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Matérias / Marianne Bachmeier

Marianne Bachmeier: A 'Mãe da Vingança' que matou o suspeito de assassinar a filha

Enquanto Klaus Grabowski estava sendo julgado pelo estupro e homicídio de Anna, de apenas 7 anos, Marianne Bachmeier não hesitou em entrar para o banco dos réus

Fabio Previdelli
por Fabio Previdelli
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Publicado em 09/02/2021, às 13h00 - Atualizado em 23/04/2024, às 15h41

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Imagem de Marianne Bachmeier - Reprodução/Video/Der Spiegel
Imagem de Marianne Bachmeier - Reprodução/Video/Der Spiegel

Em 6 de março de 1981, Klaus Grabowski, um açougueiro de 35 anos, enfrentou o terceiro dia de seu julgamento no Tribunal Distrital de Lübeck, antiga cidade da Alemanha Ocidental. Grabowski era acusado de estuprar e assassinarAnna Bachmeier, sua vizinha que tinha apenas 7 anos na época. O crime ocorreu em maio do ano anterior.

Naquele dia, o tribunal estava muito cheio, mas o público presente se viu obrigado a deixar o local após uma arma de fogo ser disparada por uma das pessoas que assistia de perto o episódio: Marianne Bachmeier, a mãe de Anna.

Seu objetivo de matar o homem que teria tirado a vida de sua filha foi claro e preciso. Dos oito disparos que a alemã efetuou, sete atingiram Grabowski, que morreu ainda no local.

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Pelo caso de vigilantismo, Marianne passou a ser apelidada de 'Mãe da Vingança'. A reviravolta do episódio passou a ser considerada pelos veículos locais como o "caso mais espetacular de justiça vigilante na história do pós-guerra alemão".

Após os disparos, então, o julgamento recomeçou, mas desta vez com outra pessoa sentada no banco do réu: Marianne que passou a responder por assassinato.

Uma vida de intempéries

Nascida no dia 3 de junho de 1950, Marianne Bachmeier foi criada em Sarstedt, uma pequena cidade perto de Hildesheim na Baixa Saxônia, na Alemanha Ocidental — onde seus pais fugiram da Prússia Oriental após a Segunda Guerra Mundial.

Segundo um artigo publicado pelo Journal of Experimental Criminology, Marianne havia tido uma infância miserável, sendo criada em um lar conservador e devotamente religioso com uma pai que havia sido membro da Waffen-SS.

Para agravar a situação, Bachmeier era alvo de severas humilhações e estupros, descreve a DW, de uma figura paternal alcoólatra e agressiva. Seus pais se divorciaram ainda quando Marianne era uma adolescente, visto como problemática por seu padrasto ditatorial — em suas palavras.

Por tal desentendimento com o novo marido de sua mãe, ela acabou sendo expulsa de casa. Em 1966, aos 16 anos, ela teve seu primeiro filho, que colocou para adoção ainda quando bebê, ainda conforme o Journal of Experimental Criminology.

Dois anos depois, ela engravidou novamente de seu namorado, que a estuprou, aponta o OkBliss. O fruto da relação teve o mesmo destino que o primeiro filho da mulher — que engravidou novamente aos 22 anos.

Anna nasceu em 14 de novembro de 1972, sendo criada apenas por Bachmeier, que constantemente levava sua filha para o pub onde trabalhava. Em dois documentários de 1984, No Time for Tears: The Bachmeier Case e Anna's Mother, a mulher é descrita como uma mãe solo que trabalhava até tarde da noite enquanto cuidava de sua filha.

Durante o dia, ela dormia e deixava sua filha de sete anos sozinha. Ciente que seu estilo de vida era totalmente problemático, Marianne também pensava em colocar Anna para adoção. Até que o pior aconteceu!

A morte de Anna, um assassinato brutal

A última vez que Anna foi vista com vida aconteceu no dia 5 de maio de 1980. Após uma briga com a mãe, a criança decidiu não ir à escola e optou buscar refúgio na casa de um amigo.

Foi então que Klaus Grabowski teria sequestrado e levado a menina para sua residência, onde estuprou e estrangulou a vítima. O Corpo da jovem só foi encontrado horas depois, dentro de uma caixa de papelão na margem de um canal, repercutiu o Der Spiegel.

O crime só foi descoberto através da denúncia feita pela noiva de Grabowski, que foi capturado pela polícia alemã rapidamente. Logo depois, a perícia criminal revelou que Anna havia sido estrangulada por uma meia calça de sua companheira.

Klaus Grabowski/ Crédito: Reprodução/Video

Com o crime que escandalizou Lübeck, o antepassado criminal de Klaus Grabowski foi revisitado: ele já havia sido condenado anos antes por abuso sexual infantil. Em 1976, diz o Der Spiegel, o homem havia sido castrado quimicamente após ter molestado duas meninas — desde então, passava por uma terapia hormonal.

Morto durante o julgamento

Embora os primeiros passos do processo para condenar Grabowski por assassinato tivessem evoluído rapidamente, seu julgamento só começou em um ano depois, em 3 de março de 1981. Aquela altura, o caso tinha recebido um espaço comum na mídia, reservado para crimes locais.

Foi só apenas quando Marianne entrou fatalmente na história que a situação ganhou proporções gigantescas. Durante seu tempo na corte, a principal linha de defesa utilizada por Klaus foi a de que Anna teria o chantageado para receber dinheiro.

Segundo o criminoso, a criança de apenas 7 anos afirmou que o acusaria de abuso sexual caso ele não lhe desse uma quantia satisfatória, afirma o All That Interesting. Klaus apontou que o medo de volta para a prisão o levou a cometer o crime bárbaro.

A história afetou profundamente Marianne, que não suportava ver as mentiras sobre sua filha ganharem as páginas dos jornais. De acordo com a mulher, Anna jamais teria feito qualquer ameaça, descrevendo-a como "uma criança feliz e de mente aberta".

Apesar dos esforços, as autoridades não conseguiram definir se o vizinho teria abusado sexualmente de sua vítima antes de sufocá-la. Todavia, as condenações anteriores seriam o suficiente para que o caso terminasse com uma sentença severa para Grabowski.

Mas Marianne não se satisfaria apenas com a pena que seria dada pelo tribunal. Portando uma pistola semiautomática Beretta M1934, a mãe de Anna alvejou o homem que tanto odiava. Era o fim de um assassino cruel, morto pelas mãos da mulher que ele mais atormentou.

A 'Mãe da Vingança'

Ninguém esperava pelo assassinato planejado pela alemã. Em profundo luto, testemunhas afirmaram ter ouvido Marianne chamar Klaus de "porco", após vê-lo caído no chão da corte. Para a polícia, ela contou que já não aguentava mais ouvir mentiras sobre sua tão amada filha e precisava agir de alguma forma.

Um suposto depoimento que circulou na mídia alemã apresentava a confissão de Bachmeier: "Ele matou minha filha... Eu queria atirar nele no rosto, mas atirei nas costas dele... Espero que ele esteja morto".

Para comprovar a autenticidade do documento, especialistas pediram para que a mãe escrevesse em um pedaço de papel qualquer frase, a qual ela redigiu: "Fiz isso por você, Anna". As palavras foram seguidas pelo desenho de sete corações, possivelmente representando os anos de vida de sua filha.

A última lembrança de Marianne, antes de tomar a decisão que mudou o rumo do processo, foi o pedido de Klaus para fazer mais uma declaração. "Eu pensei, agora vem a próxima mentira sobre essa vítima que era minha filha".

Eu não queria ir para o julgamento. Eu teria de depor sobre o caráter de minha filha. Fui ameaçada até de aplicação de medidas disciplinares no caso de ausência, o que era uma provocação. Ninguém deveria se surpreender com o que aconteceu", continuou a mulher, conforme repercutido pelo DW.

O caso e suas peculiaridades passaram a serem cobertos à exaustão por jornais, revistas e programas de televisão. A revista alemã Stern, por exemplo, teria dado dinheiro para Marianne bancar suas despesas legais em troca de escrever uma biografia de Bachmeier em 13 capítulos. Dois filmes sobre a mulher também foram planejados.

Sociedade dividida

Embora o julgamento estivesse nas mãos da Justiça, entre a população do país, a sentença era um dilema a ser debatido. Em 2 de novembro de 1982, Bachmeier foi inicialmente acusada de homicídio doloso.

Mais tarde, porém, a promotoria retirou a acusação e, após 28 dias de negociações, o conselho concordou com o veredito: ela foi condenada em 2 de março de 1983 pela Câmara do Tribunal Distrital de Lübeck por homicídio culposo e posse ilegal de arma de fogo, sendo condenada a seis anos de prisão.

"Não se pode tratar homicídio culposo e doloso da mesma maneira, pois isso faria de todo soldado um assassino. Para mim o 'como' é muito importante. Eu tive que ouvir quando o assassino de minha filha descreveu a forma como ele a matou. Apertou o pano ao redor do seu pescoço cada vez mais forte. Aí eu atirei", disse Bachmeier, escreveu a DW.

Quando foi anunciada a pena, a sociedade se dividiu. Uma pesquisa do Instituto Allensbach, na época, revelou que 27% dos alemães julgaram a pena como muito pesada; 25% consideraram muito leve; e, ainda, 28% do povo aceitou a sentença como apropriada.

Só recebi cartas de apoio, regularmente chegava correspondência de fãs. As pessoas tiveram muita compreensão comigo", afirmou.

Uma nova vida

Marianne Bachmeier, no entanto, só cumpriu cerca de metade da pena, sendo liberta em meados de 1985. Para reconstruir sua vida, a alemã se mudou para a Nigéria. Ela buscou deixar sua cidade por não suportar viver no local onde tudo aconteceu.

Para mim, é uma cidade de assassinos. Lübeck pode ser muito bonita, mas para mim está muito ligada a todo esse processo", relatou.

No país africano, ela se casou com um professor. Os dois se mudaram para Gana em 1988, onde seu marido passou a lecionar alemão em uma escola. A relação durou até meados de 1990, quando o casal se divorciou.

Com a separação, Marianne se mudou a Sicília, na Itália, onde foi contratada como auxiliar de eutanásia em um hospício localizado em Palermo, reportou o North German Broadcasting.

Após ser diagnosticada com câncer de pâncreas, ela voltou para a Alemanha. Em uma de suas poucas entrevistas, conversou com uma rádio alemã no ano de 1994: "Acho que há uma grande diferença se eu matar uma menina porque tenho medo de ter que ir para a prisão por minha vida", disse ela quando perguntada sobre as diferenças de seus atos para os de Klaus.

Túmulo de Anna e Marianne Bachmeier/ Crédito: Gmofhl via Wikimedia Commons

Marianne Bachmeier faleceu em 17 de setembro de 1996, aos 46 anos, enquanto tratava da doença em um hospital na mesma cidade que a filha tinha sido morta. Entre justiceira, vingativa, mãe e assassina, Marianne finalmente descansou quando seu corpo foi enterrado ao lado de Anna, em um cemitério de Lübeck.