Em 1996, a jovem libanesa Hasna, de 12 anos, checou o mundo ao chorar cristais. Mas como isso era possível?
Publicado em 17/06/2023, às 00h00 - Atualizado em 21/08/2023, às 09h48
Em 1996, a história de Hasna Mohamed Meselmani chocou o mundo. Com apenas 12 anos, a jovem libanesa passou a ficar conhecida internacionalmente como A Menina das Lágrimas de Cristal.
Certo dia, a Hasna teria começado a produzir cristais duros enquanto chorava. Logo os cacos foram se multiplicando e já havia se tornado comum a jovem expelir 7 cristais por dia de seus olhos. Mas o que explicaria aquele fenômeno?
Em 6 de outubro daquele ano, o Fantástico, da TV Globo, foi investigar o mistério de Hasna. O responsável pela reportagem foi o jornalista César Tralli, então correspondente da emissora em Londres, como destacado pelo Memória Globo. Ele teve companhia do repórter-cinematográfico Paulo Pimentel para relatar o mistério que intrigava a comunidade médica no Oriente Médio.
"Ao comando do pai, Hasna começou a chorar lágrimas de cristal. Eram pedaços que se assemelhavam a vidro picado e que de repente começavam a pingar dos olhos. Ora do direito, ora do esquerdo. E em sequência. Várias vezes", aponta a reportagem.
A história que havia colocado o Vale do Bekaa, no Líbano — perto da fronteira com a Síria —, nos radares jornalísticos mundiais chamava a atenção pela simplicidade de sua jovem.
Franzina, Hasna Mohamed era dona de uma simpatia única, mas também mostrava certa timidez. O pai da garota, Mohamed Meselmani, relatou que havia tentado blindar a filha da imprensa mundial, para preservá-la e não assustá-la. Os casos teriam começado há seis meses.
Pouco tempo após a equipe jornalística da Globo chegar à residência da jovem, a surpresa começou: Hasna havia expelido o primeiro cristal de seus olhos. O fato era tão único e surreal.
Incrédulo, Tralli pegou o cristal em sua mão e usou o caco para cortar o pedaço de uma folha. "Impressionante. É inacreditável. É só vendo mesmo para poder crer", narrou o jornalista.
É idêntico a uma pedrinha de cristal. Tem o peso de uma pedra de cristal. É pontiagudo, super transparente. É duro. Incrível", descreveu enquanto apertava o cristal, que não quebrava, em seus dedos.
A jovem Hasna guardava cada pedra que havia expelido de seu olho, já possuindo uma coleção com mais de 50 delas — dos mais variados tamanhos e formatos. Para a libanesa, a explicação era simples: "É Deus".
Até aquele momento, o Instituto de Oftalmologia do Líbano havia confirmado que as pedras realmente eram cristais de rocha. Mas como aquilo era possível? Os cristais seriam um presente de Alá, reiterou o pai de Hasna.
Com o feito, a jovem libanesa havia mudado seu status dentro de casa: além de sua mãe permitir que a jovem abandonasse os estudos, ela também ganharia um quarto só para ela no imóvel da família — enquanto seus quatro irmãos continuariam a compartilhar a mesma cama.
Mas não demorou muito para que a farsa de Hasna aparecesse. No dia 8 de outubro de 1996, dois dias após a exibição do caso da garota no Fantástico, Ahmad al Kuhaimi, embaixador da Arábia Saudita no Líbano, revelou que Hasna sofria de problemas psicológicos
A jovem de 12 anos havia sido submetida a 17 exames médicos que duraram 35 horas no American University of Beirut Medical Center, o maior hospital do país. Descobriu-se que a libanesa escondia deliberadamente pedaços de vidro nos olhos.
Segundo a psicóloga Randa Haddad, ela ocultava os pedaços de vidro atrás do olho "para chamar a atenção da família". Haddad ainda apontou que o caso não aconteceria se Hasna fosse "emocionalmente equilibrada".
Já o oftalmologista Samir Salomão explicou como a 'trapaça' era possível. De acordo com o profissional, entrevistado pelo Fantástico em matéria exibida no final de semana seguinte, dia 13, existem muitas cavidades em volta do olho. Em especial na "pálpebra inferior".
Constrangido por toda a situação, Mohamed Meselmani mostrou um comportamento totalmente diferente quando foi confrontado pela equipe jornalística brasileira. Antes solícito e caloroso, o pai de Hasna se mostrou irritado quando questionado se sabia da farsa.
A equipe médica que havia analisado a jovem alegou que ela deveria ter recebido a ajuda de algum familiar. As suspeitas recaíram sob Mohamed por ele ser o único permitido a tocar nos olhos da filha e era também quem estava sempre ao seu lado.
Conforme revelou na época, antes de ser desmascarado, Mohamed Meselmani alegou que os casos os cristais nos olhos da filha haviam começado há seis meses, quando um ele deixou um copo cair no chão e pediu para a jovem recolher os cacos.
Meselmani disse ter notado que os pedaços do copo haviam sumido e, no dia seguinte, a jovem passou a se queixar de dores no olho esquerdo. Desde aquela data, ela começou a expelir os cristais dos olhos.
Por fim, Mohamed Meselmani negou participação na farsa e também tentou esconder Hasna das câmeras jornalísticas. Ele só autorizou a jovem ser filmada de longe e sem a interação dos repórteres. O caso nunca mais foi comentado pela família.