/05/2023, às 10h32
É de conhecimento geral que, quando os portugueses chegaram ao Brasil e deram início a um violento processo colonizatório, que consistia principalmente na exploração das nossas riquezas naturais, uma prática aceita e comum era a de utilizar de mão de obra escrava em trabalhos braçais, seja de indígenas ou de negros trazidos da África.
Com isso, a miscigenação eventualmente se tornou uma marca muito forte da nossa sociedade, que é proveniente, basicamente, de uma mistura de povos indígenas, africanos de diferentes regiões do continente, e diversos europeus, não somente portugueses. Porém, ainda assim a escravidão permaneceu como uma prática comum pelo país ao longo de mais de 300 anos, tendo sido abolida oficialmente só no dia 13 de maio de 1888.
Considerando-se, também, a vasta extensão territorial que o Brasil possui, além do fato de que a região era super proveitosa para a exploração de determinados recursos, como o pau-brasil e a cana-de-açúcar, ao longo desses mais de 300 anos, estima-se que aproximadamente 4 milhões de escravos africanos chegaram aqui.
O valor por si só já é impressionante, visto que isso indica que eles representavam, na época, uma parcela muito considerável da população no território. Porém, impressiona ainda mais pensar que, desses 4 milhões, pelo menos um milhão deles chegou pelo mesmo lugar: o Cais do Valongo, no Rio de Janeiro. Conheça, a seguir, mais sobre o local pelo qual passou um milhão de escravizados no Brasil.
Sendo o principal ponto de entrada de africanos escravizados não só no Brasil como das Américas, o Cais do Valongo, localizado na cidade do Rio de Janeiro (RJ), passou a integrar a Lista do Patrimônio Mundial da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) em 2017. A presença na lista representa não só o reconhecimento de seu valor, como também é uma memória da violência contra a humanidade que a escravidão representa, bem como a resistência, liberdade e herança, não só para o Brasil como para todos os países membros do órgão.
De acordo com o site do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), pelo Cais do Valongo, localizado na região portuária da cidade do Rio de Janeiro, cerca de um milhão de escravizados africanos passaram em somente 40 anos. Não à toa que é considerado o maior porto receptor de escravos do mundo.
Sabendo disso, também se faz importante o reconhecimento da contribuição de povos africanos e seus descendentes na formação e no desenvolvimento cultural, econômico e social do Brasil e do continente.
O Cais do Valongo foi construído em 1811 pela Intendência Geral de Polícia da Corte do Rio de Janeiro, com objetivo de retirar da Rua Direita, onde hoje fica a Rua Primeiro de Março, o desembarque e comércio de africanos escravizados que eram levados para as plantações de café, fumo e açúcar do Brasil. Vale lembrar que aqueles que ainda havia aqueles que ficavam pela capital, mas estes eram geralmente domésticos ou usados em obras públicas.
Porém, com a abolição da escravatura em 1888, o local logo passaria a ser menos utilizado, servindo ainda como um cais, mas para a comercialização de produtos. Com o tempo, porém, ele foi se tornando cada vez mais esquecido e até mesmo substituído, de forma que ele só foi revelado novamente em 2011, durante as obras do Porto Maravilha, passando a se tornar, então, um sítio arqueológico.
Por fim, em 2012 a prefeitura do Rio de Janeiro acatou um conjunto de sugestões das Organizações dos Movimentos Negros, e transformou o espaço também em um monumento preservado e aberto à visitação do público. Hoje, ele integra o Circuito Histórico e Arqueológico da Celebração da Herança Africana, estabelecendo marcos da cultura afro-brasileira na região portuária.