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Matérias / Brasil

Na Semana de 22, artistas enfrentaram vaias e ruídos diversos, misturados a aplausos

Os vanguardistas foram descritos pela mídia como 'subversores da arte', 'espíritos cretinos e débeis' e 'futuristas endiabrados'

Raphaela de Campos Mello Publicado em 13/02/2022, às 06h00

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Cartaz da Semana de Arte Moderna de 1922 - Prefeitura de São Paulo, Brasil via Wikimedia Commons
Cartaz da Semana de Arte Moderna de 1922 - Prefeitura de São Paulo, Brasil via Wikimedia Commons

Na época da Semana Moderna de 1922, nem todos concordavam com sua proposta — mais propensa a causar estranhamento do que aprovação imediata. Em 13 de fevereiro de 1922, Graça Aranha inaugurou oficialmente o evento proferindo a palestra intitulada “A emoção estética da Arte Moderna”.

Dois dias depois, Menotti del Picchia, ao falar sobre a literatura dos novos tempos, enfrentou uma saraivada de vaias e ruídos diversos, entre eles, sons animalescos, misturados a aplausos.

E quando Ronald de Carvalho leu o poema intitulado "Os Sapos", de Manuel Bandeira, que critica abertamente os versos parnasianos feitos com métrica, o público atrapalhou a leitura do texto. O mesmo se repetiu durante as falas de Mário de Andrade e Oswald de Andrade. Já Anita Malfatti descobriu bilhetinhos ofensivos colados no verso de suas telas.

Mário de Andrade / Crédito: Wikimedia Commons

Em meio às acaloradas reações do público, chegou o dia 17 de fevereiro de 1922, data em que o maestro Heitor Villa-Lobos se apresentou junto com outros músicos. O clima para recebê-lo era respeitoso. Ele apareceu trajando casaca, mas com um pé calçado com um sapato, e o outro com chinelo. O que poderia ser mais indecoroso e provocador?

A leitura da cena pelos presentes desencadeou uma longa e impiedosa vaia. Mais tarde, contudo, o maestro explicaria que a escolha pelos calçados conflitantes não se tratava nem de modismo tampouco de achincalhe, e sim da necessidade de oferecer conforto a um calo inflamado ou, nas palavras do próprio músico, uma “bruta manifestação de ácido úrico”.

Anita Malfatti / Crédito: Anita Malfatti no Tempo e no Espaço via Wikimedia Commons

Boa parte da mídia rechaçou a Semana de Arte Moderna de 1922, referindo-se aos vanguardistas como “subversores da arte”, “espíritos cretinos e débeis” ou “futuristas endiabrados”.

À exceção do jornal Correio Paulistano, órgão oficial do Partido Republicano Paulista (PRP), com grande influência na política brasileira, que apoiou as inovações, assim como o prefeito Firminiano Pinto e o presidente do estado Washington Luís (ainda não se usava o termo “governador” naquele tempo).

Certamente, o festival não teria ocorrido sem o aporte financeiro da elite de São Paulo. Era o auge do período das oligarquias na República Velha e a alta burguesia paulistana tinha interesse em fazer da Pauliceia uma referência em criação cultural, posto ocupado pelo Rio de Janeiro, então capital federal, e sede de inúmeras instituições culturais conservadoras.

Um dos grandes mecenas da Semana de 22 foi Paulo Prado, proveniente de uma abastada família e dono de enorme fortuna ligada ao café e posteriormente a ferrovias, indústrias, bancos, negócios imobiliários, importação e exportação.

Inclusive, o embrião da Semana fora concebido numa reunião de artistas e intelectuais transcorrida em seu palacete no bairro de Higienópolis. Assim como Paulo Prado, outros endinheirados de seu círculo ajudaram a bancar o evento.

“Se a Semana de Arte Moderna foi o marco inicial da trajetória de institucionalização do modernismo como escola oficial no país, foi também um primeiro ponto de chegada para a maioria daqueles escritores e artistas", afirma Marcos Augusto Gonçalves no livro "1922: A Semana Que Não Terminou" (ed. Cia das Letras).

"Eles viam-se, enfim, convidados a brilhar na grande ribalta de São Paulo, que promovia, não por acaso no simbólico ano do Centenário da Independência, uma conveniente demonstração pública de arrojo e cosmopolitismo”, acrescenta.


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