Em entrevista ao site Aventuras na História, a ativista dos direitos humanos falou sobre sua trajetória, lutas e expectativas para o futuro
Nascida em 2 de março de 2002, em Zabid, no Iêmen, Nada al-Ahdal sentiu na pele como é vivenciar um grande problema enfrentado em seu país: o casamento infantil. Contudo, seu caminho foi diferente das inúmeras crianças que crescem na mesma situação, já que Nada conseguiu escapar desse infortúnio — o que nem sempre condiz com a realidade desses jovens.
Com o auxílio das redes sociais, a fim de que sua história não se repetisse, a jovem passou a expor esse crime voltando à atenção da mídia para causa. Atualmente, aos 18 anos, al-Ahdal é uma ativista dos direitos humanos, principalmente das crianças e mulheres e fundadora de uma ONG. Em entrevista ao site Aventuras na História, Nada falou sobre seu passado e suas esperanças para o futuro.
No ano de 2013, quando estava prestes a completar 11 anos de idade, a iemenita acordou com notícia de que teria sido vendida pelos próprios pais para se casar com um homem mais velho e rico. De acordo com Nada, essa prática criminosa, infelizmente, é comum no Iêmen, e o mesmo aconteceu alguns anos antes com sua irmã.
“O casamento infantil no Iêmen é muito difundido e uma das graves violações dos direitos das meninas, isso aumentou depois da guerra, porque as sociedades iemenitas não têm mais retorno financeiro e seus salários estatais foram cortados, a maioria as escolas pararam e a taxa de analfabetismo, ignorância e subdesenvolvimento aumentou, levando os pais a venderem suas filhas sob o pretexto de casamento infantil”, explicou al-Ahdal em entrevista de 2020.
Na época, o tio da garota, Abdel Salam al-Ahdal, temendo que fosse perder outra sobrinha, resolveu intervir e ajudá-la. “Eu não poderia permitir que ela se casasse e tivesse o futuro destruído”, conta Abdel. Na ocasião, Nada fugiu de casa e passou a viver com seu tio. Com isso, o 'pretendente' — 16 anos mais velho que a criança — desistiu da venda. O valor acordado foi de 2 mil dólares.
Contudo, não demorou muito para que o pesadelo continuasse e seus pais organizassem novamente um acordo de casamento. Na tentativa de escapar, a menina precisava agir rápido, por isso, usou a internet para expor sua história: “Eu tive que fugir de qualquer maneira, e gravei um vídeo em que apelo ao mundo para que me ajude e me salve do casamento”, disse al-Ahdal.
O vídeo foi postado em árabe, mas, logo ganhou legendas em inglês. Em três dias, a filmagem que a garota publicou no Youtube já tinha mais de sete milhões de visualizações. A partir desse momento, uma virada tomou conta da vida da iemenita.
Depois de viralizar e chamar a atenção para a causa, a jovem garota conseguiu influenciar uma conferência de diálogo nacional no Iêmen para aprovar e aplicar uma lei que criminaliza o casamento de menores de 18 anos.
Contudo, o caminho não foi fácil e continua sendo uma constante luta para a ativista. Enquanto a mídia internacional demonstrava apoio, os meios de comunicação de seu país a acusavam de fraude aos costumes iemenitas e islâmicos. A menina conta que chegou a ser ameaçada de morte.
Vencendo os obstáculos, ela continua determinada na causa: “O destino de milhares de meninas no Iêmen está em uma situação muito perigosa e esperamos que as organizações internacionais reembolsem as organizações locais e aloquem parte de seus programas para ajudar as meninas”, nos conta Nada.
Atualmente, a jovem vive na Inglaterra para se proteger de possíveis ataques: “Eu me sinto parcialmente segura porque estou longe, mas, grupos extremistas podem ter como alvo qualquer pessoa em qualquer país [...] eles acham que minha consciência contínua da sociedade sobre a liberdade das mulheres seja uma corrupção para a sociedade, então eles estão me atacando e tentando distorcer minha imagem na frente da mídia, compartilhando ameaças de violência e ódio contra mim e todos que exigem a liberdade das mulheres, mas, minha fé é maior do que o medo deles e vou continuar porque as meninas precisam da minha voz”, afirma al-Ahdal.
Exatamente por esse motivo, a ativista criou a fundação Nada Foundation for the Protection of Children’s Rights. De acordo com a própria fundadora, trata-se de uma organização sem fins lucrativos para implementar projetos e programas de conscientização e ajudar meninas a completarem sua educação. “Nosso objetivo é fornecer lares seguros para meninas, protegê-las da violência doméstica e prevenir o casamento infantil”, conta a jovem.
O futuro
Depois de lançar um livro sobre sua história e ser indicada para o prêmio Nobel das crianças em 2018-2019, a garota de 18 anos tem muitos planos para alcançar. Ela acredita que é somente através da conscientização, que a situação irá mudar em seu país de origem.
“Se a conscientização continuar na mídia, as convicções da sociedade mudarão, e quando a guerra no Iêmen acabar será fácil fazer o Estado cumprir as leis, ativar o papel de monitoramento da comunidade e melhorar as condições das meninas”. Até lá, Nada afirma que não irá desistir.
A menina tem esperança de que as coisas melhorem no Iêmen, mas, sabe que para isso, muita coisa deve ser feita: "Espero terminar meus estudos universitários em direito internacional, e buscar mudar os sistemas dos países árabes que não respeitam os direitos das meninas, os direitos das crianças e não dão atenção aos cidadãos".
"As guerras no mundo que usam a religião e Deus devem ser interrompidas, porque são guerras políticas e apenas pelos interesses dos países. As sociedades são enganadas e seus corações bondosos e sua fé em Deus são explorados por interesses políticos. Estamos, portanto, perdendo muitas pessoas e vítimas inocentes, pessoas morrem e o terrorismo e a violência se espalham nas sociedades”, conclui Nada al-Ahdal.