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Matérias / Crimes

Engolidos pelo lixo: A fatídica saga dos Irmãos Collyer

No pior caso de acumuladores de todos os tempos, em 1947, os cadáveres de dois irmãos foram encontrados em sua mansão, junto a 120 toneladas de entulho

Thiago Lincolins Publicado em 14/02/2020, às 09h00

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A saga dos Irmãos Collyer - Getty Images
A saga dos Irmãos Collyer - Getty Images

No dia 21 de março de 1947, um odor estranho emanava da mansão de 4 andares nº 2078 da Quinta Avenida, Harlem, em Nova York. Incomodado, um homem que se identificou como Charles Smith entrou em contato com a 122ª Delegacia de Polícia e alegou sentir cheiro de carniça.

Exterior da casa dos irmãos Collyer / Crédito: Domínio público

Quando chegaram ao local, os policiais acharam mais que um corpo. Muito, muito mais: em uma cena surreal, toneladas de lixo se acumulavam até o teto nos quatro andares da propriedade de Homer Lusk Collyer e Langley Wakeman Collyer.

Vida normal

Os irmãos eram filhos do ginecologista Herman Livingston e da ex-cantora de ópera Susie Gage Frost. Quando os pais se divorciaram, continuaram a morar com a mãe na casa da Quinta Avenida. Homer formou-se em direito e Langley em engenharia, ambos na Universidade Columbia, em Nova York. Nunca se casaram. 

À esquerda, Homer brigando com um policial em 1939, antes de ficar cego; à direita, Langley / Crédito: Domínio público

Os primeiros sinais de acumulação começaram com a morte do pai, em 1923. Os irmãos levaram todo seu material médico para casa, ainda que não tivesse qualquer utilidade para eles. Quando foi a vez da mãe, em 1929, herdaram joias, vestidos e outros pertences que nunca sairiam de lá. 

Tratamento caseiro

No começo, eles tinham uma vida comum. A situação mudou em 1933 quando Homer, vítima de uma hemorragia, perdeu a visão. Langley largou o emprego para cuidar do irmão mais velho e os dois se isolaram de tudo e de todos — menos dos oito gatos que faziam companhia para eles. 

Um fator na decisão de se isolar foi o racismo. O Harlem, abrigando mansões como a deles, estava mudando de perfil, com os ricos indo embora, deixando suas propriedades, barateadas e divididas, para novos habitantes, migrantes negros do sul. O bairro se tornaria um dos epicentros do jazz e da boemia. Brancos de meia-idade, os irmãos não queriam ter nada com isso. 

Acreditando que o irmão poderia voltar a enxergar, Langley inventou uma dieta que curaria a cegueira. Homer praticamente se alimentava de 100 laranjas por semana, pão preto e manteiga de amendoim. A compulsão por lixo começou quando Langley passou a colecionar jornais. Ele estava confiante de que o irmão poderia ler as notícias quando recuperasse a visão.  

Isolamento absoluto

Como Langley não pagava as contas, a casa não tinha água ou eletricidade. À noite, fazia longas caminhadas para trazer água, de uma torneira num parque, e encontrar comida, às vezes comprada, às vezes pega do lixo. No qual encontrava novos itens para a coleção. Ele tentou transformar um Ford T em gerador elétrico, mas isso só funcionou por um tempo.

O lixo chegava até o teto / Crédito: Domínio público

A coleção de Langley cresceu até incluir carrinhos de bebê, bicicletas, bolas de boliche, mais de 25 mil livros, órgãos humanos conservados em frascos, 14 pianos, o chassi do já mencionado Ford T, tapetes, tecidos e inúmeros instrumentos musicais. Os objetos ocupavam todos os espaços vazios da casa.

Por medo de ladrões levarem seu tesouro, Langley bloqueou as janelas com tábuas ou móveis. E construiu letais armadilhas internas com o próprio lixo. Esse seria seu fim. 

Oficiais sobre o lixo, perto do teto, removendo objetos / Crédito: Domínio público

O tétrico final

Quando as autoridades chegaram à casa dos irmãos naquele dia de março, uma pilha de lixo bloqueava a porta. Depois de cinco horas removendo objetos, os policiais encontraram o corpo em decomposição do irmão cego, Homer. Sem sinais de Langley, a polícia e a vizinhança — que era obcecada pela vida dos Collyer — acreditavam que ele havia fugido e deixado o irmão morrer de fome.

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Cadáver de Langley / Crédito: Domínio público

Não era o caso. Após três semanas removendo lixo, a polícia encontrou o cadáver do irmão mais novo. Havia sido vítima das próprias armadilhas que montara entre os túneis de lixo.

Langley fora enterrado por uma montanha de lixo empilhada de forma precária, criando um túnel, com a intenção de esmagar um invasor que tentasse atravessá-lo de forma errada. Fez isso enquanto tentava levar comida para o irmão. Cego e sem conseguir achar a saída em meio ao lixo, Homer terminou por morrer de fome.

Após a remoção de 120 toneladas de lixo, a casa estava imprestável. Anos sem manutenção deixaram sequelas. O teto vazava, paredes caíam, os canos e fiação estavam em ruína. Considerada um risco para a segurança pública, foi demolida um mês depois de sua limpeza. No lugar existe hoje o Collyer Brothers Park.


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