Em Amistad, uma história marcante na caminhada americana para o fim da escravidão
O inspirado discurso de um ex-presidente americano, na época congressista, é o ponto alto de uma série de julgamentos que ocupam grande parte de Amistad, filme de 1997 em que Steven Spielberg expõe algumas das cicatrizes da escravidão. O ano é 1841 e o ex-presidente em questão é John Quincy Adams, conhecido como Old Man Eloquent (“velho eloqüente”) justamente por seus discursos contra o regime escravocrata. Foi assim que Adams (Anthony Hopkins) convenceu a Suprema Corte americana – na qual sete dos nove juízes eram donos de escravos – a libertar 53 africanos acusados de insurreição e assassinato.
Baseado num fato real, o filme conta a história do africano Cinque (Djimon Hounsou), que vivia com sua mulher e três filhos em Serra Leoa, plantando arroz, quando foi capturado, em 1839. Sua travessia no navio negreiro La Amistad rende cenas chocantes, como no momento em que Cinque lidera outros 52 africanos num massacre brutal aos brancos – exceto dois espanhóis, que ficam para guiar o barco e que depois reclamam, no tribunal, a posse dos escravos.
No julgamento, um advogado imobiliário os defende baseado em uma lei internacional que proibia a aquisição de novos escravos. No longa, os 53 réus têm que passar por dois julgamentos para serem libertados. No primeiro, deparam com a mudança do juiz, a pedido do então presidente Martin van Buren (Nigel Hawthorne), que não queria desagradar os eleitores do sul escravista. Na realidade, a troca não aconteceu. Outra licença do filme é a inclusão de Theodore Joadson, abolicionista negro interpretado por Morgan Freeman, que nunca existiu.
Os julgamentos, porém, foram reais, assim como o interesse do presidente em condenar os réus. No fim, eles foram libertados e voltaram à terra natal. A aldeia de Cinque havia sido destruída por uma guerra civil e sua mulher e filhos nunca foram encontrados. Pouco se sabe sobre sua vida. Há boatos, pouco confiáveis, de que se tornou mercador de escravos. O que é certo é que Cinque triunfou sobre o preconceito na corte americana, mas não sobre o destino duro dos africanos.