Os militares participaram discretamente da história do Brasil até o fim do século 19. Foi quando inauguraram nossa República e se destacaram nas crises políticas do país
Textos Márcio Sampaio de Castro Publicado em 25/02/2013, às 00h00 - Atualizado em 23/10/2017, às 16h36
Até o final da Guerra do Paraguai, em 1870, não valia a pena ser militar no Brasil. Desde 1823, quando foram criados o Exército e a Marinha, ir para lá era um castigo reservado para as pessoas pobres acusadas de delinqüência ou vadiagem. Mas o conflito no país vizinho forçou o Império a criar um exército de verdade. Mais do que isso, criou verdadeiros heróis, como o comandante das tropas brasileiras, Luís Alves de Lima e Silva, o Duque de Caxias. Ou o marechal Deodoro da Fonseca.
Quando voltaram da guerra, esses homens vencedores queriam mais poder. A oportunidade apareceu em 1889, quando dom Pedro II vivia uma grave crise de impopularidade. Na manhã de 14 de novembro, surgiu o boato de que Deodoro da Fonseca tinha sido preso por desobedecer a uma ordem do primeiro-ministro, o visconde de Ouro Preto. Era mentira, mas o próprio marechal se aproveitou dela para organizar um movimento contra Ouro Preto. Enquanto ele conseguia a demissão de seu inimigo, um grupo de conspiradores corria para escrever uma declaração dizendo que o Brasil não era mais um império. Meio que sem querer, Deodoro se tornou o líder desse movimento e o primeiro presidente da República. Foi o primeiro golpe militar de nossa história.
Logo Deodoro renunciou e passou a bola para seu vice, o marechal Floriano Peixoto. Ele completou o mandato. Em 1894, quando passou o cargo para Prudente de Morais, o primeiro presidente civil, Floriano nem apareceu. Ficou em casa, de chinelos, regando o jardim. Enquanto a República caminhava, agora nas mãos de ricos fazendeiros de São Paulo e Minas Gerais, os militares se dividiam em dois grupos. Uma elite, experiente, ficava com os trabalhos burocráticos. Os jovens oficiais é que faziam o trabalho pesado. Em 1913, eles se organizaram e criaram o movimento do tenentismo. Os tenentistas fizeram muito barulho. Em 1922, tomaram o forte de Copacabana, no Rio de Janeiro. Praticamente todos foram mortos. Dois anos depois, quase tomaram São Paulo. No Rio Grande do Sul, outro tenentista, Luís Carlos Prestes, formou um grande grupo que atravessou o Brasil em busca de seguidores. A Coluna Prestes acabou na Bolívia, em 1927.
Em 1930, finalmente esses jovens militares, já não tão jovens assim, mudaram de novo os rumos do Brasil. Júlio Prestes foi eleito presidente em março, mas as suspeites de fraudes eram tão grandes que os tenentistas ajudaram a formar uma conspiração que derrubou o presidente Washington Luís antes que ele transmitisse o cargo. Quem assumiu foi o derrotado nas eleições, um gaúcho chamado Getúlio Vargas.
Com Getúlio, os militares sossegaram um pouco. Mas eles ainda seriam cruciais em 1945, 1951, 1954, 1961... e, é claro, 1964, quando voltaram ao poder com toda a força. Dessa vez eles não ficaram poucos anos, como Deodoro e Floriano tinham feito. Eles só largariam o osso em 1984, depois de 20 anos.
1889: a República não Esperou o Amanhecer, Hélio Silva, Civilização Brasileira, 1972. Reconstrução dos bastidores do movimento que fazia a proclamação da República
As Ilusões Armadas - A Ditadura Envergonhada, Élio Gaspari, Companhia das Letras, 2002. É o primeiro de quatro livros que fazem uma radiografia profunda dos bastidores do regime militar brasileiro