Desenhos encontrados em livro de 1300 anos - Divulgação/Archiox/Bodleian Library
Livro

Os enigmáticos rabiscos descobertos em cópia dos Atos dos Apóstolos de 1300 anos

Livro com rabiscos ocultos teria pertencido a uma mulher — provavelmente uma freira

Giovanna Gomes Publicado em 31/03/2023, às 12h44 - Atualizado em 26/04/2023, às 17h50

Há cerca de 1.300 anos, uma mulher utilizou um livro religioso para rabiscar letras e desenhos em suas margens, arranhando o papel em vez de utilizar tinta. Até o ano passado, no entanto, esses rabiscos eram invisíveis a olho nu. Foi graças a uma nova tecnologia de formação de imagens da Biblioteca Bodleiana, em Oxford, que eles puderam ser revelados.

A obra é uma cópia dos Atos dos Apóstolos datada do século 8º e teria pertencido a uma mulher, conforme acreditam os pesquisadores, embora eles não tenham certeza de quem, de fato, seria a dona do objeto.

A descoberta

A pesquisadora Jessica Hodgkinson, da Universidade de Leicester, examinou o livro mais de perto no ano de 2022 e notou a presença de um rabisco escondido na página 18, logo abaixo do texto em latim. Os traços foram digitalmente destacados, revelando a seguinte inscrição: "EaDBURG BIREð CǷ…N". Eadburg, segundo os pesquisadores, seria quase certamente o nome da dona do livro.

As letras seguintes, contudo, são um pouco mais enigmáticas e podem significar "está na cwærtern", que em inglês arcaico significa "prisão". Como o trecho em latim descreve a prisão dos apóstolos, é possível que Eadburg tenha feito um paralelo com sua própria situação ao fazer o rabisco.

Possível freira

De acordo com o portal BBC, Hodgkinson e sua equipe suspeitam que Eadburg era uma freira, a abadessa de uma comunidade religiosa localizada em Minster-in-Thanet, no condado de Kent, na Inglaterra.

Além dos rabiscos nas margens, desenhos de pessoas foram encontrados em outras páginas, incluindo uma figura quadrada com os braços estirados e uma pessoa estendendo sua mão contra o rosto de um companheiro triste, cujos significados ainda são um mistério.

Inscrição com o nome "Eadburg" / Crédito: Divulgação/Archiox/Bodleian Library/

"A superfície traz consigo uma imensa quantidade de informações", diz Adam Lowe, fundador da Fundação Factum em Madri, na Espanha, à BBC. A organização sem fins lucrativos foi responsável por produzir a tecnologia para a biblioteca de Oxford, como parte do projeto Archiox (sigla em inglês para Análise e Registro do Patrimônio Cultural em Oxford).

Método

Os pesquisadores do projeto Archiox utilizam-se de dois aparelhos para criarem representações digitais de páginas e objetos. Um deles se chama "Selene" e conta com quatro câmeras capazes de capturar diferenças de relevo das superfícies de até 25 micrômetros (0,025 mm). Já o outro é "Lucida", que emite lasers e possui duas câmeras bem pequenas para criar varreduras 3D.

Tudo pode ser medido. Não é apenas uma ferramenta de formação de imagens, é também um instrumento de medição. E isso torna tudo mais fascinante", aponta John Barrett, fotógrafo da Biblioteca Bodleiana e líder técnico do projeto Archiox.

A Biblioteca Bodleiana está utilizando essa tecnologia para criar representações digitais de diversos itens da sua coleção, e o livro de Eadburg não foi o único documento com séculos de idade a revelar rabiscos escondidos.

Em um manuscrito do século 9º, por exemplo, os pesquisadores do projeto Archiox mapearam uma cena de caça arranhada na sua superfície, com a palavra "RODA" escrita abaixo dos animais, provavelmente relacionada ao dono do livro. De acordo com Barrett, essa descoberta nunca havia sido observada antes.

Cena de caçada encontrada em livro / Crédito: Divulgação/Archiox/Bodleian Library/

Hipóteses

As figuras e desenhos nas margens dos livros podem ter sido adicionados por uma variedade de razões. A principal das hipóteses, porém, é a de que elas tenham sido acrescentadas simplesmente com a intenção mostrar quem era o dono da obra.

Estes manuscritos eram considerados sagrados. E, mesmo que quisesse deixar sua marca neles, você não iria querer ser óbvio demais", explica Barrett.

Quanto às figuras o fotógrafo não acredita que elas "tenham sido necessariamente rabiscadas de propósito".

Muitas vezes, essas anotações e certamente outras que registrei mais recentemente tinham, sem dúvida, relação com o próprio texto."

Novas Descobertas

Para Lowe, "as pessoas estão começando a perceber que as 'informações sobre o relevo' estão transformando o nosso conhecimento". Por esse motivo, ele sugere que a nova abordagem poderá possibilitar diversas outras descobertas no futuro. "Deve haver objetos nas bibliotecas de todo o mundo que podem se beneficiar dessa tecnologia... é questão de tratar os objetos materiais como evidências" apontou.

Existem muitas coisas que sabemos, mas existem também muitas outras que podem ser descobertas. E acho que este é um pensamento incrivelmente estimulante e inspirador", conclui ele.
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