Estudo sugere que cada um de nós tem, no mínimo, uma pessoa idêntica à nossa aparência em algum lugar do mundo; entenda!
Em algumas ocasiões, quando Charlie Chasen e Michael Malone estão sozinhos em Atlanta, as pessoas costumam confundi-los. Embora sejam amigos de longa data e vivam na mesma cidade, eles não são parentes, e suas famílias têm origens bem distintas.
A família de Malone vem das Bahamas e da República Dominicana, enquanto a de Chasen é da Escócia e da Lituânia. Não há nenhum segredo de família que explique essa semelhança, mas os dois se parecem muito.
Não se trata apenas dos cabelos castanhos, das barbas e dos óculos. As semelhanças também estão na estrutura do nariz, nas maçãs do rosto e no formato dos lábios.
“Michael e eu nos conhecemos há muito tempo e tem sido uma fonte de muita diversão para nós, porque ao longo dos anos fomos confundidos um com o outro em todos os lugares em Atlanta”, comentou Chasen em entrevista a Don Lemon, da CNN, em 2022. “Houve algumas situações realmente interessantes que surgiram apenas porque as pessoas pensavam que éramos a outra pessoa.”
Tamanha é a semelhança entre os dois que até mesmo softwares de reconhecimento facial têm dificuldade em distingui-los, como se fossem gêmeos idênticos.
Porém, os cientistas acreditam podem explicar o que os torna tão parecidos e, ao mesmo tempo, revelar o que nos leva a ter um “duplicado”, uma pessoa que se parece conosco.
Um estudo divulgado em 2022 sugere que, para aqueles que têm semelhanças físicas, mesmo sem serem parentes diretos, há uma base genética comum.
Segundo o estudo, indivíduos que compartilham semelhanças físicas também apresentam padrões semelhantes em fatores como peso, estilo de vida e comportamentos, como o uso de tabaco e os níveis de educação.
Isso sugere que a variação genética não apenas influencia a aparência física, mas também pode afetar hábitos e comportamentos.
A questão de como surgem os sósias, se é por genética ou influência ambiental, chama atenção dos cientistas. Para tentar descobrir a resposta, uma equipe de pesquisadores espanhóis conduziu um estudo que foi publicado na revista Cell Reports.
Manel Esteller, pesquisador do Instituto Josep Carreras de Pesquisa em Leucemia de Barcelona, comentou sobre a pesquisa, explicando que, embora tenha trabalhado em estudos sobre gêmeos no passado, este projeto foi focado em pessoas que se parecem muito, mas não têm uma conexão familiar direta.
Esteller recorreu à arte para responder a uma questão científica, colaborando com o artista canadense François Brunelle, que fez o projeto fotográfico “Não sou dublê!”, que registrou 32 duplas de sósias.
Os pesquisadores pediram aos participantes que fizessem testes de DNA, preenchessem questionários sobre suas vidas e também submeteram suas imagens a três programas de reconhecimento facial.
Os resultados foram interessantes: 16 duplas de sósias tiveram pontuações semelhantes às de gêmeos idênticos no software, enquanto os outros 16 pares foram classificados de maneira diferente. Ao analisar os DNAs, foi descoberto que os casais que foram considerados mais parecidos pelo reconhecimento facial tinham muitos mais genes em comum do que os outros.
Conseguimos ver que esses humanos parecidos, de fato, compartilham várias variantes genéticas. E estas são muito comuns entre eles”, explicou Esteller. “Então, eles compartilham essas variantes genéticas que estão relacionadas à forma como eles têm o formato do nariz, olhos, boca, lábios e até estrutura óssea. E essa foi a principal conclusão de que a genética os une.”
Ele acrescenta que a explicação para isso está nos “códigos semelhantes”, mas ressalta que é apenas uma coincidência. “No mundo de hoje, há tantas pessoas que o sistema está produzindo humanos com sequências de DNA semelhantes”, disse.
“Provavelmente sempre foi assim, mas agora, com a internet, é muito mais fácil encontrá-los.” Esteller ainda destaca que, ao investigar as semelhanças, foram encontradas diferenças, o que explica por que essas pessoas não são exatamente idênticas.
Quando os cientistas examinaram mais profundamente o que chamaram de epigenomas dos sósias, encontraram ainda mais diferenças. A epigenética estuda como o ambiente e o comportamento podem influenciar a atividade dos genes.
Os pesquisadores também observaram o microbioma de cada um, que são os microrganismos, vírus, bactérias e fungos que habitam o corpo humano. Embora o estudo tenha mostrado diferenças no microbioma entre os sósias mais parecidos, ele revelou algo interessante:
"Esses resultados não apenas fornecem informações sobre a genética que determina nosso rosto, mas também podem ter implicações para o estabelecimento de outras propriedades antropométricas humanas e até características de personalidade", indicou o estudo.
Contudo, o estudo possui limitações. O tamanho da amostra foi pequeno, o que torna difícil afirmar que esses resultados são aplicáveis a um grupo maior. Além disso, como o estudo se concentrou em indivíduos de origem europeia, não está claro se os resultados seriam os mesmos em pessoas de outras partes do mundo.
Karen Gripp, pediatra e geneticista da Nemours Children’s Health, que teve seu trabalho referenciado no estudo, considera os achados “realmente interessantes” e destaca que valida muitas pesquisas anteriores. Ela utiliza software de análise facial em seu trabalho clínico para avaliar as características faciais de pacientes com condições genéticas.
“É um pouco diferente do estudo, mas realmente aponta na mesma direção que as mudanças no material genético de uma pessoa afetam as estruturas faciais, e essa é realmente a mesma suposição subjacente que foi usada neste estudo como de fato confirmada”, afirmou Gripp.
Em relação à questão da natureza versus criação, Gripp acredita que ambos os fatores têm grande importância.
“Como geneticista, acredito firmemente que a natureza e o material genético são muito importantes para quase tudo, mas isso não significa que a educação não seja tão importante quanto”, comentou. “Para que cada pessoa seja bem-sucedida no mundo, há tantos fatores que contribuem, e o meio ambiente é tão importante que não acho que seja um ou outro.”
O estudo também tocou na precisão do software de reconhecimento facial, que ainda apresenta limitações.
Apesar de muitos órgãos públicos, como algumas agências federais e aeroportos, utilizarem essa tecnologia, Gripp alerta para a possibilidade de erros, especialmente em relação à identificação de pessoas negras, como demonstram estudos anteriores que mostraram detenção injusta de homens negros devido a falhas no reconhecimento facial.
"Se você pensar em software de reconhecimento facial que geralmente desbloqueia telas de computador e coisas assim, a identificação incorreta é possível. Então, acho que isso também nos ensinou algo muito importante sobre ferramentas de análise facial", diz Gripp.
No entanto, o estudo sugere que, pelo menos fisicamente, pode ser que não sejamos tão únicos. “Acho que todos nós temos alguém que se parece conosco agora, um sósia”, afirma Esteller.