Ela foi raptada de seu país quando tinha apenas 2 anos de idade, mas, após a libertação, foi capaz de preservar sua cultura original, tornando-se um símbolo de resistência
André Nogueira/ Atualizado por Ingredi Brunato, sob supervisão de Pamela Malva Publicado em 07/04/2021, às 19h00
No último sábado, 3, um comentário de conotação racista feito por um dos participantes do BBB 21, que é branco, para outro, que é negro, acabou gerando repercussão por todo o Brasil, e terminando por contribuir para a eliminação do participante que o fez.
Isso porque o cantor sertanejo Rodolffo, jogador que está atualmente fora do BBB 21, disse que uma peruca caricata que fazia parte de sua fantasia de homem das cavernas era “igualzinha” ao cabelo em estilo afro do professor de geografia João Luiz.
O segundo ficou extremamente desconfortável com o apontamento, e com bons motivos: os fios das pessoas negras são um alvo histórico de julgamento por parte da sociedade, um preconceito que foi novamente reforçado pelo sertanejo.
O racismo estrutural que persiste até os dias atuais, manifestando-se em comentários como o proferido por Rodolffo, é uma das grandes heranças da escravidão, esse capítulo atroz da História humana em que pessoas negras foram tratadas como objetos.
Nos Estados Unidos, a última vítima do violento sistema escravocrata foi Matilda McCrear, que morreu em 1940, quase oitenta anos após a abolição ter sido decretada. Sua posição histórica, todavia, apenas foi revelada em 2020, em virtude de uma pesquisa da historiadora Hannah Durkin, da Universidade de Newcastle.
Segundo divulgado por uma matéria do site Independent, que entrevistou Durkin, Matilda foi tirada de sua terra natal com apenas dois anos, raptada por comerciantes de escravizados na região da África Ocidental. Ela foi transportada para o território norte-americano a bordo do navio negreiro Clotilda, juntamente com sua mãe e sua irmã.
Embora não fosse muito mais velha que um bebê, a menina foi separada de sua família assim que a embarcação chegou ao seu destino, sendo comprada, logo em seguida, por um escravista diferente daquele que adiquiriu as outras mulheres.
McCrear tinha 6 anos de idade quando a escravidão foi abolida por Abraham Lincoln — e a despeito do período de tempo relativamente curto que passou trabalhando no campo sob o regime desumano (em comparação com muitos outros escravizados), a mudança constitucional não fez tanta diferença em sua realidade dura do dia-a-dia.
Isso porque a menina, sua irmã e mãe precisaram continuar trabalhando nas plantações para manter-se vivas em meio à sua situação precária.
“A história de Matilda é particularmente notável porque ela resistiu ao que era esperado de uma mulher negra no sul dos EUA nos anos após a emancipação", relatou Hannah, ainda segundo relatou o Independent. "Ela não se casou, por exemplo. Em vez disso, teve um relacionamento informal de décadas com um homem branco nascido na Alemanha, com quem teve 14 filhos."
Ainda que longe de seu país, Matilda decidiu manter-se o mais fiel à cultura de seu povo quanto podia. Ela “carregava as marcas faciais de um ritual tradicional na África”, por exemplo, sempre buscando honrar o conhecimento que sua mãe lhe passara sobre a identidade africana.
A ex-escravizada ainda buscou compensações na Justiça norte-americana pela violência que sofrera durante seus primeiros anos de vida. Apesar de não ter conseguido a indenização pelo qual exigiu, ajudou a chamar atenção para a questão.
Ela morreu aos 83 anos no Alabama, uma cidade muito ligada à luta antirracista por conta dos discursos e atos organizados na região por Martin Luther King.
Outro detalhe curioso da história de Matilda, revelado por uma reportagem da BBC, também de 2020, é que alguns de seus descendentes, como seu neto Johnny Crear, apenas descobriram sobre o passado escravizado da avó através do estudo de Hannah.
"Eu tive muitas emoções confusas. Pensei que se ela não tivesse passado pelo que aconteceu, eu não estaria aqui. Mas isso foi seguido por raiva. Desde o dia em que o primeiro africano foi trazido para este continente como escravo, tivemos que lutar pela liberdade", concluiu Johnny para o veículo.
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