Criticado por ativistas, advogadas e defensoras dos direitos das mulheres em todo o Brasil, o PL pode dificultar ainda mais o acesso ao aborto legal no país
Em dezembro de 2020, o senador cearense Eduardo Girão, do Podemos, propôs um novo Projeto de Lei que, através de algumas medidas, promete instituir o ‘Estatuto da Gestante’. Em março deste ano, o PL 5435/2020 entrou em tramitação no Senado.
Depois de algumas semanas no Plenário, o projeto, que ainda não foi votado, viralizou nas redes sociais. Isso porque, para diversas entidades que defendem os direitos das mulheres, o PL apresenta alguns artigos considerados bastante controversos.
A indignação gerou movimentos, que geraram hashtags, que, por sua vez, iniciaram diversos debates. No Twitter, conversas sobre a tag #GravidezForcadaÉTortura tomaram conta das postagens e o PL passou a ser conhecido como 'Bolsa Estupro'.
Logo no artigo primeiro do novo PL, Girão afirma que, caso seja aprovada, a lei irá dispor “sobre a proteção e direitos da gestante, pondo a salvo a vida da criança por nascer desde a concepção”. O problema é que isso dificulta ainda mais a luta por um aborto legalizado no país, sendo que o procedimento já é condicional na Constituição.
Atualmente, segundo a legislação brasileira, uma mulher só pode optar pelo aborto legal em três casos: quando a gestação coloca a vida da gestante em risco, quando a gravidez seja resultado de um estupro e quando o feto é anencéfalo.
Entre outras propostas, contudo, o texto do PL incentiva que até mesmo vítimas de estupro optem pela continuação da gravidez. Segundo o artigo terceiro do projeto, a mulher deverá receber um “suporte subsidiário que assegure o nascimento da criança concebida”, mesmo que a gestação seja resultado de uma violência sexual.
Para advogadas, ativistas e defensoras do direito das mulheres em todo o país, contudo, existem outros artigos do PL que devem ser discutidos. Um deles é o artigo nono, que afirma que o “genitor é co-responsável com a genitora quanto a salvaguarda da vida, saúde e dignidade da criança por nascer, não podendo dessa se eximir”.
Em resumo, o artigo sugere que a mulher deve tomar todas as decisões sobre a gravidez em parceria com o pai da criança, até mesmo em casos de violência sexual. Se a gestante quiser optar pela adoção, por exemplo, terá de ser em acordo com o homem.
Em entrevista ao Universa, a antropóloga Débora Diniz pontua que, nesse caso, “o projeto transforma a vítima de violência sexual em gestante e o estuprador em pai, dando a ele direitos a respeito da vida da vítima”, como supõe o próprio artigo nono.
Falando em adoção, o PL de Girão ainda aborda o tema em seu artigo quinto. Tal texto afirma que a mulher vítima de estupro terá seu direito de optar pela adoção resguardado “pelo SUS junto as demais entidades do Estado e da sociedade civil”.
O problema é que, assim como outros parágrafos do PL, ele sugere que a mulher que foi estuprada leve a gravidez adiante, mesmo que ela tenha sido resultado de um grande trauma. Nesse sentido, o artigo também dificulta o acesso ao aborto legal.
Agora, então, aqueles que desaprovam o PL esperam que o texto do projeto seja modificado por Simone Tibet (MDB-MS), a relatora do texto. Após a polêmica causada pela proposta, inclusive, a senadora afirmou que irá remover tanto o Artigo 11º — que prevê o auxílio financeiro —, quando a restrição ao aborto legal do Projeto de Lei.
Realizada no site do Senado, uma enquete de opinião pública mostra que o PL não agradou a massacrante maioria das pessoas. Até a última quarta-feira, 24, mais de 245 mil civis votaram pela reprovação do projeto, enquanto apenas 8 mil foram a seu favor.
Para Débora Diniz, ainda em entrevista ao Universa, as problemáticas do PL são muito mais complexas do que parecem. Nesse sentido, a antropóloga afirma que o projeto de Girão pode colocar a vida de milhares de meninas em risco.
Considerando que, segundo o Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos, o Brasil registra um estupro de garotas de até 14 anos a cada duas horas, impedir o acesso ao aborto para essas meninas é “impor a elas a condição de gestantes”.
Em nota enviada ao Universa após ser questionado pelo veículo, o senador Eduardo Girão justificou sua proposta. Além de afirmar que o texto será mesmo modificado por Simone Tibet, o político explicou que o foco do PL é “a proteção integral da gestante”.
“Considero importante esclarecer que o artigo 11º aumentava a penalização do estuprador”, escreveu o senador. “Os demais artigos reforçam as políticas públicas de saúde em favor da gestante e ampliam o nível da responsabilidade paterna.”
Para Isabela Del Monde, que é advogada especialista em direitos da mulher e colunista de Universa, contudo, o PL “diz que nem os poucos direitos reprodutivos já previstos por lei as mulheres poderão exercer". Resta saber, então, qual será a decisão do Senado.
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