Por dentro da Ilha do Marajó, Santarém e Alto Xingu, comunidades distintas e quase esquecidas da história do Brasil
O território amazônico abrigou e abriga culturas diversas, e um exemplo arqueológico muito bem estudado é das populações que viveram na Ilha do Marajó de 400 a 1400 d.C. Uma série de acasos geográficos fez com que a região leste dessa Ilha fosse repleta de campos alagáveis que lembram mais o Pantanal do que a imagem que normalmente temos da Amazônia.
Mais ou menos a partir do ano 500, os moradores da região desenvolveram um sistema de construção de mounds (montes de terra conhecidos por lá como tesos) e de represas que lhes permitia escapar enxutos à fase das cheias, de janeiro a junho, e controlar o suprimento de peixes que saíam do curso normal dos rios para desovar durante a inundação.
Tudo indica que, no alto dos tesos, desenvolveu-se uma cultura baseada no controle dos recursos pesqueiros. A arte funerária em cerâmica feita para os senhores de Marajó é uma das mais requintadas das Américas, com motivos estilizados da fauna – em especial as curvas e as escamas de serpentes e aves que lembram a coruja. Tangas de cerâmica com variadas decorações parecem ter sido usadas em cerimônias ligadas aos diferentes estágios da vida feminina, embora pesquisas em arqueologia experimental tenham atestado que também eram confortáveis para homens.
Á primeira vista, cerâmica pode não parecer um marco muito impressionante. Mas a construção desses vasos decorados indica uma pessoa especilizada nisso. Um profissional. Algo que existe apenas em sociedades hierarquizadas.
A disposição geográfica dos tesos marajoaras parece ter sido cuidadosamente planejada para proteger certos tesos maiores, que seriam centros cerimoniais e de moradias aristocráticas, e cercar as represas nas quais alevinos (larvas de peixe) eram criados.
Subindo o rio, nas regiões das atuais Santarém (mais a leste) e Manaus (mais a oeste), os últimos séculos antes da chegada dos europeus viram um grande crescimento demográfico, a intensificação da atividade agrícola e, principalmente, o uso dos ricos recursos pesqueiros amazônicos. Santarém, em particular, tinha “complexidade e escala urbanas”, segundo a arqueóloga norte-americana Anna Roosevelt, da Universidade de Chicago.
Seriam 15 quilômetros quadrados de área construída, com a produção intensiva de cerâmica ritual e dos famosos muiraquitãs, amuletos de pedra semipreciosa esverdeada (muitas vezes no formato de anfíbios), que circulavam por boa parte da América do Sul e até pelo Caribe como objetos de alto valor – em comparação ruim, como se fossem iPhones mágicos.
Mas, por enquanto, as marcas mais impactantes da presença humana na floresta vêm do Alto Xingu. Michael Heckenberger, antropólogo da Universidade da Flórida, junto com Carlos Fausto e Bruna Franchetto, do Museu Nacional da UFRJ, mostraram que, em primeiro lugar, havia cerca de dez vezes mais povoados indígenas na região antes do século 16 e que, de quebra, as maiores entre essas aldeias eram dez vezes mais populosas que suas equivalentes modernas, chegando a ter milhares de habitantes, similares a pequenas cidades medievais ou da Grécia antiga.
Dados de satélite mostram estruturas cuidadosamente planejadas ordenando a antiga paisagem do Alto Xingu. As maiores aldeias, que provavelmente eram centros religiosos com até dois “terreiros” para festas sagradas, serviam como ponto de partida para uma rede de estradas que as cortava nas direções leste-oeste, norte-sul e orientações secundárias em ângulos de 45 graus.
Tais estradas chegavam a ter 50 metros de largura, estendiam-se por vários quilômetros e contavam com pontes e “acostamentos” feitos de terra. Esses grandes povoados contavam ainda com muralhas de toras de madeira, controlavam o cultivo de grandes lavouras de mandioca e pomares de pequi e, tal como em outros lugares da Amazônia, lagoas artificiais para a prática da piscicultura e a criação de tartarugas, cobiçadas por sua carne e seus ovos. Uma vida agitada, não?
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